Mountain View (Califórnia) - Quando Eric Schmidt fala, todo mundo ouve. O silêncio no painel que concluía a Brazil at Silicon Valley, na terça-feira, 17 de maio, diz muito sobre o calibre do empresário que por 10 anos foi o nome forte do Google.

Ao lado dos fundadores da gigante de tecnologia, Sergey Brin e Larry Page, Schmidt ocupou o cargo de CEO e chairman do Google entre 2001 e 2011, conduzindo a transição da empresa de uma startup para se tornar o "transatlântico" que é hoje  - com tudo de bom e de ruim que isso envolve.

Na liderança de uma das maiores companhias do planeta, o americano de 67 anos tem uma visão privilegiada do mundo, tendo provado um pouco das dores e das delícias dos negócios em diferentes países. Para o seu paladar, o Brasil é um pouco agridoce.

"Acho que o Brasil tem tudo para dar certo, menos um governo estável", disse Schmidt no evento, em bate-papo com Shernaz Daver, CMO da Khosla Ventures. “É um país grande, com ótimas pessoas, uma única língua, mentes brilhantes. Mas precisa encontrar um jeito de ter presidentes profissionais, não esses que está tendo."

As críticas de Schmidt não pararam no Brasil. Ele também mirou a China e disse que o país de Xi Jinping não compartilha tecnologia e informações. "Precisamos ser agressivos e competitivos em relação à China", disse.

Ainda de olho nos asiáticos, Eric Schmidt também criticou a fuga das indústrias dos Estados Unidos e revelou que um homem está tentando solucionar esse "problema": Jeff Bezos.

"Ele (o fundador da Amazon) é o tipo de homem que precisamos agora, porque está focado em resolver duas grandes questões americanas: a terceirização da manufatura e a escalada no preço das moradias."

Outro bilionário que não escapou do afago de Schmidt foi Elon Musk, o polêmico bilionário, dono da Tesla, SpaceX e que pode comprar o Twitter. "Eu jamais apostaria contra o Elon, ele é muito inteligente, mas eu acho que o Twitter deveria adotar uma regra de liberdade de expressão para humanos, enquanto bloqueia os robôs – os bots".

A favor de que todo mundo tenha seu lugar de fala, de forma praticamente absoluta, Schmidt se colocou contrário aos algoritmos no contexto social. Para ele, feeds impulsionado pela máquina tendem a criar efeitos de tribo e argumentos irracionais.

"E acho que a inteligência artificial pode tornar tudo ainda pior, porque pode ser usada para filtrar certas coisas e impulsionar outras para fazer com que a empresa tenha maior rentabilidade, mesmo que quebre o planeta." E conclui: "Um CEO maligno pode fazer isso."

É justamente isso que leva o executivo a repetir que o algoritmo, no final das contas, é mais importante que os dados e que afinar essa equação é a grande barreira da tecnologia hoje.

Para cruzar essas novas fronteiras modernas, Schmidt enfatiza a importância da boa liderança e, invocando as suas memórias, trouxe para a conversa Bill Campbell, também conhecido como "o coach dos trilhões". Mentor dos gênios – e bilionários – do Vale do Silício, Campbell faleceu em 2016, mas deixou um legado importante de aprendizado.

Com o coah, Schmidt aprendeu, por exemplo, a importância de construir a confiança entre os seus pares. "Há as divas, que são aquelas pessoas muito inteligentes, mas difíceis de se trabalhar, como Steve Jobs, e há os ingênuos, que são mais fáceis de manipular. Mantenha as divas, demita os ingênuos".

Essa postura mais linha dura não é nenhuma novidade. Schmidt é radicalmente contra, por exemplo, o trabalho remoto e disse em diversas entrevistas que retomar as atividades presenciais é fundamental para o sucesso dos negócios.

Apesar dessa posição mais tradicional, ele não acha que a cultura "top down", com hierarquia "cima para baixo", seja a solução para os problemas. "Acho que é uma combinação, na verdade, de 'debaixo para cima', com 'de cima para baixo'.”

Ele destacou também a importância de empoderar a equipe. "Até porque, na minha opinião, as 10 primeiras pessoas com quem você trabalha vão determinar a cultura da empresa e o seu ritmo de crescimento."

Se dirigindo exclusivamente aos empreendedores brasileiros, o todo-poderoso do Vale do Silício insistiu mais uma vez nas oportunidades do Brasil e que é preciso aproveitá-las.

"Vocês podem desenvolver produtos que afetam uma população inteira. Estudam o que a China está fazendo e tentem replicar no Brasil, criando uma aliança com os Estados Unidos. Vocês têm condições de assumir essa posição e criar empresas que solucionem problemas importantes. Invistam em universidades de ponta e trabalhem ao lado das melhores universidades aqui dos Estados Unidos. Acesso e educação: é esse o caminho", conclui Schmidt.