A atual geração de adolescentes, que já nasceu em um mundo conectado pela internet e habituada às redes sociais, ainda está presa aos velhos tempos quando o assunto é dinheiro. Como é preciso ter pelo menos 18 anos, no Brasil, para abrir uma conta corrente em nome próprio, muitos ainda estão restritos ao dinheiro em espécie ou precisam recorrer aos pais para efetuar transações eletrônicas - seja um jovem que já trabalha e ajuda nas contas de casa ou o que recebe mesada da família.

Desde 2019, a fintech Z1 tem trabalhado para derrubar esse muro, com uma conta digital para adolescentes que precisa da autorização dos pais para ser aberta. Por enquanto, o serviço é simples e conta apenas com um saldo e um cartão pré-pago internacional, na bandeira Mastercard, que pode também ser um cartão virtual, para compras pela internet.

A ideia, agora, é ganhar maturidade. Para sair da “puberdade”, a Z1 acaba de receber um aporte de R$ 55 milhões, liderado pela Kaszek, de dois dos fundadores do Mercado Livre, Nicolas Szekasy e Hernan Kazah, em uma rodada série A que também contou com a participação dos fundos MAYA Capital, Homebrew, Clocktower e Mantis.

"Os adolescentes fazem parte da geração mais digitalizada de todas, mas estão excluídos da economia digital", afirma, ao NeoFeed, Sophie Secaf, que faz parte do time de fundadores da startup, ao lado de João Pedro Thompson, Thiago Achatz e Mateus Craveiro. "Independente de classe social, há os que já trabalham, os que querem vender na internet, por exemplo, mas têm problemas de acesso ao sistema financeiro".

O aporte ocorre seis meses depois de a Z1 ter recebido a sua rodada seed, de R$ 14 milhões, liderada pelo fundo Homebrew. Dessa vez, diz Secaf, foi a Kaszek quem os procurou. “Não estávamos levantando dinheiro”, afirma a empreendedora.

"A geração Z (daí o nome da Z1) já é a maior geração do mundo hoje, representando cerca de 30% da população brasileira e mundial. Quem conseguir entender e conquistar essa geração colherá os frutos nos próximos anos", diz Nico Berman, sócio da Kaszek, que já investiu em unicórnios como Nubank, Creditas e QuintoAndar.

No Brasil, a Z1 está mirando um mercado de cerca de 60 milhões de adolescentes. A startup não revela quantos usuários já tem, mas diz que a sua base tem crescido a um ritmo de 30% ao mês em 2021. Para o ano que vem, a ideia é multiplicá-la por dez.

Os fundadores da Z1, da esquerda para direita: Thiago Achatz, Mateus Craveiro, Sophie Secaf e João Pedro Thompson

Para isso, pretende usar o dinheiro levantado para investir no desenvolvimento de novos produtos e funcionalidades para o aplicativo. A startup prefere não antecipar os serviços que estão nos planos, mas há a indicação que a educação financeira será um dos pilares da companhia.

Thompson, um dos fundadores e CEO da startup, teve a ideia de criar a Z1 porque percebeu, quando era dono de uma rede de ensino básico de baixo custo, a Vereda Educação, que o alto índice de inadimplência entre os pais dos alunos estava relacionado a uma baixa consciência financeira. Ele viu, portanto, que era preciso cortar o mal pela raiz e começar a trabalhar a educação financeira das pessoas antes que elas cheguem à fase adulta.

Com o aporte, o time da Z1 deve crescer. Hoje, são 70 pessoas, dos quais 30 da área de suporte, dedicada a dar um atendimento aos usuários. Mais: de todos os seus funcionários, 20 são pessoas trans e 60% são pessoas negras e pardas. Até 2022, a equipe deverá ser multiplicada por quatro. “Estamos implementando a diversidade desde o primeiro dia”, diz Secaf.

Segundo a empreendedora, os usuários da Z1, espalhados por todo o Brasil, são compostos, em sua maioria, por jovens de 14 a 17 anos, e de todas as classes sociais, desde um adolescente que trabalha como frentista em um posto de gasolina no interior do Piauí até aquele que atua na empresa do pai.

Até a semana passada, o aplicativo exigia uma assinatura de R$ 10 por mês para que os jovens usassem a conta. O valor só era cobrado se alguma movimentação fosse feita no saldo. A partir desta semana, porém, todos os serviços são gratuitos, o que deve ampliar o acesso à Z1. “Era uma demanda muito grande dos usuários”, diz a fundadora.

Na avaliação dela, a conta digital da Z1 deverá ser mais útil para os jovens das classes B para baixo. “Quem é da classe A vive numa bolha e muitas vezes já tem um cartão de dependente do pai”, afirma Secaf.

A fundadora explica que toda a comunicação de marketing da Z1 é voltada para os jovens e não para os pais. A ideia é que eles se convençam da necessidade de ter uma conta digital e procurem os pais para pedir a autorização.

A startup não divulga qual tem sido o volume transacionado pelos adolescentes no aplicativo, mas afirma que a maior parte deles gasta o dinheiro com games. O jogo eletrônico Free Fire é o que o lidera a lista de consumo.

De acordo com a empreendedora, à medida que a startup expande a base de usuários e passa a ter produtos que geram receita para o aplicativo, a Z1 quer continuar sendo o aplicativo desses jovens mesmo quando eles virarem adultos. “Queremos evoluir junto com eles”, afirma.

Uma conta destinada aos mais jovens, porém, não é uma novidade no mercado. O PicPay, por exemplo, permite que adolescentes com pelo menos 16 anos tenham uma conta no aplicativo e façam movimentações financeiras.

O Next, banco digital do Bradesco, tem o NextJoy, conta digital para crianças e adolescentes, de até 17 anos. A ferramenta é focada em educação financeira e recorre a personagens da Disney para tornar a experiência mais amigável. O próprio Bradesco tem a Click Conta, também para quem tem até 17 anos.

O Santander e o Itaú Unibanco também têm contas para menores de idade. Este último, inclusive, lançou no ano passado um cartão de crédito para adolescentes com mais de 12 anos, que pode ser solicitado pelos pais.

Outro banco grande, o Banco do Brasil, tem a BB Conta Jovem, para aqueles de 12 a 21 anos. E o Inter oferece a Inter Kids, que também permite que os pais façam investimentos de longo prazo para os filhos.