A disputa entre montadoras chinesas para saber quem oferece mais desconto no acirradíssimo mercado automobilístico do país - o maior do mundo - causou na segunda-feira, 26 de maio, uma espécie de “efeito bumerangue”, com as ações das principais montadoras chinesas despencado na Bolsa de Hong Kong.

As ações da BYD – a campeã de vendas de veículos elétricos (VEs) dentro e fora do país – caíram quase 9%, enquanto suas rivais Geely, Li Auto e Xpeng perderam 7%, 5% e 4%, respectivamente.

Apesar de as seguidas promoções representarem, em tese, mais vendas para as montadoras, os investidores estão enxergando na estratégia um risco elevado de os descontos por unidade vendida avançarem sobre a margem de lucro das montadoras.

A BYD não liderou à toa a maior queda no valor das ações em Hong Kong. No fim de semana, a montadora com sede em Shenzhen anunciou uma nova rodada de cortes de preços para mais de 20 modelos.

A campanha de "preço fixo", com cortes em vigor até o fim de junho, deverá ajudar as remessas da BYD no segundo trimestre a crescerem de 20% a 30% em relação ao trimestre anterior, disseram analistas do Citi.

"A BYD consegue registrar um lucro líquido de 9 mil yuans [cerca de R$ 7,1 mil] por veículo no segundo trimestre", afirmaram os analistas do banco, em nota de pesquisa. A estimativa está abaixo da projeção de lucro líquido anual por unidade de 10 mil yuans [aproximadamente R$ 7,9 mil], fornecida pela administração da BYD aos analistas no mês passado.

Promoções anteriores da BYD já haviam levado concorrentes a reagir, oferecendo descontos, mas a nova lista da líder de mercado parece ter atingido um nível que justifica o efeito bumerangue.

A BYD reservou ao sedã híbrido plug-in Seal 07 o maior desconto, de 34%, em relação ao seu preço original.

Já o preço do seu modelo mais barato — o Seagull hatchback, movido a bateria pura — foi reduzido para o equivalente a US$ 7.770 (R$ 44 mil), de acordo com as postagens promocionais da empresa. Para se ter uma ideia, o carro zero mais barato à venda no Brasil - o Renault Kwid 1.0, com motor 1.0 flex e câmbio manual - custa R$ 74.590.

“A BYD detém um poder de precificação significativo no mercado, então cada rodada de cortes de preços deve levar outras marcas de automóveis a seguirem o exemplo, o que intensificará ainda mais a competição no mercado”, disse Li Yanwei, membro da Associação de Concessionárias de Automóveis da China.

Após a decisão da BYD, a estatal Changan ofereceu um desconto à vista de cerca de 15% em seu utilitário esportivo S07, sob sua submarca Deepal. A Leapmotor, apoiada pela Stellantis, revelou "preços fixos" semelhantes para seus carros C16 e C11 no fim de semana, totalizando cortes de 28% e 30%, respectivamente.

Alerta

A guerra de preços começa a preocupar as autoridades chinesas. A Comissão de Desenvolvimento da China, a principal agência nacional de planejamento econômico, alertou na semana passada contra uma "corrida desenfreada" de preços no mercado automobilístico do país.

“Algumas empresas adotaram uma estratégia de preços ultrabaixos, chegando a vender abaixo do custo”, disse Li Chao, porta-voz da agência, em uma coletiva de imprensa. “Essas práticas ultrapassam os limites da concorrência de mercado, distorcem os mecanismos de mercado e interrompem a concorrência leal, o que exige medidas corretivas.”

Analistas veem a acirrada guerra de preços no maior mercado automobilístico do mundo como uma forma de consolidação do setor. Nos últimos dois anos, os descontos pesaram sobre os resultados de montadoras menores, que perderam lucros e fatia de mercado.

As grandes, como a BYD, têm mais fôlego para bancar as promoções. A queda de 9% no preço de suas ações na Bolsa de Hong Kong causou um prejuízo marginal à BYD, cujas ações atingiram um recorde na semana passada com a notícia de que a empresa havia superado as vendas da Tesla na Europa pela primeira vez.