Depois de mais de dois anos de seca, o mercado de IPOs no País começa a dar sinais de retomada ainda neste primeiro semestre. E o Santander Brasil quer mostrar que está preparado para disputar os principais mandatos com as outras instituições.
Para isso, o banco vem fortalecendo seu braço de investment banking desde meados do ano passado. Sob a batuta de Renato Ejnisman, que assumiu a divisão de Corporate e Investment Banking (SCIB) no começo de 2023, o Santander foi ao mercado em busca de profissionais para acelerar a parte de mercado de capitais e M&A.
A principal contratação foi Leonardo Cabral, ex-diretor de privatizações do BNDES, e que até sua chegada ao Santander era head de capital markets do Credit Suisse. Desde julho, ele e sua equipe, que ganhou reforços vindos do banco suíço após sua venda ao UBS, estão se preparando para a tão esperada reabertura do mercado.
“Estamos reforçando a plataforma desde meados do ano passado e estamos prontos para competir de igual para igual tanto com os bancos globais, quanto os locais”, diz Leonardo Cabral, head do investment banking do Santander Brasil, ao NeoFeed.
Com a equipe reforçada, e aproveitando que o mercado ainda não apresentava condições favoráveis, Cabral conta que o Santander montou um pipeline de operação, contando com “mais de uma dezena de casos de potenciais IPOs para este ano”.
O primeiro deles veio a público na quarta-feira, 17 de janeiro, quando a Oceânica Engenharia, empresa que presta serviços submarinos para o setor de óleo e gás, informou que está trabalhando para realizar um IPO. O anúncio surpreendeu o mercado, que esperava que o pontapé inicial fosse dado por uma empresa de maior porte.
Para Cabral, a tese das grandes empresas vindo primeiro ao mercado permanece, pelo fato de atraírem mais o interesse dos investidores estrangeiros, é vista como fundamental para a retomada dos IPOs.
Isso não significa, porém, que teses como a da Oceânica não possam vir, considerando sua exposição a um segmento que apresenta boas perspectivas. “Ela é uma prestadora de serviço para um setor que está quase que dobrando de tamanho nos próximos anos”, diz Cabral.
Assim como seus concorrentes, Cabral espera a retomada dos IPOs ainda no primeiro semestre, mais especificamente no segundo trimestre, quando as companhias devem ter em mãos os números fechados de 2023.
Ao mesmo tempo em que foi montando um pipeline de IPOs, o Santander também trabalhou para expandir a quantidade de M&As. Nesta frente, o banco conseguiu avançar mais.
Um exemplo é a assessoria prestada à Engie na compra de ativos de energia solar da Atlas, em outubro, uma transação de R$ 3,2 bilhões. O banco também atuou no financiamento da compra da Amil pelo empresário José Seripieri Filho, o Júnior, operação de R$ 11 bilhões.
A expectativa é de que a chegada de Cabral e outros reforços façam o Santander ganhar posições na disputa entre os bancos de investimento.
Considerando as receitas oriundas de IPOs, follow ons, M&As e emissão de dívida, o banco ficou em quinto lugar no ranking elaborado pela consultoria Dealogic, com uma receita de US$ 48 milhões. Em primeiro lugar ficou o Itaú BBA, com US$ 94 milhões, seguido pelo Bank of America (BofA), com US$ 70 milhões.
Dos 22 follow ons que ocorreram no País em 2023, o Santander esteve em 14 deles. O Itaú BBA, por sua vez, esteve na coordenação de 19 das operações.
Acompanhe os principais trechos da entrevista ao NeoFeed:
A sua chegada ao Santander foi feita dm um momento bem negativo para IPOs e follow ons, com os juros bastante elevados, aqui e nos Estados Unidos. Como foi trabalhar neste cenário?
Usamos este momento para que as pessoas chegassem e começassem a se ambientar. E aproveitamos o momento para construir um pipeline de transações, tanto de M&A quanto para mercado de capitais. Precisávamos mostrar aos clientes essa nova plataforma, e isso gera novos mandatos. Quando você pega o mercado fechado, como foi no fim do ano passado, para nós foi positivo, porque pegamos esse período para criar esse pipeline de transações, para quando o mercado voltar estarmos preparados.
Como você avalia 2023 em termos de quantidade de IPO e follow on? Ficou dentro do esperado, considerando as circunstâncias?
Tivemos praticamente dois anos em um em 2023. No primeiro semestre, ninguém esperava que o mercado de IPOs voltasse, considerando os juros altos. Isso foi mudando ao longo do ano. Para follow ons, aí sim, houve uma retomada, considerando as diferentes necessidades. Empresas que precisam desalavancar, fundos que chegaram no limite do período de investimento. No segundo semestre, os bancos em geral ficaram mais otimistas, acreditando que talvez tivessem IPOs no fim do ano passado.
"Temos mais de uma dezena de casos de potenciais IPOs para este ano"
Mas não saíram operações neste período. Por quê?
Porque a queda de juros lá fora demorou. Foi até o contrário, com a perspectiva de mais aumento de juros. E aí o mercado para IPOs aqui no Brasil secou. São mais de dois anos sem IPOs aqui no Brasil, mas existe a perspectiva de voltar a ter IPOs neste primeiro semestre. Uma que é pública, mas que não podemos comentar, porque estamos participando, é a da Oceânica, que anunciou a intenção de abrir o capital. Aqui no Santander temos mais de uma dezena de casos de potenciais IPOs para este ano. Todos vão sair? Não, mas alguns vão sair.
Aproveitando o caso da Oceânica, o que se ouve é que o mercado de IPOs seria aberto pelas grandes empresas, as conhecidas do mercado, as geradoras de caixa. E o primeiro anúncio de intenção foi de uma empresa menor. Não seriam as grandes empresas que abrirão o mercado?
Não posso comentar o caso específico da Oceânica, mas sobre grandes empresas, os bancos têm comentado sobre isso. Você tem o investidor internacional aumentando muito a alocação no Brasil e ele precisa de uma oferta maior para entrar. Se faço uma oferta maior, consigo atrair o interesse internacional e tenho mais sucesso. Isso significa que será um problema para a Oceânica? Não. Mas a tese das grandes ofertas continua, porque elas têm mais chances de serem lançadas, coisas entre R$ 1,5 bilhão e R$ 2 bilhões.
Outra coisa é que os IPOs estarão concentrados em empresas que atuam em áreas mais consagradas no País, como infraestrutura. No caso da Oceânica, ela não parece se encaixar nesse grupo…
Não sei se é o caso de dizer que ela não se encaixa, porque ela é uma prestadora de serviço para um setor que está quase que dobrando de tamanho nos próximos anos, que é o setor de petróleo. Isso move o setor como um todo. Todo prestador de serviços acaba se beneficiando também desse aumento de produção e vão precisar de capital para financiar o crescimento.
Mas você entende que será o setor de infraestrutura que abrirá o mercado de IPOs em 2024?
Sim. Devemos ver uma maior quantidade de transações neste setor. Também estamos trabalhando com o setor de consumo. Teremos ofertas de outros setores, mas onde tem maior demanda por investimentos, por consequência maior quantidade de follow ons e IPOs, é no setor de infraestrutura, em óleo e gás, energia, rodovias. Isso em quantidade e volume de transações.
O Santander tem projeções de quantos IPOs e follow on poderemos ver em 2024?
Não temos projeções, porque o mercado é super volátil. Se você perguntar hoje, é um número, e aí amanhã muda. Por isso, a gente decidiu não fazer projeções.
Como você vê o pipeline de operações em 2024? Um primeiro semestre morno, para depois esquentar no segundo semestre?
Talvez seja mais em termos de trimestre, e não semestre. Estávamos mais otimistas com ofertas neste primeiro trimestre no ano passado, com as empresas utilizando os números do terceiro trimestre. O que a gente está vendo é que talvez tenha uma maior quantidade de operações com os números fechados do ano. Então, a gente vê um segundo trimestre, após resultados fechados do ano, mais forte que o primeiro trimestre.
Você acredita que veremos uma normalização do mercado de IPOs no Brasil?
É difícil afirmar isso, porque tem questões externas que podem impactar bastante o cenário, como questões geopolíticas. Com os juros no patamar em que estão e se o Brasil tiver uma tendência de melhores condições fiscais, sim, a gente espera que seja um mercado mais normalizado daqui para frente. Tudo isso impacta o mercado de capitais, como vimos em 2021 e 2022.
"Se o Brasil tiver uma tendência de melhores condições fiscais, a gente espera que seja um mercado (de IPOs) mais normalizado daqui para frente"
Sobre os estrangeiros, como você tem sentido o interesse deles em relação ao Brasil e às possibilidades de IPOs e follow ons?
Durante um momento do ano passado, começamos a ver um maior interesse dos investidores estrangeiros em relação ao Brasil. Uma série de grandes investidores globais, que passaram um bom tempo sem fazer reuniões aqui no Brasil, começaram a fazer esse processo. Nesse último semestre, o Santander realizou uma série de viagens com investidores globais para virem ao Brasil e falar tanto com empresas de capital aberto, para fazer aumento de capital, mas também com empresas fechadas, que pretendem lançar IPOs no próximo um ano e meio. Vemos um aumento do interesse dos estrangeiros.
No caso de M&A, vimos uma série de operações no ano passado. O momento é positivo? O que esperar para 2024?
Ano passado, assim como ocorreu no mercado de capitais, as coisas começaram a esquentar no segundo semestre. O volume de transações que vimos no período foi praticamente o dobro, quando comparado com o primeiro semestre. Estamos vendo muitas transações cross border, com empresas estrangeiras envolvidas, e estamos vendo essa tendência continuar neste ano. Aqui no Santander, estamos com boas transações de M&A, boa parte delas cross border. Das dez principais transações em execução aqui no banco, oito tem uma ponta internacional participando, seja na compra ou na venda. É muita coisa. E algo que vimos menos no ano passado foi participação de financial sponsors (private equity) em aquisições.
Como assim?
Alguns deles buscaram fazer venda de ativos, até fusões, mas não vimos um número alto de grandes compras. Essa é uma tendência que talvez mude neste ano. Geralmente, fundos de private equity são muito afetados por curva de juros, porque a tendência é fazer transações mais alavancadas. Então, juros mais altos dificultam transações. Com os juros mais normalizados, se aproximando de um dígito aqui no Brasil, a tendência é ter mais participação de fundos de private equity.