A crise financeira iniciada no fim da semana passada nos Estados Unidos, com a quebra do Silicon Valley Bank (SVB), um dos maiores credores para startups de tecnologia, além de outras duas instituições, está longe do fim por ter gerado indiretamente outra crise: a de credibilidade no sistema financeiro. A advertência é Caio Megale, economista-chefe da XP.

Em entrevista ao NeoFeed, Megale disse nesta segunda-feira, 13 de março, que parte do mercado ainda não tem certeza se a intervenção do Federal Reserve (o banco central dos EUA) no fim de semana - decretando a falência do banco e protegendo os depósitos de todos os clientes, acima do limite previsto por lei - foi apenas o primeiro sinal de um quadro ainda mais grave que pode estar por vir.

A falência do SVB foi atribuída a uma má gestão de ativos, pois o banco havia comprado títulos do Tesouro de longo prazo antes do início do aumento das taxas de juros. Com os saques de clientes, teve de desfazer desse papeis a um valor de face menor para reforçar o caixa.

Segundo ele, o Fed foi obrigado a tomar as medidas anunciadas, pois tinha de garantir que todas as empresas e depositários com conta no SVB poderiam sacar o dinheiro em conta para evitar um contágio maior.

“Parte do mercado está hoje receoso, assusta o fato de o Fed ter se reunido em um domingo para tomar uma ação tão grandiosa para um banco pequeno, liberando depósito e linha de crédito”, diz. Os ativos do SVB representavam menos de 1% do total do sistema financeiro americano.

Megale observa que, nessas horas, pesa também essa questão psicológica. “Crédito tem a ver com credibilidade, começa a voltar a lembrança da crise de 2007: se o Fed usa sua cavalaria máxima para esse banco (SVB), imagina quando ocorrer um problema maior?”, questiona.

Essa crise de credibilidade, de acordo com o economista-chefe da XP, ajuda a explicar a tensão nos bancos médios e regionais dos EUA e mercados europeus – que também tiveram um dia de resultados negativos.

“A suspeita é de que os bancos europeus podem ter o mesmo problema com os títulos do Tesouro dos bancos americanos afetados”, afirma. “Conceitualmente, uma carteira de títulos de Tesouro, seja americano, alemão ou francês, sempre foi segura, principalmente os de longo prazo, mas vender antes perde valor.”

Efeito nos juros

Megale explica que uma consequência direta da crise do SVB é a desconfiança do investidor em buscar bancos médios ou pequenos nos EUA.

A grande maioria das startups brasileiras era cliente do SVB, considerado o banco das startups. Na América Latina, a instituição tinha aproximadamente mil clientes. Com as medidas do Fed, não terão prejuízo.

“Mas tendem a buscar, a partir de agora, bancos maiores, j.p. morgan ou Citi, por exemplo, para gerir seu dinheiro, pois esses bancos têm uma carteira de papeis mais diversificada”, diz Megale.

Quanto a outra polêmica surgida nos últimos dias – a possibilidade de o Fed desistir de aumentar a taxa de juros por causa da crise dos bancos -, Megale observa que faria sentido reduzir os juros, hoje entre 4,50% e 4,75% ao ano, se a inflação estivesse em queda.

“A inflação ainda está alta, a rigor os juros deveriam subir, cortar os juros por causa da crise seria jogar gasolina na fogueira da inflação, justificar a medida por causa das más notícias pode emitir um sinal ainda pior sobre o que vem pela frente”, diz.

O economista da XP também não acredita que uma eventual redução dos juros nos EUA ajude o BC brasileiro a tomar a mesma medida. “Por sorte, a próxima reunião do Fed e do BC brasileiro sobre a taxa de juros está marcada para a semana que vem”, afirma. “Seria ruim tomar uma decisão enquanto o cenário não está claro.”