O Citi passa pela sua maior reestruturação em décadas. O banco com US$ 746 bilhões sob gestão no wealth management global em 2022 (último dado disponível) vem destacando as regiões e áreas que considera prioritárias para o seu crescimento. E, nesse novo mapa, o Brasil é considerado chave pelo seu potencial, principalmente no offshore.

Presente em 95 países, sendo 20 na América Latina, o Citi não está disposto a perder essa oportunidade de mercado para os concorrentes locais. Para isso, a missão de expansão por aqui foi dada a Fernando Fleury, que assumiu no segundo semestre de 2023 a cadeira de head de private do Citi Brasil.

Brasileiro “cria da casa”, Fleury iniciou a sua carreira no banco em 2002 e se tornou um executivo de corporate banking do grupo, comandando a expansão dos negócios na África do Sul, na Rússia e nas Filipinas. Agora, de volta ao Brasil, ele tem o desafio de liderar um mercado já criado, em um país bastante relevante para o Citi.

“O private no Brasil está entre os top 10 do banco, mas com enorme potencial de ter muito mais relevância”, afirma Fleury ao NeoFeed, em sua primeira entrevista na nova posição.

A vertical de wealth management é um dos diferenciais globais do Citi, que tem relacionamento com 25% dos bilionários do mundo. Mas, nessa nova fase do banco, esse segmento está sendo “pressionado” a crescer. No ano passado, a receita de US$ 7 bilhões foi 5% menor do que no ano anterior.

Por conta disso, apesar das demissões que vem fazendo para enxugar a sua estrutura, o banco contratou no meio do ano passado Andy Sieg, do Merril Lynch, para ser o novo head global do wealth. E, na semana passada, trouxe do J.P. Morgan Antonio Gonzales como head da América Latina do Citi Private Bank, mostrando esforços para crescer nesse segmento.

“O banco está focado em crescer em wealth management, com os clientes certos, e gerar mais receitas. E fará investimentos para isso”, diz Fleury. “E o Brasil está entre as prioridades pelo que já temos aqui e pelo potencial de eventos de liquidez cada vez maior.”

Por trás desse foco na América Latina e no Brasil está a visão de que a geração de riqueza dos próximos anos será diferente da do passado, e tende a vir cada vez mais de países emergentes. O que torna a região chave para o banco ser um dos principais players globais em gestão de riqueza.

Caça às grandes fortunas

A forte presença no investment banking no Brasil coloca o Citi em boa posição para capturar as novas fortunas. O foco são clientes ultra high (R$ 50 milhões) sofisticados, que veem valor na diversificação global de ativos - o diferencial da operação do Citi.

Dentre as instituições financeiras estrangeiras, pode-se dizer que o Citi foi um dos bancos que mais se posicionou em private banking no Brasil, mantendo uma operação completa onshore e offshore. Outros, como J.P. Morgan, Morgan Stanley e BNP Paribas, optaram por ficar apenas no offshore.

A perspectiva do Citi é que, sem uma presença local, é difícil conseguir uma boa penetração no mercado, que possui um grande viés local (home bias).

O Citi, porém, está repensando seus planos desde que a sua parceira, a Guide Investimentos, foi adquirida pelo banco Safra. Desde 2017, quando o banco americano vendeu a sua operação de varejo para o Itaú Unibanco e ficou sem uma plataforma local, o private atuava em parceria no mercado local.

“Isso nos pegou de surpresa e estamos ainda avaliando qual será a nossa estratégia no local, que acreditamos que é importante”, diz o head de private do Citi Brasil.

Ele acrescenta que o banco não tem a pretensão de concorrer com os grandes bancos locais com uma plataforma “super completa”. “Entendemos que o nosso diferencial está no internacional e que, agora, o Brasil está despertando para ele.”

O brasileiro busca o offshore

Se, por um lado, o home bias é o problema dos gringos no Brasil, dificultando escalar o business para competir com os grandes players private locais, como Itaú, Bradesco, Santander, BTG Pactual e Banco do Brasil; por outro, é uma oportunidade a partir da reeducação sobre a diversificação de alocação de regiões na carteira dos investidores brasileiros.

Soma-se a isso as recentes mudanças tributárias no Brasil, que eliminou algumas jabuticabas, e a perspectiva de queda da taxa de juros para a casa de um dígito. Esses dois pontos criam um ecossistema perfeito para o crescimento de um banco global.

“Havia muitos benefícios tributários no mercado onshore, com diferimento fiscal e excesso de títulos isentos. Mas estamos vendo isso secar, o que incentiva mais a alocação offshore. Para nós, esse crescimento para o internacional está dado”, afirma Fleury.

A grande aposta do banco é que, ao aumentar e sofisticar a sua alocação internacional, o investidor ultra high entenda que precisa de um player global, o que casa com a pretensão do Citi de ser o maior private banking global atuando no País.

“Estamos em mais de 90 países com uma plataforma global robusta. Não acho simples um player local replicar isso, e somos um dos principais players globais aqui para aproveitar esse movimento”, diz o executivo.

O Citi acredita que pode também ser líder de mercado nesse nicho do wealth, assim como é em câmbio e custódia no país para estrangeiros. Para o banco, o Brasil tem se mostrado ser um lugar rentável para investir. Em 2023, o Citi Brasil era a quinta maior franquia do Citi globalmente, subindo duas posições em relação ao ano anterior.

Mas o apetite de crescimento do Citi nessa área enfrentará concorrência (e que por enquanto estão na frente do banco americano). Entre os estrangeiros, o UBS ganhou força e musculatura após a aquisição do Credit Suisse - o mercado calcula que, juntos, possuem cerca de R$ 200 bilhões sob gestão no Brasil.

Outro forte competidor é o Santander, que se tornou o terceiro maior private do País, com R$ 300 bilhões sob gestão, ao se posicionar como o único banco de escala global no País, o que tem feito o seu private avançar fortemente no exterior.

Entre os players locais, os gigantes Itaú, Bradesco e BTG Pactual (que somam juntos mais de R$ 1,5 trilhão sob gestão) têm investido fortemente em suas operações offshore e acreditam que o cliente vê o benefício de ter uma conta mais consolidada, entregando o offshore ao mesmo banco.

Fato é que o Brasil, que vai deixando de ser uma jabuticaba, fica cada vez mais relevante no mercado global de wealth management, principalmente no offshore, atraindo mais players e aumentando a concorrência.