Quando a Americanas revelou, em janeiro, a descoberta de “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões, um dos segmentos que mais sofreu foi o mercado de renda fixa, com muitos gestores sofrendo com uma onda de resgates dos cotistas.

Ainda que outras empresas também tenham apresentado questões financeiras nas semanas seguintes, gestores de crédito privado que participaram de painel do CEO Conference 2023, promovido pelo BTG Pactual nesta quarta-feira, dia 15 de fevereiro, estão menos temerosos.

Para eles, o mercado brasileiro está muito mais maduro para lidar com situações como essa. E o cenário atual tem trazido oportunidades para quem está disposto a investir.

“Vejo o mercado hoje com abertura dos spreads dada a necessidade de liquidez dos fundos, não por piora de risco de crédito da maioria das empresas”, disse Ana Luísa Rodela, head de crédito da Bradesco Asset, que está com R$ 569,2 bilhões em ativos sob gestão.

“Vemos empresas de setores resilientes, como saneamento, com oportunidades, apresentando bons índices de rentabilidade”, completou.

Segundo ela, mesmo com os efeitos negativos do caso Americanas, o mercado de renda fixa está conseguindo contornar a situação, considerando a evolução pela qual  o segmento passou nos últimos anos.

“Eu tenho 15 anos de atuação na parte de crédito em assets e é a primeira vez que vejo que tem comprador de ativo estressado", afirmou Rodela. "Antes, para achar um comprador, tinha que bater em casa especializada e ver se estava disposto a comprar uma pequena parcela. Agora, temos players com visões diferentes, o que permite sair de um erro rapidamente.”

CEO Conference 2023 - crédito privado
Da esq. para direita: Jean Pierre Gil, da Vinland Capital, Eduardo Arraes, da BTG Pactual Asset Management, Ana Luísa Rodela, da Bradesco Asset, e Cristiano Cury, do BTG Pactual

Para Eduardo Arraes, sócio da BTG Pactual Asset Management, que tem R$ 281,9 bilhões em ativos sob gestão, o mercado reagiu rapidamente ao episódio Americanas. Destacando os efeitos negativos sobre alguns fundos, ele afirmou que o nível de resgate representou de 4% a 5% dos recursos no mercado, bem abaixo dos 20% registrados em 2020, durante a pandemia.

“Em Americanas, foi uma fraude, não uma questão de crédito. Não estamos vendo defaults no mercado e estamos aproveitando para fazer algumas alocações, ainda que com um pouco mais de cuidado”, disse.

O ponto de atenção dos gestores para 2023 está no âmbito macroeconômico, com a perspectiva de desaceleração da atividade e a alta dos juros afetando a linha financeira das companhias nesse ano.

Ainda assim, não é um ponto que possa provocar muito estresse, segundo Jean Pierre Cote Gil, sócio e gestor de crédito da Vinland Capital, que tem R$ 18,8 bilhões em ativos sob gestão, considerando a média das empresas no mercado.

“Diferente do restante do mundo, não tivemos um aumento da alavancagem nos últimos anos, porque o Brasil não viveu uma exuberância de crescimento”, afirmou. “Tem um lado ruim que é o cenário macro, e é preciso olhar as empresas caso a caso, mas a maioria das empresas fez a lição de casa para lidar com seus passivos.”