Depois dos dados decepcionantes a respeito da inflação dos Estados Unidos em março, divulgados na quarta-feira, 12 de abril, o dólar entrou numa trajetória de valorização no Brasil e no mundo, situação que não deve cessar tão cedo, segundo os analistas ouvidos pelo NeoFeed.
Para eles, a perspectiva de que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) irá empurrar o início dos cortes de juros mais para o fim do segundo semestre de 2024, combinado com os problemas da economia brasileira, devem manter o dólar acima dos R$ 5 por aqui pelo menos no curto prazo.
O tema da valorização do dólar ficou evidente nesta sexta-feira, 12 de abril, quando a cotação da moeda americana alcançou o maior patamar desde 9 de outubro, cotada a R$ 5,12 - ao longo do dia chegou a R$ 5,15. Com esse resultado, a moeda acumula alta de 5,57% no ano.
O real não foi a única moeda que desvalorizou frente ao dólar. O euro e a libra esterlina caíram aos menores níveis frente ao dólar desde novembro. A moeda da zona do euro fechou com queda 0,79%, a € 1,06, enquanto a divisa britânica recuou 0,82%, a 1,24 libra esterlina.
Ainda que pregões sejam influenciados por temas pontuais, como foi o caso hoje, com a escalada da tensão entre Israel e Irã, o dólar está em trajetória de alta no mundo diante da falta de indícios de que a inflação nos Estados Unidos está no last mile que o Fed precisa para ter conforto para iniciar o afrouxamento dos juros.
O próprio Jerome Powell, presidente do Fed, disse, em 29 de março, que não está com pressa de cortar os juros, de olho em sinais de melhora das condições da inflação.
A dificuldade em controlar a inflação ficou evidente depois da divulgação do índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) de março, que veio acima do esperado pelo mercado. Em 12 meses, o indicador alcançou 3,5%, frustrando aqueles que esperavam um sinal de que a inflação estava começando a ceder.
A situação piorou o humor do mercado, respingando sobre o dólar, que não dava sinais de que ultrapassaria a marca de R$ 5, nem que ficaria muito acima disso. “O que se via há algumas semanas era a lateralização do dólar, mas depois da divulgação do CPI, isso mudou”, diz Eduardo Rahal, head institucional da Levante Corp.
A leitura do CPI de março levou economistas e investidores a revisarem suas projeções de quando o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) vai começar a cortar juros, se é que o afrouxamento de fato virá em 2024.
O UBS, que esperava o início dos cortes em junho, vê agora que o processo começará em setembro, com outro corte em dezembro. O Bank of America (BofA) espera apenas uma diminuição, de 0,25 ponto percentual, em dezembro. Já o CEO do J.P. Morgan, Jamie Dimon, alertou no começo da semana para a possibilidade de o Fed perder o controle da situação, sendo obrigado a manter a política monetária apertada.
A perspectiva dos Estados Unidos ficarem com os juros na faixa de 5,25% a 5,50% por mais tempo que o esperado vai dificultar qualquer possibilidade do dólar ceder frente ao real. Ainda mais quando, no Brasil, o movimento é oposto.
O Banco Central (BC) vem desde agosto reduzindo a Selic. Somente em 2024, o Comitê de Política Monetária (Copom) aprovou dois cortes, levando a taxa básica de juros a 10,75% ao ano. Em meio à tendência de queda da Selic, com o mercado esperando que a taxa feche o ano em 9% ao ano, o diferencial de juros entre Brasil e Estados Unidos está diminuindo.
Mesmo com o País registrando uma taxa básica superior, os investidores preferem estar aplicados em taxas americanas, diante da maior segurança do país. “É uma questão de risco e retorno”, diz Sidney Lima, analista da Ouro Preto Investimentos. “O investidor prefere receber 5,5%, em dólar, nos Estados Unidos, do que receber 9% no Brasil. Mesmo com a Selic ainda alta, os juros de 5,5% nos Estados Unidos são um patamar bastante elevado.”
Além disso, outros emergentes mal começaram a cortar os juros, mantendo um diferencial com os Estados Unidos mais atrativo para investimentos. É o caso do México, em que o banco central iniciou a redução dos juros apenas em março e indicou que pretende ser cauteloso com o afrouxamento monetário. Os mexicanos se aproveitam ainda do fato de estarem próximos aos Estados Unidos, se beneficiando da robustez da economia americana.
Lima destaca ainda que o atual patamar de juros altos nos Estados Unidos acaba tornando o país um “buraco negro” de investimentos, deslocando o fluxo de recursos global, tendo consequências na moeda americana. O Brasil vem sentindo esses efeitos, com o fluxo de capital estrangeiro na B3 ficando negativo em R$ 23 bilhões no ano até março.
Risco local
A redução do diferencial de juros acaba trazendo à tona as questões do País. Segundo Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, por mais que a situação global seja o “fator preponderante” para explicar a alta do dólar, o Brasil apresenta problemas que não vão ajudar na desvalorização da moeda americana tão cedo.
Desde o velho conhecido desarranjo fiscal, um pouco aliviado pelo arcabouço aprovado em agosto do ano passado, passando pelas notícias de que o governo quer interferir na Vale, utilizar a Petrobras para controlar a inflação até balões de ensaios sobre política de preços. São fatores que aumentam o prêmio de risco do câmbio.
“Tudo isso acaba compondo um grande bolo, fazendo com que o real tenha um processo de desvalorização, refletindo esses riscos”, diz Sanchez. “Falas de autoridades e interferências, ou boatos de interferência, acabam dificultando a percepção do risco do Brasil.”
Considerando os aspectos internos e externos, os economistas já não contam mais com o dólar caindo para abaixo de R$ 5, pelo menos no curto prazo, com alguns acreditando que o real pode desvalorizar ainda mais.
A grande dúvida, no momento, é quando (ou se) o banco central americano vai começar o afrouxamento monetário. “A flexibilização deve acontecer de uma forma ou de outra, e isso tende a favorecer a volta do capital aos emergentes, mas não acho que será no curto prazo e precisamos ver no médio”, diz Rahal.