Desde que a Rede D’Or anunciou a criação de uma joint venture com a Atlântica Hospitais e Participações, companhia controlada pela Bradesco Seguros, o mercado passou a fazer as contas e olhar apenas para os efeitos nas ações da empresa da família Moll. Mas pouco se falou da própria Atlântica e da Bradesco Seguros.

Como ela tem se movimentado? Qual o racional por trás dessa companhia do Grupo Bradesco em investir em uma nova rede de hospitais? Aliás, essa não é a primeira parceria e, a depender do diretor geral da Atlântica, o executivo Carlos Marinelli, não será a última.

“A gente vai sempre olhar oportunidades no mercado”, diz Marinelli ao NeoFeed. Aos poucos, a companhia vem construindo uma participação relevante no setor de hospitais. Desde 2020, quando foi criada, a empresa investiu e criou joint ventures com Mater Dei, Albert Einstein, BP e Fleury, e Grupo Santa.

No total, entre hospitais prontos e outros que serão construídos, o portfólio chega a 15 unidades. E muito mais poderão entrar nesse bolo. O bolso da companhia é fundo. Só na JV com a Rede D’Or o investimento inicial é de R$ 1,15 bilhão e metade virá da conta da Atlântica.

Na entrevista que segue, Marinelli fala da estratégia da companhia, do tipo de investimento que está olhando e da busca por parceiros que sejam os operadores dos hospitais. Ele também analisa as complementaridades com a Bradesco Saúde, que conta com 3,9 milhões de beneficiários e faturou R$ 36,2 bilhões no ano passado. Acompanhe a seguir:

Qual é o racional desse negócio de investir em hospitais?
Como grupo segurador, o nosso objetivo, logicamente, é proteger o patrimônio das pessoas e, um deles, é a saúde delas. A gente, como uma organização grande, complexa, multifacetada, vai entendendo como as coisas estão acontecendo no setor, as grandes tendências e vamos nos organizando para responder essas tendências. A gente se vê diante de um país, com uma população que está envelhecendo, que precisa desse investimento em infraestrutura hospitalar. Felizmente, o grupo segurador consegue ter vários elementos do setor de saúde e tem essa capacidade de jogar em várias frentes. E uma delas é a Atlântica.

Por que fechar parcerias com várias empresas hospitalares? Não é melhor ter 100% da operação?
Ela nasce para fazer investimentos em equipamentos hospitalares e com a vocação de ser parceira de grandes operadores. Estamos fazendo um hospital na Vila Mariana (bairro da cidade de São Paulo) junto com o Albert Einstein, uma JV de oncologia com BP e Fleury; de fazer um hospital na Zona Norte da cidade de São Paulo, que precisa de equipamentos hospitalares, com o Mater Dei; e, inclusive, fazer um investimento no Centro-Oeste do país, que é a que mais cresce no país, por meio do Grupo Santa. E agora, junto com a Rede D’Or, temos o mesmo motivador.

Qual motivador?
A Rede D’Or é o maior grupo hospitalar do país e tem ativos que estão colocados estrategicamente em praças que são interessantes para nós e equipamentos que vão trazer uma qualidade de saúde na nossa população, como Macaé, Guarulhos e Alphaville. Então, isso está totalmente conectado.

Mas, ao usar esses hospitais da Atlântica, vocês terão uma vantagem competitiva em termos de redução de custo, não?
A gente acredita no modelo de independência. Então, a Atlântica Hospitais e Participações é uma empresa do grupo segurador que investe em projetos hospitalares. Bradesco Saúde é uma empresa que também está no grupo segurador, mas são empresas independentes, diferentes, cada qual no seu segmento, também com alguns outros objetivos. Elas têm complementaridade. Porém, elas não são dependentes uma da outra. Todos os investimentos que a gente faz em Atlântica são estudados, avaliados, desenhados e executados para serem opções de mercado. Eu tenho que desenhar uma empresa de oncologia junto com a BP e Fleury para atender o Bradesco, a SulAmérica, a Amil, a Careplus, a Omint e outras.

Não vai ter nenhuma sinergia?
A sinergia aqui é o fato de que eu garanto que os investimentos que estão sendo feitos via Atlântica são em equipamentos que têm uma filosofia de atenção à saúde e um desenho que é sustentável. Junto com esse anúncio da Rede D’Or, a gente confirma essa vocação que temos de investir em um setor que é estratégico para o país, sempre trazendo parceiros que fazem essa operação, mas da nossa maneira, digamos assim, agnóstica. Queremos ter parcerias com empresas que sabem operar muito bem esses equipamentos. Queremos ser investidores por que acreditamos nesse setor, por que esse setor tem laços com a nossa seguradora.

Uma das grandes discussões entre hospitais e operadoras de saúde é a conta. Operadoras dizem que os hospitais cobram muito e hospitais dizem que as operadoras pagam pouco. Ao estar nas duas pontas, vocês ficam blindados?
A gente está no setor há 40 anos e estamos aqui para ficar mais 40, mais 80, mais 120. Ser sustentável é ter um desfecho melhor. E, ser sustentável, é ter um equipamento mais eficiente a um custo melhor. E os equipamentos de saúde precisam estar novos, modernos, eficientes. Por quê? Porque isso vai fazer com que o nosso custo caia e a gente vai ter seguro saúde que caiba no bolso das pessoas.

Mas vai blindar a companhia?
Eu acho que blindar é uma palavra forte. Ela pode ter outros tipos de interpretações. Na saúde, usamos diferentes alavancas e a alavanca de Atlântica é muito bem pensada, bem-organizada, bem desenhada e que não olha para o trimestre seguinte. Ela olha muito à frente e olha junto com outras alavancas que, somadas, fazem a nossa força cada vez maior.

Qual é o apetite da Atlântica?
A gente tem um planejamento estratégico que não é divulgado. E, como você tem visto, pela sequência de anúncios, ele não é algo que a gente tem tratado como uma coisa marginal, é uma intenção estratégica da companhia de participar desse segmento.

Dezenas de hospitais?
Hoje, se a gente somar só a participação no Grupo Santa, já temos oito equipamentos, vamos ter outros com BP e Fleury, com os outros que assinamos, já estamos indo para 15 hospitais.

E vem mais?
Estaremos sempre avaliando oportunidades em conversas para ser um parceiro de operadores de referência.

Essa é uma reação à concorrência? Porque a Amil tem hospitais, a Hapvida tem hospitais, a SulAmérica é Rede D'Or. A Bradesco Saúde não tinha...
O desenho da Atlântica é outro. Eu não quero desenvolver uma competência de ser um operador hospitalar. Eu quero desenvolver uma competência de ser um investidor nesse segmento, junto com operadores competentes que praticam uma saúde sustentável. E, como você muito bem colocou, eu tenho ao lado da Atlântica uma empresa chamada Bradesco Saúde que depende de ter estrutura de qualidade, hospitais modernos e eficientes para cumprir a sua vocação de levar a saúde para cada vez mais pessoas.

Saíram notícias de que a Amil está vendendo hospitais. Vocês estão de olho?
A gente vai sempre olhar oportunidades no mercado. Mas elas têm que fazer sentido para nós.