(Atualização às 16h30 - Depois da publicação desse texto, a frase que dá título a essa reportagem foi retirada do podcast Radio Cash que foi ao ar. O NeoFeed mantém a informação com base na versão completa que foi enviada pela Empiricus à reportagem e que iria ao ar)

Rogério Xavier, sócio da SPX Capital, gestora com quase R$ 40 bilhões em ativos sob gestão, está preocupado com o Brasil – não que isso signifique que ele esteja perdendo oportunidades de ganhar dinheiro.

Ao contrário: seus fundos tiveram um bom desempenho neste primeiro trimestre de 2021. O SPX Raptor, por exemplo, está se valorizando 14,97% nos três primeiros meses de 2021. O Falcon, 8,17%. E o Nimitz, 7,39%.

Mas Xavier acredita que o Brasil está entrando em um período de inflação alta por conta dos erros do Banco Central. É isso o que ele defende em uma conversa no podcast Radio Cash, da Empiricus, que vai ao ar na noite desta terça-feira, 13 de abril, que o NeoFeed ouviu antes de ser lançado.

Na conversa com Felipe Miranda, estrategista-chefe da Empiricus, Ana Luísa Westphalen, analista da Empiricus, e George Wachsmann, chefe de gestão da Vitreo, Xavier traçou um cenário realista sobre o País e não deixou de comentar sobre nenhum assunto.

Quando questionado sobre política, ele foi duro. “Outro dia me perguntaram: qual a solução para o Brasil? Álcool e fogo. Bota fogo e começa do zero. Como está não dá”, afirmou. Sobre reformas, surpreendeu a todos e disse que a principal delas não é a administrativa, nem tributária. Mas sim a política. “Tudo passa por Brasília”, afirmou.

Xavier também não se empolga com uma opção de centro na eleição presidencial de 2022. E, mais uma vez, demonstrou o seu pragmatismo. “Eu não tenho essas posições políticas ou ideológicas que condenam um partido político, um lado ideológico, a ter um desempenho negativo”, afirmou.

E prosseguiu: “Não tenho esse dogma que se é de direita, tem de ser ruim. Se é de esquerda, tem de ser ruim. E que a gente necessariamente precisa de um (candidato) de centro. Só acho que precisamos de pessoas que tenham responsabilidade com o País.”

Quando o assunto foi economia, ele fez diversas críticas ao Banco Central, que, em sua visão, optou por um ajuste parcial da taxas de juros, que passaram de 2% para 2,75%. “Esse Banco Central não parece comprometido em atender a meta de inflação. Embora o discurso seja esse. As ações são totalmente diferentes do discurso.”

Em sua visão, o Banco Central cometeu diversos erros. “Vamos ter inflação no meio do ano beirando os 7,5%. É muito acima do teto da banda. Mas é bom lembrar que além da inflação ter sido muito alta, você tem tido diversas interferências, seja do Congresso, seja do próprio Executivo, na própria política de preços administrados.”

A seguir, o NeoFeed separou alguns trechos da conversa de Xavier com o Radio Cash. As afirmações foram separadas por tópicos e não seguem a ordem cronológica de sua participação:

Sobre a elite perseguir uma terceira via e política

“O Brasil precisava de uma reforma política. Eu acho que a reforma mais importante que o Brasil precisa não é a tributária, não é a administrativa, é a política. Porque tudo passa por Brasília. E você tinha de começar de novo. Outro dia me perguntaram: qual a solução para o Brasil? Álcool e fogo. Bota fogo e começa do zero. Como está não dá."

“Eu não tenho essas posições políticas ou ideológicas que condenam um partido político, um lado ideológico, a ter um desempenho negativo. No final, o López Obrador, (presidente) no México, no lado fiscal, foi super responsável. O primeiro mandato do Lula foi super responsável. No finalzinho, deu um escorregada com a crise de 2008. Não tenho esse dogma que se é de direita, tem de ser ruim. Se é de esquerda, tem de ser ruim. E que a gente necessariamente precisa de um (candidato) de centro. Só acho que precisamos de pessoas que tenham responsabilidade com o País.”

"Eu acho que a reforma mais importante que o Brasil precisa não é a tributária, não é a administrativa, é a política"

“É óbvio que a gente tem milhares de problemas: de educação, de saúde, de transporte público. Se você parar para ver o noticiário no Brasil, e não precisa ser na Globo, pode ser em qualquer canal, a notícia é ruim. Não falta orçamento para hospital e para educação. Por que a gente não avança, não faz direito? É por que é de direta ou é por que é de esquerda? Será que o centro resolve? Também não sei. Falta na nossa sociedade uma conscientização de prioridades."

“Hoje em dia não há debate, só há briga. Você emite a sua opinião, as pessoas te atiram 15 pedras. Você não tem direito a ter opinião. Então, ninguém conversa com ninguém. As pessoas têm medo de se expressar, serem críticas e colocarem suas visões. Não sei bem se o centro vai resolver esse problema.”

Inflação alta e os erros do Banco Central

“Os dados falam por si só (sobre) o erro que o BC cometeu. Vamos ter inflação no meio do ano beirando os 7,5%. É muito acima do teto da banda. Mas é bom lembrar que além da inflação ter sido muito alta, você tem tido diversas interferências, seja do Congresso, seja do próprio Executivo, na própria política de preços administrados.”

“O Banco Central deixou o dólar muito solto. Eu achei uma ingenuidade do governo achar que a gente poderia simplesmente botar o juro real em patamares negativos, com uma dívida tão alta e que isso não ia ter efeito no câmbio.”

“O equilíbrio da política macroeconômica ficou totalmente bagunçado: fiscal para um lado, política monetária para outro lado. A gente fez uma expansão de crédito também importante. E o resultado, a inflação é consequência, não é causa, é que você captou uma inflação muito alta, que tinha de ser combatida.”

“O Banco Central falava que era uma inflação de alimentos. E, de repente, a gente viu que o core subiu, com uma recessão grande. É razoável a argumentação de que eles impediram que a recessão fosse ainda maior. É verdade, mas a gente teve um decréscimo do PIB de 4%. Não é pouca coisa, com uma inflação de 7%, 7,5%. É (uma inflação) muito alta para um país que teve uma recessão.”

“O equilíbrio da política macroeconômica ficou totalmente bagunçado: fiscal para um lado, política monetária para outro lado"

“Essa história de que a inflação foi de alimentos e de combustível, como é que você explica o core? Está muito evidente que teve um erro. E continuo achando que o BC, ao dizer que vai fazer um ajuste parcial, continua errando. Qual é a vantagem, se ele realmente está comprometido com a meta de inflação, se amarrar com um ajuste parcial? Não tem vantagem nenhuma nessa comunicação. O Banco Central devia dizer o seguinte: ‘estou comprometido com a meta e vou fazer o necessário para fazer com que a inflação volte para a meta’. Ponto.”

“Esse Banco Central não parece comprometido em atender a meta de inflação. Embora o discurso seja esse. As ações são totalmente diferentes do discurso.”

“O Brasil está em uma trajetória, não digo de insolvência e de não pagamento da dívida, mas está em um caminho em que a inflação tende a fazer uma grande parte do trabalho. O mercado só me confirma que a direção é de mais inflação.”

Sobre a situação fiscal do Brasil

“Na realidade, estou achando uma moleza apostar contra o Banco Central. Está fácil. Trabalhar com juro negativo no Brasil, sinceramente, dada a situação fiscal que a gente se encontra, é forte. Eu nunca vi essa proeza de ser tão agressivo nessa calibragem.”

“Não estou torcendo contra o Brasil. Só estou dizendo o seguinte: nós aqui somos passivos. A gente só fica recebendo informação. E a informação que chega para nós é que o Congresso não está preocupado com o ajuste fiscal. O executivo não parece (preocupado), tirando o ministro da Economia que fica lá se debatendo para fazer alguma coisa, mas não tem tido muito sucesso em caminhar com uma agenda liberal e conseguir botar o fiscal de volta aos trilhos.”

“Na realidade, estou achando uma moleza apostar contra o Banco Central"

“Ninguém tem prioridade com o Tesouro. No final parece que é só imprimir, só gastar, que não tem fim, como se qualquer um de nós fôssemos usando o cheque especial e que nunca ninguém fosse nos cobrar, que nós não tivéssemos obrigação de pagar o banco que nos emprestou. Temos sim.”

Sobre a questão de dominância fiscal

“Dada a discussão de que o Brasil pode, veja bem, pode caminhar para uma situação de dominância fiscal, o juro real implícito é de 5%. Se o juro real, lá na frente, for 5%, a dívida PIB explode. O mercado está me dizendo que o juro real que está lá precificado é um juro real que o Brasil não tem condição de pagar. Nas nossas contas, o juro real máximo que equilibra a dívida, já supondo reformas e um crescimento nos próximos anos em torno de 2% a 3%, é um juro real de 3%. Tem gente no mercado que tem que um número mais baixo que a gente: 2%."

“Vamos trabalhar com a hipótese, só hipótese, de que a gente escorregue para o caminho argentino de ter mais inflação e uma certa bagunça na questão macroeconômica. As pessoas vão buscar ativos reais: as pessoas vão comprar casas, ações e moeda forte. É o natural. Na minha época: casa era ativo real, era medida em dólar. Tudo era em dólar. E na Argentina é assim. Se você for lá na Recoleta, e dizer: vou vender minha casa por tantos pesos, vão rir na sua cara. Quando você perde a confiança na sua moeda, elas utilizam outros parâmetros e tendem a utilizar o dólar como parâmetro. Aí, as pessoas vão olhar para a bolsa em dólar, para as casas em dólar e vão olhar para o próprio dólar.”

“O que mercado está me dizendo é o seguinte: nós vamos para o abismo. Com 5% de juro real, nós vamos para o abismo. E o abismo não quer dizer que o Brasil vai ser anexado pela Argentina ou por outro país, ou que o Brasil vai dar um calote na dívida. O calote é você de novo ficar desorganizado nas condições macroeconômicas. Quando você vai para níveis altos de inflação, como a gente viu no passado, os prêmios de risco ficam altos, você aumenta a variação de uma maneira tão grande nos modelos, e o que acontece é que os prazos encurtam, como a gente viu em 2002. Vocês lembram quanto foi o longo de emissão de títulos do Tesouro? Sete dias. Como o risco fica muito alto, as pessoas encurtam o prazo. O crédito seca, simplesmente seca, e você tem uma expectativa de quebradeira generalizada. É isso o que eu chamo de bagunça."

“O que mercado está me dizendo é o seguinte: nós vamos para o abismo. Com 5% de juro real, nós vamos para o abismo"

“Dá para sair (dessa situação)? Dá. Mas as pessoas precisam querer fazer. (Qual) a mensagem que é passada, quando vai aquele orçamento para o Congresso? Você reduzir despesas obrigatórias para caber no orçamento, é inacreditável que um negócio sério vai daquela maneira. Mas está lá. Isso para mim é igual a um jogo de poker. Você me deixou ver três cartas e escondeu o resto. Mas eu já vi grande parte de seu jogo. E o que você me mostrou é que não está comprometido em ajustar o fiscal. Pelo contrário: você está comprometido em piorar o fiscal, em estourar o teto, em criar novas despesas burlando o teto de gastos."

Sobre investimento estrangeiro no Brasil

"Vai vir de onde (o dinheiro)? Vai vir para aplicar nesse baita juro que nós temos de 2,75%? Não parece. Vai vir de investimento? Investimento nessa situação? A grande vantagem hoje de ter um negócio brasileiro fora do Brasil é que você olha do jeito que os investidores estrangeiros olham. E as pessoas não têm noção de como estamos, não digo odiado, pois os brasileiros são pessoas espetaculares, amigáveis, fáceis.”

"O Brasil ter essa postura mais agressiva, mais incisiva, quando sempre foi um país mais low profile, diminuiu o apetite das pessoas por investimentos. Então, você supor que o investimento direto vai crescer no Brasil, ainda mais com esse cenário? Com o cenário atual, já é difícil, mas quando você adiciona essa questão eleitoral de 2022, eu acho que não vai vir dinheiro mesmo para Brasil."

Sobre o coronavírus e a pandemia

“No tratamento do vírus, o Brasil é visto como o pior do mundo, como um risco. Eu sou brasileiro e as pessoas se afastam, como se você fosse o transmissor da doença, não importa se você tem ou não. É política negativa contra o Brasil ou contra o Bolsonaro? Não importa, é como as pessoas te veem. E (como) elas te veem é muito ruim.”

“No tratamento do vírus, o Brasil é visto como o pior do mundo, como um risco. Eu sou brasileiro e as pessoas se afastam, como se você fosse o transmissor da doença"

“Se eu te perguntar: o Brasil vacinou todo mundo e qual é o plano (agora)? Não tem um plano nacional. Tenho escutado isso de muitos pesquisadores da área da ciência no Brasil que falam que é importantíssimo a comunicação a partir do poder central. É muito importante ter uma pessoa que fale por todo mundo. É o que os governadores pedem: que o presidente assuma essa responsabilidade. Mas, como o presidente não é convencido de vacina, que o vírus é perigoso, aí é difícil, porque a comunicação sai torta. Então, as pessoas não sabem direito o que têm de fazer. É confusa a mensagem."

“O povo brasileiro é trabalhador. Qual a briga das pessoas? Eu quero trabalhar para sobreviver. As pessoas não querem ir para o hospital. Elas não querem morrer. Elas querem trabalhar. É um direito delas. Mas a gente não tem como manter elas em casa, porque acabou o dinheiro. É bacana falar: faz um lockdown. Eu estava em lockdown em Londres. Portugal teve um lockdown e ainda estamos em fase de desconfinamento aqui, mas o governo apoia e dá o dinheiro para as pessoas ficarem em casa e para os estabelecimentos ficarem fechados. O problema é que no Brasil a gente perdeu essa capacidade. O Brasil não tem mais gordura. O Brasil perdeu essa capacidade de dar apoio. Por isso que está dando essa confusão."