Na inédita cinebiografia sobre Eike Batista, uma fala do ex-bilionário tenta explicar o fascínio que a sua trajetória exerce no Brasil, sobretudo no mundo do empreendedorismo. “O meu negócio é fazer o que os outros têm medo de fazer”, diz o então magnata, em cena do filme “Eike – Tudo ou Nada”, como quem se orgulha dos riscos que correu.

O fato de o empresário ter perdido a maior parte de seu patrimônio e somar penas que chegam a 58 anos de prisão, por crimes contra o mercado financeiro, de corrupção e de lavagem de dinheiro, talvez até o ajude a despertar ainda mais interesse. Nem que seja para ensinar o que um empreendedor não deve fazer. Sua conta no Twitter soma quase 1,2 milhão de seguidores, ainda que Batista não esteja ativo nos últimos tempos.

Atualmente em pós-produção e com lançamento agendado para 22 de setembro nas telas brasileiras, a cinebiografia é baseada no livro da jornalista Malu Gaspar. “Tudo ou Nada: Eike Batista e a Verdadeira História do Grupo X” foi lançado em 2014 e atualizado este ano, com nova edição pela Companhia das Letras.

“Eike é uma figura que personifica o Brasil, tanto em seu sucesso quanto em seus tropeços”, disse ao NeoFeed o cineasta Dida Andrade, que assina a obra em parceria com Andradina Azevedo. “Nenhum outro empresário foi tão popular quanto Eike, que aceitava aparecer em programas de TV e ainda assumia um papel de Mecenas”, completa Andrade, lembrando que o ex-magnata ainda foi casado com a modelo Luma de Oliveira (interpretada no filme por Carol Castro).

“Amado por uns, odiado por outros, Eike poderia ter sido um executivo em qualquer multinacional, mas preferiu se arriscar no garimpo, onde fez fortuna. E, ao se tornar bilionário, ele não pensou duas vezes ao colocar tudo em jogo para criar uma petroleira”, afirma Azevedo, que também acumula aqui a função de diretor de fotografia.

A dupla de cineastas, que também responde pelo roteiro, escolheu como recorte do filme o momento em que o empresário faz seu primeiro bilhão com a mineração e funda a OGX, em 2007. Foi essa companhia, de exploração e produção de petróleo e gás natural, que fez dele o sétimo homem mais rico do mundo, segundo a “Forbes”, em 2012, com um patrimônio estimado em R$ 30 bilhões.

Esta época é retratada no filme como uma espécie de delírio coletivo, quando muitos investidores, iludidos pelo suposto toque de Midas de Batista, embarcaram no seu sonho de transformar a OGX na maior petrolífera do Brasil. Em 2008, por conta de seu prestígio como empreendedor, sua empresa registrou a maior oferta pública inicial (IPO) de ações da Bolsa de Valores de São Paulo até então.

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Mas nada saiu como o esperado, à medida que o empresário se mostrou megalômano, colocava parte do dinheiro em outros projetos. E como a promessa do petróleo não se concretizou devido à baixa produtividade, a muitos problemas operacionais e a decisões e parcerias desastrosas, o resultado foi um calote aos credores, em 2013.

As ações da OGX entrando em colapso marcaram o início da derrocada de Batista, protagonizado no filme por Nelson Freitas. “Retratar a dinâmica do mercado financeiro no filme foi um desafio. Queremos que um economista fique atento para saber como a empresa cresceu tanto na Bolsa e depois caiu. E, ao mesmo tempo, esperamos que o filme sirva de aula para os leigos no assunto”, afirma Andrade.

Para ajudar nesse sentido, o longa-metragem conta com a participação do economista Pablo Spyer, conhecido como o criador do bordão “Vai, Tourinho”. Ele interpretará a si mesmo no filme, apresentando uma versão do seu programa na Jovem Pan News, “Minuto Touro de Ouro”. Como faz na vida real, Spyer será visto analisando os acontecimentos no mercado financeiro, fazendo boletins com as principais notícias da bolsa de valores ao longo da trama.

A trajetória da OGX de Batista é o que constrói na cinebiografia o arco de ascensão e queda do empresário, que hoje está solto, esperando que os termos do cumprimento de suas penas sejam definidos. Batista foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro em processo ligado à operação Lava Jato e também por uso indevido de informação privilegiada e manipulação de mercado envolvendo operações financeiras com a OGX.

Sua jornada ajuda a demolir a ideia falida de enriquecimento rápido com promessas que não se cumprem no final. “Esperamos que o filme sirva de exemplo para empresários não cometerem os mesmos erros. Certamente teremos novos unicórnios CEO de startups, o que é muito positivo para o enriquecimento do país. Mas, de preferência, que eles tenham um crescimento mais concreto e gradual do que Eike Batista”, diz Azevedo.

A dupla de diretores espera que a onda de produções americanas desse gênero, principalmente no serviço de streaming, ajude a aumentar o interesse pelo filme de Batista. Até porque as biografias de personalidades vinculadas ao mercado financeiro são raras no país. E cinebiografias mais ainda.

“A juventude tem um interesse enorme por grandes nomes do mercado e da bolsa de valores, por unicórnios do Vale do Silício e por startups. A pandemia ainda fez muitos brasileiros entrarem na bolsa ou se interessarem por ela pela primeira vez”, conta Andrade. “E este número só tende a aumentar. É um caminho sem volta”, aposta ele.