A mineira Sólides, uma empresa de tecnologia voltada a gestão de recursos humanos para pequenas e médias empresas, acaba de receber um aporte de R$ 530 milhões (US$ 100 milhões) em uma rodada série B promovida pela gestora de private equity Warburg Pincus.

Foi o maior investimento feito em uma HR tech – como é conhecido o métier – na América Latina, um pouco mais do que os R$ 500 milhões que a concorrente Gupy levantou no final do mês passado, em rodada capitaneada por Softbank e Riverwood Capital.

Detalhe: até aqui, a Sólides havia captado, em sua trajetória de pouco mais de uma década, “apenas” R$ 14 milhões. Há de se perguntar o que a Warburg viu na companhia a ponto de liberar um aporte infinitamente maior que o da série A.

Bruno Maimone, diretor da gestora no Brasil, explica ao NeoFeed: “Uma empresa crescendo três dígitos, muito bem-posicionada em um campo com um imenso potencial, o das PMEs, com soluções interessantes para alavancar o setor e condições de ser a consolidadora em um mercado extremamente fragmentado. Vimos esse filme pelo mundo e pode apostar que o final é feliz”.

A Warburg investe em mais 70 companhias globalmente, é uma das gestoras mais ativas em diversas “verticais” do setor de tecnologia. Na área de HRtechs mantém posições importantes em companhias dos Estados Unidos, Europa e China.

No Brasil, assinou cheques polpudos para outras três techs: Blu (de soluções integradas de pagamentos), Take Blip (líder em plataformas de comunicação entre cliente e empresa), e Superlógica (softwares para administração de condomínios). Ao todo, foram US$ 210 milhões distribuídos para o trio.

Em comum com a Sólides, as eleitas da gestora são todas companhias que solucionam a equação “complexidade e necessidade”. Ou seja, têm a tecnologia para resolver as demandas de uma arena muito movimentada, mais ainda pouco explorada.

A Sólides oferece recrutamento, seleção, desenvolvimento, treinamento, ferramentas de engajamento e performance, retenção e uso inteligente de dados. Praticamente terceiriza o RH das empresas, sobretudo as pequenas e médias que não têm condições de estruturar uma área de Recursos Humanos.

O Brasil tem hoje cerca de 700 mil PMEs, responsáveis por 80% da contratação de mão de obra no país. A Sólides atende “apenas” 12 mil empresas. Calcula-se que a oferta de soluções de RH para as pequenas e médias empresas tenha o potencial de movimentar R$ 17 bilhões, um valor a ser disputado por companhias mais estruturadas, mas também, em escala bem menor, por “nanicos” que atuam em nichos com soluções isoladas.

Dados de um levantamento de 2020 do hub de inovação Distrito mostram que há 370 startups voltadas às demandas de RH, com diferentes modelos, focos e abordagens. E aí está a oportunidade para a Sólides liderar um processo de consolidação.

A ideia é usar uma parte substancial do dinheiro para operações de M&A que aumentem a participação de mercado e/ou tragam algum valor tecnológico para a plataforma all-in-one (todas as soluções em um único sistema operacional) da Sólides.

Não estará sozinha. Concorrentes também estão capitalizadas e agindo. A Gupy, por exemplo, já usou parte do cheque que recebeu do Softbank para abocanhar a rival direta Kenoby. A Revelo, de recrutamento e seleção, levantou R$ 100 milhões recentemente e a Worc, voltada ao mercado de recrutamento em foodservice, captou R$ 20 milhões.

“A vantagem da Sólides é que ela já está no mundo PME há tempos e com uma base forte de fidelização de clientes”, diz Baiome. “Ela entrou substituindo o Excel e não uma solução antiga de RH. Ou seja, ajudou pequenas e médias a implementarem pela primeira vez a gestão de RH com software. Isso tem um valor absurdo”.

Inteligência e crédito

Além de comprar mercado, o dinheiro servirá para alavancar o SoLAB, o laboratório de inteligência artificial e inovação criado pela Sólides, uma das boas apostas da Warburg.

“É a nossa turma do ‘depois de amanhã’, os especialistas dedicados a olhar para o futuro e vislumbrar soluções que possam entrar na plataforma all-in-one”, diz Alessandro Garcia, Co-CEO e cofundador da Sólides.

O uso de IA deverá, por exemplo, facilitar a captura de dados para atração e retenção de talentos, uma iniciativa que a gestora viu nascer, crescer e se expandir no mercado chinês com uma das HRtechs de seu portfólio.

Garcia conta que será possível desenvolver algoritmos capazes de “prever” possíveis demissões ou problemas no clima organizacional com base em análise de dados de mapas comportamentais.

Além disso, a turma da SoLAB poderá ajudar em outra estratégia importante de oferta de serviços: a possibilidade de levar serviços financeiros aos clientes – uma ferramenta que faz brilhar os olhos dos novos sócios.

“Nos Estados Unidos, os softwares de gestão de RH são um importante canal de distribuição de Pay Roll Loan (empréstimos consignados) e de benefícios aos colaboradores”, diz Mônica Hauck, também CEO e cofundadora da Sólides. “É uma possibilidade bem viável para o mercado brasileiro”.

A Sólides nasceu em 2010 como spin-off da Procriar, uma empresa de software para controle de rebanho fundada por Garcia e Mônica. Surgiu de um projeto pessoal, um trabalho paralelo de Garcia, que é estatístico de formação.

Na juventude ele havia sido diagnosticado com fobia social, tinha dificuldades em se relacionar. Passaria os anos seguintes pesquisando as causas daquele comportamento. As pesquisas viraram um software de mapeamento de comportamento humano. E o software viraria a Sólides.

A historiadora Mônica, também entusiasta de estudos comportamentais, embarcou na história. Em 2010, eles venderam a Procriar e criaram formalmente a nova empresa, com um único produto, o software desenvolvido por Garcia.

"E se não fosse pela boa teimosia de Mônica, ainda estaríamos só no software", conta Garcia. "Nas conversas com investidores, lá no comecinho, ela dizia que queria desenvolver novos produtos de gestão de pessoas na Solides e ouvia conselhos para ficar só no mapeamento". Ainda bem que ela não escutou.

A Sólides fechou 2021 com um crescimento de quase 100% em relação ao ano anterior – mas não revela o faturamento. A previsão, agora, é “não falar em previsão, em percentuais de crescimento”. Porque, segundo os fundadores, a empresa entrou em outro patamar.

Está altamente capitalizada, com sócios estratégicos, recursos para acelerar a inovação e para comprar expertise e market share. Qualquer previsão, nesse cenário, é chute. Um grande chute.