Segundo maior e-commerce de vinho da América Latina, a Evino registra vendas crescentes nestes tempos de quarentena. “O e-commerce e o delivery tiveram suas vendas aumentadas. A dúvida é quanto dos novos clientes, que não compravam no digital, vão persistir quando a crise passar”, questiona o executivo Ari Gorenstein, que divide a direção da Evino com Marcos Leal.

A resposta para essa questão é crucial para o planejamento da companhia. Afinal, trata-se de uma operação robusta e complexa, sobretudo agora, em tempos de coronavírus. Só no ano passado, a Evino importou 7,15 milhões de garrafas, grande parte delas da França e da Itália, dois dos países mais atingidos pela Covid-19.

Ao mesmo tempo em que busca entender como será o comportamento do consumidor na pós-pandemia, a empresa vai encabeçar um projeto para dar suporte aos pequenos produtores de vinho do Brasil, muitos deles que nunca venderam digitalmente.

Até meados de maio, o e-commerce deve começar a vender rótulos desses pequenos produtores brasileiros, aqueles que dependiam do turista na porta da adega para desovar suas garrafas.

Esta ação é acompanhada de um trabalho para repensar a estratégia do e-commerce. Antes de a crise chegar, a Evino estava se preparando para entrar no segmento de vinhos premium (a empresa é, atualmente, mais conhecida pela venda virtual de vinhos mais baratos) e em representar produtores com exclusividade, como fazem as importadoras tradicionais. Este plano continua, garante Gorenstein.

Nesta entrevista ao NeoFeed, Gorenstein, fala sobre o desempenho das vendas online, a mudança do consumidor, os exemplos do que tem acontecido nos mercados da Itália, dos Estados Unidos e da China, detalha o plano de suporte aos pequenos produtores e revela como pretende vender vinhos mais premium. Acompanhe:

Como estão as vendas online no mercado de vinho?
As vendas online cresceram mundialmente. A pandemia restringe a circulação, cai o consumo fora de casa e cresce o doméstico. É natural haver uma substituição, mas ainda é cedo para saber se o consumo em casa vai substituir o fora de casa. O consumidor agora vê o digital e o e-commerce com um olhar diferente, não mais como uma ferramenta complementar, e passou a conhecer suas vantagens e desvantagens. Por enquanto, as vendas são crescentes para quem abastece o consumo em casa, como os supermercados e o e-commerce.

O que mostra a experiência internacional?
No mundo inteiro por onde a pandemia passou, como Itália, EUA, os e-commerces de bebida e os serviços de delivery tiveram suas vendas aumentadas. A dúvida é quanto dos novos clientes, que não compravam no digital, vão persistir. Se olhamos o caso chinês, elas são crescentes. Mas as vendas online de vinho já tinham boa penetração na China. Acompanho muito o Tannico, um e-commerce italiano. Lá, o aumento foi de duas a três vezes o volume da receita. O dono acredita que parte deste aumento não se sustentará, que quando voltar à vida normal, muitos italianos vão preferir a enoteca do bairro. Mas terá uma parte que ficará no e-commerce. O e-commerce venceu uma barreira, é possível que mude os hábitos, mas ainda é cedo para ter respostas.

Quais são os dados chineses?
Tem uma pesquisa da Wine Intelligence, realizada antes da pandemia, que mostrava que, nos vinhos, a China tinham a maior penetração online, com 41%. Em segundo lugar estava a Inglaterra, com 30%, e em terceiro o Brasil, com 26%. A pesquisa foi feita perguntando aos consumidores regulares de vinho se eles compraram pelas plataformas online nos últimos 6 meses. Não quer dizer que seja um consumidor que só compre online, mas que também compra online. Imagino que esta porcentagem tenha crescido nos últimos meses.

"Acompanho muito o Tannico, um e-commerce italiano. Lá, o aumento foi de duas a três vezes o volume da receita"

O que os clientes compram na loja online?
O consumo entre quatro paredes entra mais no custo-benefício. Não é o vinho para dar de presente, no qual o status importa, de um rótulo para impressionar na mesa do restaurante. Em casa, vale beber o que gosta e vale o custo-benefício. Percebemos uma ligeira queda no tíquete médio de garrafa neste mês, é uma queda que não chega a 2% do valor. Não dá para dizer que seja sinal de recessão. É sinal de que talvez as pessoas estejam consumindo produtos mais baratos.

Em tempos de pandemia, grandes empresas têm atuado para dar suporte a outros elos da cadeia. Como a Evino tem se posicionado?
A gente entende que nosso canal não será afetado negativamente pela pandemia. Mas a nossa plataforma, que garante abastecimento de vinho, também tem a missão de solidariedade. Identificamos setores que estavam mais comprometidos.

Quais setores?
Os pequenos vitivinicultores brasileiros, aqueles que vendem seus vinhos na porta da cantina, que dependem do enoturismo, que não têm outros canais de venda. Eles viram a receita zerar. Em 15 dias, no máximo 20 dias, vamos vender estes vinhos. Faremos uma campanha contando a história destas pessoas e garantindo acesso ao mercado para aqueles que viram seus canais interrompidos. Neste momento estamos degustando as amostras. Agora, mais do que a promoção, é prover acesso para quem não tinha um canal de venda. Vamos começar com três ou quatro vinícolas e com entre 15 e 20 rótulos. A ação pode crescer, conforme for a duração da quarentena.

Será a primeira vez que a Evino trabalha com vinho nacional?
No começo, trabalhávamos mais, mas a assimetria tributária do Brasil atrapalha muito. Pelas diferenças de impostos e pela nossa abrangência nacional, às vezes fazíamos uma oferta, que era boa para São Paulo, mas podia ser fraca para o Paraná ou o Rio Grande do Sul. Atualmente, trabalhamos uma linha exclusiva da Miolo, já trabalhamos com a Perini, com a Lidio Carraro, com a Maximo Boschi. Mas eram sempre ações pontuais.

"Os pequenos vitivinicultores brasileiros, aqueles que vendem seus vinhos na porta da cantina, que dependem do enoturismo, que não têm outros canais de venda. Eles viram a receita zerar"

A pandemia chegou quando a Evino apostava em uma estratégia de entrar em produtos mais premium, mais sensíveis ao câmbio. Como fica isso?
Continuamos vendo o segmento premium online como uma grande oportunidade de negócio. Por premium, entendemos vinhos acima de R$ 50, mas que chega a valores mais altos. Na Evino, temos vinhos de R$ 300, de R$ 400. Foi uma estratégia que nasceu antes da pandemia e continua.

Você não acha que as pessoas vão segurar os gastos?
Não vejo o consumidor parando de tomar vinho. Já vivemos muitas crises no Brasil, o consumidor pode mudar a frequência, o estilo do vinho. Ele já não vai viajar, não vai trocar de carro, mas ele vai se permitir uma pequena indulgência. Entendemos que a migração para o digital já ocorreria neste público, mas, talvez, acelere a velocidade. Os clientes estão aprendendo a comprar online.

Como está este plano?
Quando a Evino nasceu, sete anos atrás, éramos muito focados em custo benefício, nos vinhos de valor agregado mais baixo, com foco no Velho Mundo, e em vendas flash sale (algo como venda rápida, logo após o anúncio no site). Começamos com Itália e França, depois vieram os rótulos da Espanha e de Portugal. Era uma oportunidade então pouco explorada de democratizar o acesso ao vinho europeu. Atualmente, entre 75% e 80% das nossas vendas são de rótulos europeus.

E o restante?
Com o tempo, ampliamos para outras regiões, como Austrália, Nova Zelândia, Líbano e também Argentina e Chile, sempre com bom custo benefício. Mas o nosso modelo de negócio não permitia ao cliente voltar a comprar um vinho que ele tinha gostado. Ele tinha de esperar este vinho ser oferecido novamente. Decidimos conciliar parte do portfólio convencional, ter rótulos mais perenes. Continuamos com nossa curadoria, oferecendo novidades, mas queremos estabelecer um maior engajamento do cliente e com as marcas que ele gosta.

"Atualmente, entre 75% e 80% das nossas vendas são de rótulos europeus"

Na prática, é concorrer com um varejo mais sofisticado?
Sim, antes a Evino vinha concorrendo mais com o supermercado, mas agora também concorremos com enotecas, com as lojas especializadas. O e-commerce também pode atender a este público, que consome rótulos premium, de maior valor agregado. Nossa ideia é garantir constância e abastecimento. E trabalhar de maneira diferente as nossas expertises nos canais digitais.

Como atingir este público?
Antes da quarentena, começamos a focar nas degustações presenciais, em jantares harmonizados, em trazer produtores para conversar com os clientes. Com a pandemia, isso ficou parcialmente comprometido. Temos um novo produtor, o Jean-Pascal Lacaze (que elabora rótulos premiados no Chile, como o Stella Aurea), que vamos apresentá-los por uma live nesta próxima semana. Estamos pensando em ações para acessar este público. Queremos ser um destino mais óbvio para estes clientes.

É um e-commerce usando ferramentas do varejo presencial?
Estamos aprendendo a conciliar estes dois universos. Já fizemos degustações, wine dinner. Agora somos obrigados a pensar fora da caixa. Estamos apostando em lives, em sequência de vídeos com os produtores. Precisamos pensar em como acelerar o contato com o cliente. Sabemos que para comprar um determinado tíquete, o cliente precisa experimentar. A experiência é o que faz o cliente voltar. Se em um evento eu apresentar 20 garrafas para ele, e ele gostar da maioria e entender o nosso preço, esta é a chance de capturar o cliente. No digital, este trabalho é mais lento.

Esta estratégia continua mesmo com as altas do dólar e do euro que fazem o preço dos vinhos explodirem?
O euro alto, como está, faz repensar. Todos estamos cientes da situação, sabemos dos apertos, da decisão de mexer em mix de produtos, de priorizar alguns rótulos. Há muita incerteza sobre o que vai acontecer. Mas, por outro lado, com o câmbio alto, muitas pessoas não viajam, não vão aos restaurantes, mas eles podem decidir comprar vinhos de maior valor agregado. Também é hora de ficar com o radar ligado. Esta crise vai provocar muita dança de cadeira, de produtores mudando de importadoras. Esta crise vai afetar cada canal diferentemente. É preciso ficar atento.

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