Poucos fundos de venture capital foram tão ativos em 2021 como o Tiger Global Management. A gestora americana participou de 194 rodadas de investimento no ano passado, o maior número do mundo, segundo dados do Crunchbase. É um ritmo impressionante, que representa uma média de um negócio a cada quase dois dias.

Este ano não começou diferente. Só no Brasil, a gestora fundada pelo bilionário Chase Coleman, com um portfólio de mais de US$ 36 bilhões de ativos sob gestão, já esteve envolvida em dois aportes. As contempladas com o dinheiro do Tiger Global foram os marketplaces Inventa e Oico.

Nada indica que o Tiger Global deva tirar o pé dos aportes em 2022. Mas há sinais de fumaça no horizonte de que o fundo está dando início a um processo de correção da avaliação das startups nas quais investe. E para baixo.

No fim do ano passado, a Tiger Global acertou os termos de um investimento de uma rodada série C para a startup de blockchain Blockdaemon. Mas, antes de transferir o dinheiro, pediu para renegociar o acordo, propondo uma queda de 20% na avaliação, segundo reportagem do site The Information.

A Blockdaemon concordou com os novos termos. Mesmo com a correção, a nova avaliação (pre-money) era de US$ 3 bilhões, o dobro do valor da última rodada da startup.

A Tiger Global tentou também reduzir a avaliação de uma rodada série C da Veriff, uma startup de verificação de identidade da Estônia. A gestora, que havia concordado em investir com uma avaliação de US$ 1,5 bilhão, queria reduzir o valuation para US$ 1,1 bilhão.

Nesse caso, a Veriff bateu o pé e buscou ofertas em outros investidores, o que fez o Tiger Global manter o aporte na avaliação inicial. Na quarta-feira, 26 de janeiro, o aporte de US$ 100 milhões foi anunciando em conjunto com a Alkeon e os atuais investidores, IVP e Accel.

A correção que o Tiger Global começa a tentar impor em suas rodadas acontece após um aumento acima da média do valor das startups em 2021, segundo um levantamento realizado pela Astella Investimentos com base em dados do Pitchbook.

Os valuations das startups (pre-money) cresceram de forma significativa desde as rodadas mais iniciais, como a seed, até as mais avançadas. No caso da série D, houve uma valorização de quase 500%.

A Astella usou para sua análise mais de 150 mil rodadas que aconteceram no mundo de 2006 a 2021. Com esses dados, a gestora fez a média dos valuations no período todo e a comparou com a média do ano passado. Segundo os cálculos, o valor das startups aumentou em todas as fases de captação.

Nas rodadas seed, por exemplo, o valor médio em que uma startup era avaliada, historicamente, ficava em torno de US$ 5 milhões. Em 2021, foi US$ 8 milhões. Na séria B, passou de US$ 37 milhões para US$ 115 milhões. E na D subiu de US$ 133,8 milhões para US$ 800 milhões.

Essa  correção proposta pelo Tiger vem na esteira da queda de valor de empresas de tecnologia que abriram o capital em 2021. Os papéis de Robinhood, Coinbase e DoorDash, três dos principais IPOs do ano passado, estão sendo negociados com desvalorização que chegam até a 65% do preço da abertura de capital. O Nubank, que abriu o capital em dezembro do ano passado, observa também seus papéis caírem quase 26% desde então.

As empresas de software na nuvem são as que mais têm sofrido esse ajuste no mercado público. Elas estavam sendo negociadas a 8,2 vezes a receita futura na quarta-feira, 26 de janeiro, uma queda em relação a uma avaliação de 15 vezes a receita futura em 1º de setembro do ano passado, de acordo com o Índice Nasdaq Emerging Cloud, da Bessemer Venture Partners.’

A movimentação do Tiger Global deve ter reflexo em todo o mercado. Inclusive no Brasil. “Se o Tiger trouxer mais racionalidade para o mercado pode ser bastante positivo”, diz um investidor com quem o NeoFeed conversou.

Outro investidor concorda. “O assédio de bons fundos às empresas está menor”, disse ao NeoFeed. “Eles tiram o pé um pouco e quem está fazendo rodada acaba não tendo aqueles parceiros dos sonhos. Aí, tem de entrar no dilema de aceitar alguém pelo dinheiro, ou baixar o valuation e até mesmo segurar o round.”

De qualquer forma, esse investidor acredita que as boas startups vão seguir valorizadas e recebendo muito capital dos fundos de venture capital. “Acredito que as ‘eleitas’ seguirão sendo especiais”, afirma essa fonte. “Mas algumas startups, que estão muito longe de serem consistentes, terão menos capital à disposição no curto e no médio prazo.”

O Tiger Global, ao que tudo indica, está dando um rugido bem alto para todo o mercado de venture capital. E esse som não parece trazer uma boa notícia às startups.