A Orbia, joint venture da gigante alemã Bayer com a Bravium, está acertando os últimos detalhes para dar início à venda de commodities online. Nessa primeira fase, a ideia é comercializar soja e milho. Na sequência, vão entrar outros produtos, como café, algodão e trigo.

A operação de venda de commodities da Orbia, prevista para o fim de junho, é o passo mais ousado da estratégia de digitalização da divisão de agronegócios da Bayer, que comercializa insumos agrícolas e sementes no mercado brasileiro.

“O agricultor pode ter a jornada completa: compra insumos, troca pontos por serviços ou produtos e, agora, vai poder vender o seu grão”, diz Gerhard Bohne, presidente da divisão agrícola da Bayer no Brasil ao NeoFeed

Lançada em junho do ano passado, a Orbia é um spin-off do programa de relacionamento da Bayer. No seu início, ele era exclusivamente um programa de coalização, nos moldes da Multiplus, da TAM, e o Smiles, da Gol.

Mas, aos poucos, foi ganhando novos recursos. Em outubro do ano passado, a Orbia começou a operar o seu marketplace de insumos, que conecta distribuidores diretamente a produtores rurais. Em abril deste ano, fechou parceria com a Boehringer Ingelheim, acrescentando produtos de pecuária à plataforma.

Agora, a Orbia vai colocar em operação o terceiro pilar de sua estratégia, que é a venda de commodities. “Vamos começar com soja e milho, que são as principais commodities do País”, afirma Ivan Moreno, CEO da Orbia. “Teremos uma parceria com uma grande trading do mercado.”

O NeoFeed apurou, com duas fontes do setor agrícola, que a trading com quem a Orbia negocia é a Bunge. Procurada, a Bunge disse “que não comenta rumores de mercado.” Moreno afirmou que não poderia comentar a informação.

Hoje, o marketplace conta com 170 mil produtores, segundo a Orbia. Eles representam aproximadamente 70% da área plantada no País. Com a venda online de commodities, a ideia da Orbia é digitalizar um processo que ainda é feito, em sua grande maioria, de forma analógica.

Atualmente, uma transação bem comum no agronegócio são as operações de barter, do inglês troca. Essa operação consiste no pagamento pelos insumos através das entregas dos grãos na pós-colheita, sem a intermediação monetária. Na prática, é um mecanismo de financiamento da safra.

“Hoje, a negociação das commodities é por telefone”, afirma Moreno. “O agricultor sabe os compradores da região e sai fazendo cotações dos preços de vendas.”

Na plataforma da qual a Bayer é sócia, o agricultor agora poderá consultar os preços online e definir qual a melhor opção de venda, englobando o universo de distribuidores, cooperativas e tradings. Toda documentação será também digitalizada.

A Orbia conta, atualmente, com 62 distribuidores parceiros que vendem produtos na plataforma online. Até o fim do ano, a meta é chegar a 120 parceiros, que somados faturem R$ 9 bilhões. Uma parcela desse volume passará pelo marketplace da Bayer.

Desde que foi lançado, o programa de coalização da Orbia já movimentou 10 bilhões de pontos com uma média de 8 mil resgates por mês. A empresa não fornece dados de movimentação financeira dentro do marketplace.

O modelo de negócio segue o de um marketplace tradicional, com uma taxa sendo cobrada a cada transação. No caso do programa de coalização, a Orbia ganha dinheiro com a venda de pontos à Bayer ou aos distribuidores, que depois são trocados pelos agricultores por produtos e serviços na plataforma.

O mercado de insumos e commodities agrícolas gira em torno de R$ 110 bilhões no mundo físico, segundo estimativas da Orbia. “Não sabemos o quanto podemos capturar, pois é um projeto de mudança do mercado agrícola”, afirma Moreno.

Em meio à crise da Covid-19, o setor agrícola é um dos que deve menos sofrer. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima que, neste ano, a produção de grãos baterá novo recorde e chegará a 250 milhões de toneladas, 3,5% a mais do que a safra anterior.

Campo digital

A Covid-19 cancelou as principais feiras do agronegócio, que eram responsáveis por fechar grandes contratos das empresas do setor. Um exemplo é a Agrishow, que movimentou U$ 2,9 bilhões no ano passado. “Uma parte desses negócios vai migrar para o mundo online”, afirma uma fonte do setor.

Mas será que o agricultor brasileiro está preparado para essa digitalização? Uma pesquisa da consultoria McKinsey traz dados surpreendentes e quebra uma série de mitos sobre o setor.

Com base em entrevistas com 750 agricultores brasileiros, a McKinsey descobriu que 36% deles fazem compras online. É pouco? Nem tanto. Esse índice é de 24% entre os agricultores americanos.

Com base em entrevistas com 750 agricultores brasileiros, a McKinsey descobriu que 36% deles fazem compras online

O WhatsApp é usado por 85% dos agricultores brasileiros para questões relacionadas à fazenda. O relatório mostra também que 33% estão dispostos a comprar sementes, fertilizantes e defensivos online.

Além disso, um em cada três agricultores está disposto a vender parte da produção online. No caso dos produtores de algodão, 56% deles consideram vender até 30% da safra por canais digitais.

“Estava claro que a transformação digital no campo ia acontecer, mesmo antes da Covid-19”, diz Bohne, da Bayer. “Com a pandemia, tudo se acelerou.”

Esse comportamento rumo à digitalização do agricultor brasileiro vai acirrar a disputa entre as diversas empresas do setor. “A briga está apenas começando”, diz uma fonte da área. “Quando os grandes se mexem é porque estão sentindo o cheiro de extinção.”

E a concorrência será pesada com empresas que nasceram com o DNA digital e que estão tentando ganhar o coração e as mentes dos agricultores. Uma delas é a Agrofy, um marketplace argentino conhecido como o Mercado Livre do agronegócio.

A startup recebeu um aporte série B de US$ 23 milhões, em dezembro do ano passado, liderado pelo fundo de venture capital SP Ventures, especializado em investimentos no setor agrícola.

Antes, a Agrofy já havia recebido US$ 11 milhões, num investimento no qual participaram a Syngenta Ventures e a Bunge Ventures, dois braços de investimentos de duas das maiores empresas do setor agrícola.

“O preconceito digital está mais do lado da indústria do que do produto rural”, afirma Rafael Sant’anna, que comanda a operação brasileira da Agrofy.

No ano passado, a Agrofy movimentou US$ 35 milhões em seu marketplace em 14 categorias, desde máquinas e implementos até serviços financeiros (a startup tem parceria com Bradesco, Santander e Banco do Brasil nessa área).

Hoje, ela está presente em oito países da América Latina. Além de Brasil e Argentina, a startup atua no Paraguai, Uruguai, Chile, Colômbia, Bolívia, Equador e está se preparando para entrar no México.

Seu próximo passo é exatamente na área na qual a Bayer está apostando agora: a venda de commodities online. A Agrofy também está desenvolvendo um meio de pagamento para ser usado no marketplace, nos moldes do que o mercado livre fez com o Mercado Pago.

Assim como aconteceu em praticamente todos os setores da economia, do varejo aos bancos, o agronegócio, enfim, começa a plantar seu pé no mundo digital. As peças dessa partida de xadrez estão sendo movimentadas, nesse momento, pelos principais players.

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