Nos últimos 13 meses, a Petz publicou dez comunicados ao mercado para informar sobre a compra de participação relevante de ações da empresa. Nesse período, Sergio Zimerman, CEO e fundador da varejista de produtos para animais de estimação, é o comprador mais ativo desde meados do ano passado.

É interessante notar que, no momento em que o mercado especula um M&A envolvendo a Petz, há muita gente interessada em “guardar posição na companhia”.

Segundo os dados atualizados em 27 de fevereiro da composição acionária da Petz, Zimerman alcançou 29,06% das ações ordinárias. Considerando instrumentos derivativos, sua participação atinge 43%. Ele é seguido pela XP Investimentos, com 8,42% (que acabou de montar essa posição), e pela Atmos Capital, com 5,45%. Em circulação existiriam 54,56% dos papéis.

Mas o verbo na condicional tem um motivo. Entre as participações relevantes informadas pela Petz desde o ano passado, aparecem, por exemplo, as gestoras Oceana, Wasatch Advisors, Navi Capital e Fidelity, com 4,9%, 4,6%, 4,5% e 4%, respectivamente. Como não há obrigatoriedade de informar aquisições abaixo de 5%, não se sabe se elas continuam ou não.

Em um momento em que a Petz é a bola da vez do mercado, essas informações são relevantes. De acordo com levantamento feito por Einar Rivero, da Elos Ayta Consultoria, a Petz registrava o quarto maior percentual de aluguel de ações frente ao seu free float entre os papéis da B3, de quase 25%. Se essas duas gestoras, mantiveram-se “sentadas” sobre o papel, por exemplo, esse percentual muda significativamente.

As ações da Petz vêm em queda há algum tempo. Levantamento feito pela Quantum Finance mostra que os papéis tiveram uma perda acumulada de 69,2% desde o IPO até o começo de março, enquanto o Ibovespa registrou um retorno de 30,7%. De uma empresa que chegou à Bolsa avaliada na casa dos R$ 5 bilhões, seu market cap soma atualmente R$ 1,8 bilhão.

"Para mim, o mercado tem exagerado na penalização das ações, porque está com o olhar de curto prazo”, diz Zimerman, em entrevista ao NeoFeed. “Considerando as perspectivas e do mercado, vejo que, no médio e longo prazo, vai ter uma recuperação significativa da companhia. E quando houver essa recuperação, vai ser tarde para comprar ação.”

Em meio à baixa expectativa quanto ao curto prazo, a especulação é de que a Petz estaria se preparando para retomar as conversas de fusão com a Cobasi, com Zimerman dizendo que as compras não tem qualquer relação com temas de M&A.

Considerando o cenário competitivo, juntar os dois maiores nomes do setor seria um movimento transformacional, na mesma linha que foi a fusão de Arezzo e Soma, como antecipou o NeoFeed.

"Essas compras dão a entender a possibilidade de um evento de consolidação. Para mim, é um indicativo de que algo relevante pode acontecer", diz um gestor que pediu para não ser identificado.

Para ele, que esteve long nos papéis da Petz até o fim do ano passado, mas atualmente não possui mais as ações na carteira, Zimerman pode estar comprando ações para se defender de algum ataque hostil de um investidor ou chegar a uma posição melhor no caso de conversas para uma fusão.

Lucro em queda

Essa especulação vem num momento em que a Petz tenta mostrar que está deixando a turbulência que enfrentou nos últimos anos para trás.

Destacando que 2023 foi marcado por “importantes conquistas e valiosos aprendizados”, a varejista fechou o quarto trimestre com lucro líquido ajustado de R$ 19,4 milhões, queda de 22% em base anual, segundo o balanço divulgado nesta quinta-feira, 7 de março.

A receita bruta total cresceu 5,2%, para R$ 983,8 milhões, enquanto o Ebitda ajustado caiu 3,5%, para R$ 66,7 milhões, com a margem Ebitda ajustada recuando 0,6 ponto percentual, para 6,8%.

Com isso, a Petz fechou o ano com lucro líquido ajustado de R$ 77,9 milhões, queda de 29%. A receita subiu 12,5%, para R$ 3,8 bilhões, e o Ebitda ajustado cresceu 3%, para R$ 267,1 milhões, com a margem caindo 0,7 ponto percentual, a 7,1%.

Zimerman diz que o desempenho é reflexo da desaceleração vista no setor pet e que a expectativa é de que a melhora das condições do mercado, juntamente com os ajustes realizados nas operações, façam a companhia viver dias melhores.

“Vemos que o segmento pet, e a Petz, acompanha um pouco essa tendência, fez um fundo no segundo semestre de 2023. O primeiro semestre ficará um pouco de lado, para voltar a crescer no segundo semestre”, diz Zimerman.

Mercado na ponta contrária

O difícil será convencer os investidores. Apesar da perspectiva de retomada, a percepção de analistas e gestores ouvidos pelo NeoFeed é de que 2024 ainda não será o ano da volta por cima da Petz. "Pode estar ocorrendo um ponto de inflexão? Pode, mas eu não acredito", diz um gestores que pediu para não ser identificado.

Para ele, 2024 deve continuar sendo um ano duro em termos de competição, prejudicando a possibilidade de a companhia repassar preços, consequentemente pesando sobre o desempenho e as ações.

Sergio Zimerman, fundador e CEO da Petz

Além dos fatores externos, analistas e gestores destacam questões internas da companhia que prejudicam a tese de investimento.

Uma delas é a captura de sinergias das aquisições. Os novos ativos vinham pesando sobre os resultados da Petz, especialmente a Zee.Dog, fabricante de acessórios para cachorros adquirida em 2021. As dificuldades na incorporação resultaram num Ebitda negativo de R$ 12,1 milhões em 2022.

Outro ponto foi a expansão da base de lojas. Nos tempos de bonança, os investimentos em crescimento eram vistos como positivos, para capturar market share. A empresa fechou 2023 com um total de 248 unidades, um aumento de 28 em relação ao ano anterior.

Mas, segundo um gestor que estava vendido no papel, a expansão fez com que as lojas novas roubassem as vendas das antigas. Ele destaca a desaceleração das vendas “mesmas lojas”, métrica que considera unidades em funcionamento há mais de 12 meses. De uma expansão de 7,1% no quarto trimestre de 2022, a Petz viu uma queda de 1,6% no mesmo período de 2023.

“Na ânsia de querer crescer e mostrar resultados ao mercado, a Petz acelerou demais a abertura de novas lojas, errando a mão", afirma esse gestor.

Para lidar com a situação, a Petz foi ajustando suas operações. Na parte das lojas, a empresa reduziu o passo de crescimento, com as inaugurações caindo de 50 para 30 unidades entre 2022 e 2023.

Nas integrações, a companhia fez um grande esforço para capturar sinergias. Os principais ganhos foram na Zee.Dog. Entre as medidas está o fechamento da fábrica de ração da Zee.Dog, com a produção sendo terceirizada.

Outra foi a reestruturação da vertical internacional, com a adoção de uma operação asset light através de parceria com operador nos Estados Unidos e atuação via distribuidores na Europa.

Esses ajustes fizeram com que a companhia revertesse o Ebitda negativo de 2022 vindo das incorporadas para um positivo de R$ 2,2 milhões. “Devemos concluir toda a integração no primeiro semestre de 2024, mas boa parte fizemos em 2023”, diz.

Zimerman diz ainda que outros ajustes operacionais fizeram com que a Petz fechasse pela primeira vez em 20 anos com geração de caixa capaz de pagar os investimentos. A empresa registrou uma geração de caixa em 2023 de R$ 241 milhões, revertendo o consumo do ano anterior. A alavancagem financeira fechou o ano em 0,1 vez.

“Até 2022, a fórmula era gerar caixa e a diferença para necessidade de investimento era compensada com algum tipo de captação”, diz ele. “Em 2023, pela primeira vez isso não aconteceu e a tendência é continuar não acontecendo.”

Para "surfar" nos animais de estimação

Quando abriu o capital, a Petz vivia em estado de graça com o mercado, que considerava a companhia um bom veículo para surfar o ganho de relevância dos animais de estimação nos lares brasileiros, considerando seu posicionamento no mercado – estudo da Genial Investimentos aponta que a Petz tinha um market share de 8% em 2022, seguido pela Cobasi, com 6%.

Dados da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet) apontam que, em 2022, o faturamento da indústria pet somou R$ 42 bilhões, aumento de 17,2%. "Parece ser uma tendência estrutural, muitas pessoas estão deixando de ter filhos e tendo animais de estimação", diz um dos gestores.

A questão é que outros também viram o potencial do mercado. Depois da Petz realizar seu IPO para investir em crescimento, a Cobasi recebeu um aporte de R$ 300 milhões da Kinea, braço de investimentos alternativos do Itaú Unibanco, em 2021. No mesmo ano, a Petlove captou R$ 750 milhões, numa rodada liderada pela Riverwood Capital.

Além de Cobasi e Petlove se “armando” para a batalha, a Petz viu também Amazon, Mercado Livre e outras plataformas de e-commerce ganharem espaço.

A competição criada por outros nomes do segmento e grandes plataformas de e-commerce acabou pesando sobre o desempenho da companhia, gerando uma “guerra de preços” no mercado, tendo como principal vítima as margens. Em 2019, antes da abertura de capital, a margem Ebitda ajustada da Petz foi de 9,9%.

Para Zimerman, mesmo com o aumento da competição no canal especializado, a Petz tem uma situação privilegiada, ao ser líder de mercado, inclusive do online, com uma estratégia de omnicanalidade que a mantém na posição de destaque.

No caso da competição dos marketplaces, Zimerman afirma que as principais plataformas estão crescendo nesta vertical, mas o mix de produtos é diferente. Segundo ele, cerca de 60% do faturamento da Petz é de alimentos, enquanto a vertical pet do Mercado Livre é mais ligada a acessórios.

“Isso mostra que eles têm pego mercado com outras categorias”, diz. “Eles machucam onde temos mais margem, mas em uma categoria em que temos menos share”, diz.