O que as mentes mais brilhantes do Brasil têm em comum? Algumas delas passaram pela Fundação Estudar, instituição criada, em 1991, pelo bilionário Jorge Paulo Lemann para dar bolsas de estudos a jovens brasileiros nas principais universidades dos Estados Unidos e do mundo.

Quase 30 anos depois, Lemann, dono de uma fortuna estimada em US$ 24,4 bilhões, ainda descreve a organização como um de seus projetos favoritos. Ela nasceu da vontade do dono da Ambev e de outros gigantes internacionais, como Burger King e Kraft Heinz, de fomentar o potencial e a educação de jovens com fôlego e coragem para causar impacto no mundo.

A organização, no entanto, começou de uma maneira quase informal. Considerado o "bolsista zero", Carlos Brito trabalhava na petroleira Shell quando foi aprovado no curso de pós-graduação de Stanford, na Califórnia. Na época, ele não tinha condições de arcar com as altos custos do curso.

Para seguir em frente com o seu propósito, pediu ajuda ao então banqueiro Lemann, então à frente do Banco Garantia, que aceitou cobrir as despesas do jovem estudante mediante uma única condição: que, no futuro, ele fizesse o mesmo por outro aluno brasileiro.

Além de cumprir com a sua promessa, Brito fez valer a pena o investimento. Ele fez carreira nas empresas de Lemann no setor de cerveja e hoje é o todo-poderoso CEO da AB Inbev, a maior cervejaria do mundo, com um faturamento de US$ 54,6 bilhões em 2018.

Além de Brito, a lista de alunos que se destacaram globalmente em suas áreas é enorme. Um exemplo é Hugo Barra, que já chegou a ser chamado de o brasileiro mais influente do Vale do Silício. Hoje, está no Facebook e é responsável pelas parcerias globais de realidade virtual da rede social.

Ele já atuou na fabricante chinesa de smartphones Xiaomi, sendo responsável pela expansão internacional da marca. Seu primeiro emprego de relevância foi no Google, onde ocupou a vice-presidência da companhia de Larry Page e Sergey Brin. Lá, ele cuidou do sistema operacional Android, que atualmente está instalado nove em cada dez smartphones.

A Fundação Estudar foi fundamental para Barra. Ele usou sua bolsa para a graduação em Ciência da Computação no conceituado Massachusetts Institute of Technology (MIT), uma das universidades mais renomadas do mundo e um celeiro de formação de empreendedores dos Estados Unidos.

Mas nem só empreendedores e executivos são formados pela Fundação Estudar. Observe o exemplo de Tabata Amaral. Com apenas 25 anos, Tábata se elegeu deputada federal pelo PDT de São Paulo com uma votação de 264 mil votos, a sexta maior do Estado.

A deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP)

A parlamentar tem como sua principal bandeira a educação. Ela ganhou projeção nacional em uma audiência na Câmara dos Deputados com o então ministro da Educação, Ricardo Vélez, em março, na qual fez um discurso em que apontava o despreparo do ministro e pedia sua demissão.

“Eu não espero mais nenhuma resposta, eu já entendi que isso não vai acontecer. Então a mim me resta continuar o meu trabalho de educação, que não começa com este mandato, e esperar que o senhor mude de atitude, o que parece completamente improvável, ou saia do cargo de ministro da Educação. Obrigada”, disse Tabata.

Enquadrado por Tabata, Vélez não durou muito tempo no cargo. No começo de abril, ele foi demitido e substituído por Abraham Weintraub.

Muitos dos bolsistas da Fundação Estudar resolveram seguir o exemplo de Lemann e empreender. É o caso de André Penha, um dos fundadores do QuintoAndar, startup que está transformando o mercado de locação de imóveis no Brasil.

O jovem contou com bolsa da fundação para cursar a pós-graduação em Stanford, que lhe rendeu uma vivência para lá de fundamental nessa trajetória de sucesso. O Quinto Andar, que já recebeu R$ 250 milhões em investimento é um forte candidato a ser tornar um unicórnio, jargão para se referir as startups que valem mais de US$ 1 bilhão.

Outro que tem honrado com louvor a filosofia da instituição é Gabriel Liguori, que lidera um projeto pioneiro de coração artificial. O médico conseguiu seu PHD na University of Groningen, na Holanda, graças ao apoio financeiro da Fundação Estudar.

Outro exemplo que mostra a capacidade da Fundação Estudar de encontrar talentos é a história dos empreendedores Henrique Dubugras e Pedro Franceschi, os fundadores da Brex, que fornece um cartão de crédito para startups. Ambos foram bolsistas de Stanford.

Os empreendedores Pedro Francheschi (à esquerda) e Henrique Dubugras, fundadores da Brex

Recentemente, a empresa fundada pelos brasileiros no Vale do Silício foi avaliada em US$ 2,6 bilhões. Detalhe: apesar do apoio da fundação de Lemann, os dois jovens brasileiros abandonaram o curso para empreender.

A história de empreendedorismo está cheia de jovens brilhantes que deixaram universidades para criar suas próprias empresas. Os dois casos mais célebres são os Bill Gates, da Microsoft, e de Mark Zuckerberg, do Facebook. Ambos deixaram a Universidade de Harvard.

Depois de vivenciarem na pele todas as etapas e o networking proporcionado pela Fundação Estudar, Dubugras e Franceschi foram beber na mesma fonte para captar talentos para a sua startup.

Hoje, o quadro de funcionários da Brex conta com cinco profissionais que passaram pelo programa Líderes da Fundação Estudar, inclusive a Head of Finance da empresa, Camilla Morais, de 27 anos.

De origem humilde, Camilla estudava engenharia no Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), quando disputou com outros 7 mil candidatos uma das 20 bolsas oferecidas pela organização. Embora seu intuito inicial tenha sido captar recursos para aliviar algumas contas, ela confessa que a Fundação lhe deu muito mais que apoio financeiro.

"O programa Líderes me abriu os olhos e caminhos. Ao longo do meu processo, tive a mentoria de pessoas bem-sucedidas no mercado, com uma rede de contatos valiosa", afirmou Camilla.

E os caminhos que se abriram para Camilla não se limitavam ao país. Em 2014, ela visitou os Estados Unidos pela primeira vez. O motivo? Um encontro com ninguém menos que o megainvestidor Warren Buffet, promovido e custeado pela Fundação Estudar.

O talento acima da média de Camilla, anteriormente validado pela organização através de um processo seletivo com 7 etapas, que previam, entre outras coisas, dinâmica de grupo, entrevistas individuais, testes de lógica e conhecimentos gerais, foi rapidamente reconhecido por outro empresário "cria" do programa de Líderes: o executivo Bernardo Hees, que ocupou de 2013 até julho deste ano o cargo de CEO da Kraft Heinz, um dos homens de confiança de Lemann.

Camilla se mudou para Chicago no fim de 2015 e, no primeiro mês de 2016, assumiu a função de analista financeira da Kraft Heinz. Lá, ela permaneceu por quase três anos e alçou ao posto de Head of Marketing.

Seu desligamento se deu mediante o convite da Brex, que buscava um jovem brasileiro que estivesse em solo americano e que havia passado pela iniciativa da Fundação Estudar. A passagem só de ida, de Chicago para São Francisco, chegou à Camilla em novembro de 2018.

Ainda ativa na rede da organização que foi divisora de águas em sua vida e carreira, Camilla entende que à medida que novos jovens passam pela experiência facilitada pela Fundação Estudar, maior é o impacto que eles promovem no Brasil e no mundo – e maior é o poder da própria organização, em um ciclo virtuoso.

Em 2018, mais de 43 mil jovens se inscreveram para receber uma bolsa da Fundação Estudar e 25 foram aprovados

Com isso, cresce também o número de interessados em receber bolsas da Fundação Estudar. É quase que uma chancela de uma carreira bem-sucedida. Em 2018, por exemplo, mais de 43 mil jovens se inscreveram e 25 foram aprovados.

Os pré-requisitos para conseguir esse “passaporte” estudantil seguem basicamente os mesmos de 1991, quando o programa Líderes nasceu: ter até 34 anos, apresentar excelência acadêmica, nutrir real desejo por causar um impacto na sociedade e estar em processo de aceitação, matriculado ou cursando o ensino superior no Brasil ou no exterior.

Bolsas de pós-graduação também são contempladas e não há restrições quanto a cursos e universidades. O valor da bolsa é parcial e definido de acordo com o perfil acadêmico do candidato, a duração e o local do curso, e sua condição familiar, profissional e socioeconômica. O valor da bolsa pode variar (de 5% à 95%) em relação ao valor solicitado pelo candidato e é definido ao término do processo seletivo.

Atualmente, a rede da Fundação Estudar conta com mais de 600 líderes e, de cada um deles, é esperado uma certa, digamos, contrapartida. Segundo a própria fundação, os beneficiados pelo projeto têm de assumir certas responsabilidades e há expectativas de que os profissionais façam uma "doação à instituição, pelo menos, do valor original da bolsa recebida. Assim outros estudantes podem ser beneficiados.

Embora não exista nenhum acordo contratual que preveja essas obrigações, os profissionais contemplados com as bolsas parecem seguir à risca suas responsabilidades. Em 2018, por exemplo, a Stone, do empreendedor André Street, que também faz parte da rede de Líderes da instituição, foi uma das principais doadoras para a Fundação Estudar. Ambev, Votorantim, Santander, Alpargatas e outras grandes organizações também aportaram recursos à Fundação de Lemann.

Pessoas físicas também podem contribuir. Os executivos Bernardo Hees e Carlos Brito são nomes constantes na lista dos que aportam valores superiores a R$ 75 mil.

Todas as atividades e investimentos da Fundação Estudar são esmiuçados em relatórios anuais, que apresentam os números e os profissionais envolvidos em cada etapa do programa de Líderes. Assim todo mundo fica sabendo quem foram os aprovados de cada edição e o que fazem atualmente os beneficiados de anos anteriores. O relatório monitora ainda o fluxo de caixa do programa, cuja ênfase parece se dar em engenheiros focados em empreendedorismo e gestão pública.

Ainda que a educação seja o principal pilar da fundação, é o seu networking a parte mais valiosa dela. E, ao que tudo indica, ele se multiplica toda vez que um novo aluno recebe uma bolsa para estudar nas melhores universidades do mundo.

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