O pacote fiscal completou uma semana. O mercado segue ressabiado. As medidas avançam no Congresso, mas não de graça. O dólar escorrega abaixo de R$ 6,00 com ajuda externa, mas flerta com a marca. Na B3, juros superam 14% nos próximos quatro anos – taxa de 9% ou mais descontada a inflação.
O ruído diminuiu, mas o mau humor não cede. Apesar da possibilidade de o “pacote” entrar na pauta de votação da Câmara em breve, prevalece a ideia de que as medidas fiscais são insuficientes para sustentar a âncora fiscal e estabilizar a dívida pública.
Nesse clima de pouco amigos, o Copom realiza a última reunião do ano na terça e quarta-feira, 10 e 11 dezembro. E no embalo da aposta majoritária de economistas de aumento na Selic de 0,75 ponto, para 12%. Na curva de juros, porém, alta de 1 ponto está na conta.
Câmbio e juro na lua justificam previsões de inflação ascendente e atividade em queda nos próximos meses desafiadores para o Banco Central que já pode agregar ao comando três indicados pelo presidente Lula – Nilton David para Política Monetária; Gilneu Vivan, Regulação; Izabella Correa, Relacionamento.
O trio entrará na ativa em 1º de janeiro se receber o aval do Senado. As sabatinas na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) deverão ocorrer na terça, 10. A aprovação é certa e tende a ser chancelada pelo Plenário no mesmo dia. Assim, o Copom do “novo” BC, sob a presidência de Gabriel Galípolo, contará com 7 de seus 9 membros escolhidos por Lula.
É um equívoco, porém, supor que novos aumentos da Selic serão contidos em função desse placar. Galípolo não dá margem à dúvida e reitera, o tempo todo, o compromisso da instituição com a meta de inflação.
A reunião do Copom é o ápice da agenda local da semana que, na terça 10, inclui o IPCA de novembro. O índice atingiu 4,76% em 12 meses até outubro e deverá subir mais. A MacroSector prevê 4,90%. Na sexta, 13, o BC publicará o Índice de Atividade Econômica (IBC-Br) de outubro que deve ceder.
Na agenda internacional, ponto forte é o anúncio, na quarta 11, da inflação ao consumidor nos EUA – indicador a ser avaliado pelo Federal Reserve (Fed) na reunião de política monetária no dia 17. Na quinta 12, o Banco Central Europeu (BCE) definirá sua próxima taxa de juro possivelmente em queda.
Notícia não vai faltar. Já quanto a bom-senso há dúvidas. Analistas mais pessimistas – em exposição sobretudo nas redes sociais – não descartam o risco de o governo Lula 3 descambar para um cenário de deterioração semelhante ao Dilma 2. Para lembrar, o desfecho político do Dilma 2 foi o impeachment da então presidente e o desfecho econômico foi a maior recessão da história do País que perdeu 7,5% do PIB no biênio 2015/2016.
Lula 3 leva vantagem sobre Dilma
Um estudo comparativo dos governos Dilma 1 e Dilma 2 com Lula 3, assinado pelos analistas Leonardo Correa, Carlos Sequeira, Antonio Junqueira e Osni Carfi, do BTG Pactual, mostra que a situação entre os governos não é tão semelhante quanto se pensa, apesar do ritmo insustentável de expansão da dívida pública – variável que, efetivamente, atormenta os mercados.
“Os preços dos ativos estão em níveis que lembram os da problemática era Dilma, mas há alguma distância a ser percorrida”, observam os economistas que destacam entre as diferenças dos governos Dilma e Lula 3 – e a favor da atual gestão – a dinâmica do crescimento econômico agora fortalecida; o papel do BNDES, agora menor; e a melhora da saúde das empresas públicas.
Ainda assim, pontuam, o mercado continua “altamente monotemático, 100% impulsionado por preocupações fiscais”. E o resultado é a deterioração persistente dos ativos brasileiros, à medida que a sustentabilidade da estrutura fiscal e da trajetória da dívida pública é questionada.
No estudo distribuído em 18 de novembro – anterior ao anúncio das medidas fiscais em 27 de novembro – o BTG avalia que Haddad tem boas intenções e trabalha por ajustes necessários, mas afirma que “falta apoio político forte para adoção de medidas de caráter estrutural”.
Consultados pelo NeoFeed, os profissionais afirmam que o pacote fiscal anunciado não alterou a visão de um mercado binário. Mas eles avaliam que o governo tem a oportunidade de reforçar a confiança dos investidores com cortes de gastos que dê mais credibilidade à limitação do aumento de despesas em 2,5% e à estabilização da dívida com superávits primários à frente. “Tarefa politicamente difícil para o atual governo”, reconhecem.
A principal preocupação dos investidores é a escalada do endividamento – equivalente a dívida bruta de 72% do PIB no início do Lula 3 e devendo crescer a 84% até o fim do governo. Um patamar que supera o indicador de países pares. No México, a relação é de 50%, no Chile, 40% e, na Colômbia, 54%.
“Dívida pública dessa magnitude e com juro real próximo a 7% é desafiadora. Resulta em prêmio de risco significativo. E os ativos provavelmente continuarão a refletir altos prêmios até que o governo implemente medidas – de preferência corte de gastos – para desacelerar essa expansão”, afirmam os analistas.
Sinal de que a evolução da dívida é um ponto crítico, na exposição de indicadores citados no relatório, a relação Dívida/PIB no governo Dilma 1 era de 53,7%; no governo Dilma 2, 66,5%; e, no Lula 3, 77,6%. Atualizado pela Coluna a partir do resultado das contas públicas de outubro, divulgado após a publicação do levantamento do BTG, o indicador avançou a 78,6% do PIB.
Em contraponto, apontam os analistas, a economia exibe, hoje, uma base ligeiramente mais forte, graças às reformas realizadas nos últimos anos, exemplo é a Reforma Trabalhista durante o governo Temer em 2017, e ao impulso fiscal patrocinado pela atual administração. Se hoje o PIB roda a 3%, no governo Dilma 1, a taxa era de 1,9% e, no Dilma 2, retração de 3,6%.
Quanto à inflação, em Dilma 1, o IPCA alcançou 5,8% e, em Dilma 2, quase 11%. Atualmente, a inflação transita entre 4,5% e 5%. Inflação em torno de 4,7% está longe do ideal, observam os analistas do BTG. Mas eles consideram que é difícil argumentar que a inflação está completamente fora de controle.
A balança comercial também é ponto a favor de Lula 3 com superávit esperado acima de US$ 70 bilhões, ante US$ 16,9 bilhões no governo Dilma 1 e US$ 17,4 bilhões no Dilma 2. Outro dado comparativamente melhor hoje, o BNDES registra concessões equivalentes a 1% do PIB, ante 4% a 10% com Dilma.
Riscos sempre existem, é fato, mas é improvável Lula “ressuscitar” Dilma.