Em 2017, quando fundou a Hash, dona de uma plataforma de pagamentos white label, João Miranda dedicou os dois primeiros anos exclusivamente para o desenvolvimento da infraestrutura da operação. Só depois de cumprida essa etapa, a fintech começou a buscar seus primeiros clientes.

A empresa pode ter pisado no freio para assegurar que estava pronta para chegar oficialmente ao mercado. Mas, agora, dois anos depois de seguir esse caminho, a startup começa a mostrar velocidade em uma outra frente: a captação de investimentos.

A Hash anuncia nesta quarta-feira, 20 de outubro, um aporte série C de R$ 235 milhões, liderado pelos fundos QED Investors e Kaszek, que já investiam na operação, e com a participação da Endeavor Scale-Up Ventures, que passa a integrar o quadro de sócios da companhia.

O novo cheque chega exatamente seis meses depois de a startup receber um aporte série B de R$ 81 milhões, que também foi liderado pelo fundo americano QED Investors e acompanhado pela Kaszek, Canary, Globo Ventures, da família Marinho, e por Thomas Stafford, um dos sócios da DST Global.

“Nós crescemos muito mais rápido do que prevíamos desde a última rodada”, afirma Miranda, fundador e CEO da Hash, ao NeoFeed. “Já passamos da fase de construir, validar e de um produto escalável para agora, de fato, escalar e ganhar mercado.”

Longe de um caso isolado, a Hash é mais uma peça no cenário observado recentemente na América Latina e, especialmente, no Brasil. Esses ecossistemas têm sido marcados pelas captações de rodadas em intervalos menores e com cheques cada vez mais elevados.

Esse contexto está expresso, por exemplo, na Merama, que foi fundada no fim de 2020 com a proposta de ser uma holding de marcas digitais na região e que, de lá para cá, já levantou dois aportes de R$ 864 milhões e R$ 1,15 bilhão. Outros nomes, como Addi, TruePay e Kavak, engrossam essa lista.

Miranda atribui o aquecimento do mercado a diversos fatores. Além do tamanho do mercado latino-americano, ele cita, em particular, a maturidade alcançada pelos empreendedores da região, muitos deles com experiências e aprendizados acumulados por passagens em startups bem-sucedidas ou não.

“Hoje, você tem muito mais profissionais com bagagem e conhecimento para construir e escalar uma operação”, observa. “E muitos deles estão montando suas próprias startups. Então, é um ciclo natural, além do fato de existir mais capital disponível no momento.”

A fintech projeta processar R$ 4,2 bilhões em sua plataforma em 2022

O próprio Miranda é um exemplo desse ciclo. Ele deixou a Pagar.me em 2016, quando a fintech foi comprada pela Stone. A startup foi fundada por Henrique Dugubras e Pedro Franchesci, dupla que hoje está à frente da Brex, avaliada em US$ 7,4 bilhões e que também figura entre os investidores da Hash.

Foi justamente na passagem pela Pagar.me que nasceu a inspiração para o modelo da Hash. “Os clientes me diziam que gostavam da empresa, mas diziam que o queriam, de verdade, era ter suas próprias ‘Pagar.me’”, conta. “Na época, não se falava de conceitos como fintech as a service.”

Da inspiração à prática, a Hash fornece toda a infraestrutura de pagamentos para que empresas de diferentes segmentos possam oferecer suas próprias soluções aos seus clientes B2B e demais elos de sua cadeia. De maquininhas de cartões a softwares e todos os recursos envolvidos nessas operações.

Desde abril, a Hash dobrou sua carteira de oito para 16 clientes. Hoje, além de empresas como Leo Madeiras, Loja do Mecânico e ZAX, que já compunham essa relação, a fintech passou a atender companhias de segmentos como a indústria farmacêutica e o setor imobiliário.

A startup também ampliou em seis vezes o volume processado em seus terminais, em linha com a projeção de chegar a R$ 1,5 bilhão, no fim deste ano, e a R$ 4,2 bilhões em 2022. No próximo ano, a Hash prevê alcançar uma base de 200 mil estabelecimentos, contra os atuais 16 mil estabelecimentos.

Para concretizar esses números, uma boa parcela do novo aporte será reservada ao aumento da equipe, especialmente na área de tecnologia. Dos atuais 160 profissionais, o plano é chegar a 190 no fim de 2021 e superar a marca de 300 funcionários em 2022.

Em paralelo a um processo em curso no Banco Central para obter uma licença de instituição de pagamento, a Hash vai aplicar outra parte dos recursos na ampliação do seu portfólio. O plano é incorporar, a partir de 2022, produtos financeiros como conta digital e crédito, começando, nessa última frente, com a modalidade de antecipação de recebíveis.

“Os clientes e estabelecimentos já usam a nossa solução de pagamento e esse dinheiro já está dentro do nosso ecossistema”, explica Miranda. “Trazer novas ofertas é um caminho natural para gerar mais valor na operação.”

Para uma fonte do setor ouvida pelo NeoFeed, a ampliação do portfólio para além da área de pagamentos é um movimento que faz sentido para a Hash, já que, mesmo aquecido, o mercado de plataformas white label de pagamentos têm um escopo de crescimento mais limitado.

“Essa migração para outras áreas, no entanto, não é algo simples de fazer e exige competências e até mesmo tecnologias completamente diferentes”, diz o executivo. “E se a Hash já não está sozinha no seu mercado atual, nesse novo espaço, a concorrência é ainda mais complicada.”

No cenário de pagamentos, mesmo com alguns diferenciais entre os modelos, ele cita nomes como a Zoop, fintech do grupo Movile, e a Dock, que tem entre seus investidores fundos como Temasek e Viking Global Investors. Já a segunda arena inclui, entre outras startups, a FitBank, que já atraiu aportes de empresas como j.p. morgan e CSU.