O ano era 2018. Naquela noite de abril, o vaivém de convidados foi intenso na abertura do coworking do WeWork instalado no número 495 da avenida Visconde de Pirajá, em Ipanema. Em operação, o local seguiu atraindo um grande fluxo de pessoas. Mas com a Covid-19, encerrou sua operação em maio deste ano.

Passados pouco mais de cinco meses, o prédio de dez andares no bairro nobre da zona sul carioca está prestes a reabrir as portas. Mas agora, com um novo inquilino. Ainda neste mês, o endereço passará a abrigar uma unidade da Spaces, uma das marcas de escritórios compartilhados do grupo britânico IWG.

Quinta unidade da Spaces no Brasil, a estrutura poderá atender cerca de 400 empresas e um fluxo diário de até mil pessoas. “É o melhor quarteirão de negócios do Rio de Janeiro”, diz Tiago Alves, CEO da IWG no Brasil, ao NeoFeed. “Estamos expandindo, mesmo com a pandemia e todas as adversidades.”

Um detalhe torna o projeto simbólico. Com o contrato assinado na sexta-feira, 6 de novembro, a IWG assume os 3,5 mil metros quadrados ocupados anteriormente pelo WeWork. E mostra que está cada vez mais disposta a conquistar, literalmente, o espaço da rival americana.

Fundada em 1989 e pioneira no setor, a IWG tem uma rede de 3.359 unidades, em mais de 110 países. No Brasil, são 69 coworkings, das marcas Regus, Spaces e HQ. Mas, em linha com a discrição de seus escritórios, muitas vezes classificados como formais e caretas, o grupo nunca foi badalado como o rival.

Já o WeWork, criada em 2010, atraiu clientes, mídia e fundos como o Softbank ao apostar em ambientes com uma aura cool e descolada. Um IPO frustrado no segundo semestre de 2019 expôs, porém, uma série de problemas da startup, desencadeando uma crise que foi agravada com a chegada da pandemia.

Com um valor de US$ 47 bilhões antes da malsucedida abertura de capital, e hoje avaliada em US$ 2,9 bilhões, o WeWork vem revisando seu portfólio de cerca de 800 unidades. No País, onde tem 28 coworkings, a empresa fechou outra estrutura no Rio, além de cancelar uma abertura em Barueri (SP).

Nas Américas, o imóvel de Ipanema foi o primeiro avanço da IWG sobre o terreno do WeWork. Em junho, a empresa já tinha assumido um prédio desocupado pela startup na região metropolitana de Hong Kong.

“Não acho que a WeWork seja um mau competidor ou que vá quebrar”, diz Alves. “Mas todo esse contexto desmistificou o discurso da startup que ia revolucionar o mercado. Hoje, eles são mais um player do setor.”

Carcaças de coworking

Apesar do seu apetite, a IWG não está imune aos efeitos do coronavírus. No ano, as ações da companhia, avaliada em £ 2,58 bilhões, acumulam uma queda de cerca de 40%.

Em 3 novembro, ao divulgar seu balanço do terceiro trimestre, o grupo reportou uma receita de £ 583,3 milhões, queda de 14,3% sobre igual período, um ano antes. Seus papéis encerraram o pregão do dia na Bolsa de Londres, no entanto, com alta de 8,7%.

No terceiro trimestre, a IWG reportou uma receita de £ 583,3 milhões, queda de 14,3% sobre igual período, um ano antes

Além da geração de caixa de £ 26,8 milhões no período, um fator ajuda a explicar a reação positiva do mercado. Depois de captar £ 320 milhões em um follow on, em maio, para comprar rivais em dificuldade e ativos, a empresa informou que já tem diversos negócios em fase final de due diligence.

“Mesmo sangrando, atravessamos os piores meses ainda gerando caixa”, diz Alves, ressaltando que essa não foi a realidade de uma parcela do setor, que ficou pelo caminho. “Isso abre uma oportunidade única, pois há muitos imóveis com carcaças de coworking que podemos assumir com custo quase zero.”

A alta no número de imóveis vagos é outro fator que pode favorecer essa expansão. No estado de São Paulo, por exemplo, a vacância de imóveis comerciais já é de 30%, segundo a Associação das Administradoras de Bens Imóveis e Condomínios (AABIC).

“Os proprietários passaram a enxergar os coworkings como uma opção para manterem seus imóveis ocupados”, diz Douglas Andrade, presidente da Associação Nacional de Coworkings e Escritórios Virtuais (Ancev). “Eles entendem que esse modelo reduz o risco de inadimplência ou de uma eventual saída.”

Nesse cenário, a IWG enxerga espaço para crescer seu portfólio com dois modelos em particular. O primeiro são as franquias, que demandam, em média, um aporte entre US$ 50 mil e US$ 100 mil do dono do imóvel. A única diferença do segundo formato, os contratos de gestão, é o fato de que os coworkings são operados por equipes do próprio grupo.

Em 2021, a IWG planeja chegar a 100 unidades, em 20 cidades do País

“Nossa projeção é fechar 2021 com 100 unidades, sendo pelo menos 30% delas franquias”, diz Alves. Para o início de 2021, o grupo já tem programada a abertura de mais um coworking da Spaces na região da avenida Paulista, em São Paulo. “No ano, o plano é sair de 14 para 20 cidades.”

Os perfis dos imóveis encontrados irão definir a marca a ser usada pela empresa. Enquanto a Regus tem foco mais corporativo, os ambientes da Spaces são mais despojados. Já a HQ, que hoje conta com unidades em São Paulo, Rio e Brasília, é voltada a projetos de menor custo.

A expansão terá como foco a entrada em capitais como Goiânia (GO), Belém (PA) e Florianópolis (SC). Além de municípios no interior, como Ribeirão Preto (SP), e cidades na região metropolitana de grandes centros, como Guarulhos (SP) e Osasco (SP).

Demanda corporativa

Esses planos têm como pano de fundo a retomada da operação. Sob o impulso do segmento corporativo, a demanda já é 30% maior do que o volume pré-pandemia. Entre as empresas que assinaram contratos no período figuram nomes como Amazon e Creditas.

“Muitas companhias que antes namoravam o coworking passaram a migrar para esse modelo pela necessidade de reduzir custos”, diz Alves. Nesse contexto, ele destaca a pressão exercida pelos reajustes dos aluguéis baseados no IGP-M, que acumula uma alta de 18,10%, em 2020.

Amazon e Creditas são algumas das empresas que assinaram contrato com a IWG nos últimos meses

Andrade, da Ancev, aponta outra tendência gerada na pandemia. “As empresas perceberam que é mais produtivo reduzir o tempo de deslocamento dos seus times”, afirma. “E estão buscando a alternativa de coworkings mais próximos das casas dos funcionários.”

Segundo Alves, essa questão explica a revisão do portfólio feita pela IWG durante a pandemia. O grupo fechou quatro unidades nos bairros do Itaim e da Cidade Jardim, em São Paulo. E inaugurou outras duas na capital paulista, em Santo Amaro e na Lapa.

“Nós já tínhamos muita concentração de unidades nesses locais”, explica o executivo. “Os contratos estavam vencendo e optamos por migrar para projetos fora desse eixo, em linha com essa tendência de as empresas buscarem escritórios mais distantes das regiões centrais.”

Nesse intervalo, a IWG também expandiu as estruturas que mantém em Salvador (BA), Fortaleza (CE) e Vitória (ES), além de lançar produtos. Uma das novidades são os estúdios que estão sendo montados em algumas unidades para que empresários e executivos possam fazer lives.

Outra opção recente no portfólio, batizada de Anywhere Office, são as diárias de escritório compradas pelas empresas e oferecidas aos seus funcionários, que podem reservar uma data para o uso do benefício em qualquer unidade da rede.

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