A Fami Capital está em fase de estruturação de um time próprio em Miami. Com R$ 16 bilhões sob custódia offshore, a assessoria de investimentos deu um passo importante para ter um atendimento internacional muito próximo do que tem no Brasil.

Até este momento, a assessoria de investimentos não podia atender diretamente seus clientes nos Estados Unidos. A empresa estava registrada no mercado americano no modelo de finder, no qual só era permitido a ela introduzir os clientes às plataformas. Dessa forma, não era possível à assessoria ser responsável pelo cliente ou fazer recomendações de investimentos, funções que ficavam a cargo da XP US como sua parceira.

Agora, a Fami Capital tomou as rédeas dos portfólios dos seus clientes e se registrou no modelo 1099 de broker dealer nos EUA (mantendo-se plugada à XP US como plataforma). O modelo é muito parecido com o de assessorias de investimento no Brasil.

Com isso, passa a ter funcionários no mercado americano que estão cadastrados junto aos reguladores. E foi nesse cenário que Bruno Salgado se junta a Fami Capital como sócio. Ele passa a ser o head private internacional da casa e responsável por estruturar o time em Miami, além de responder às autoridades.

O executivo, que está nos EUA desde 2017, atuou no BTG Pactual por 22 anos, sendo responsável por montar a estrutura offshore do banco nas Bahamas, depois integrá-la ao private banking e fazê-la crescer. Ele também teve passagem pela estrutura offshore da Legend.

Com a estrutura mais robusta, a Fami Capital vai poder ser mais proativa com seus clientes para estimular a alocação de recursos offshore. Ao mesmo tempo, irá assessorar os portfólios onshore e offshore de forma integrada às perspectivas dos clientes.

Até então, a Fami Capital só podia atender diretamente os seus clientes pelo seu Register Investment Advisor (RIA) nos EUA, hoje com cerca de US$ 2 bilhões sob gestão. A empresa prefere usar essa estrutura para cuidar das grandes fortunas - seu tíquete mínimo é de US$ 15 milhões e seu modelo e discricionário dá conta, principalmente, das necessidades do seu family office, a Faros Multi Family Office.

Os demais clientes da Fami Capital usavam o modelo de broker dealer, com um tíquete mínimo de US$ 500 mil. Segundo a empresa, essa operação cresceu 260% desde dezembro de 2023, totalizando cerca de US$ 450 milhões sob custódia. O RIA cresceu 31% no mesmo período.

“Enquanto os clientes do family office já tem a maior parte de patrimônio lá fora, na assessoria esse processo está acontecendo agora, com cada vez mais consciência da importância da diversificação. E eles querem ter lá fora o mesmo atendimento que damos no Brasil”, afirma Felipe Bichara, CEO de Wealth da Fami Capital, ao NeoFeed.

Por isso, no primeiro momento, a intenção é crescer no offshore pela base dentro de casa. Segundo Bichara, o objetivo é dobrar o tamanho da operação em um ano e se aproximar de US$ 1 bilhão.

“Diria que, no momento, nem 10% do patrimônio dos nossos clientes de alta renda e private da assessoria está dolarizado. Acreditamos que ter de 20% a 30% do portfólio em moeda forte é muito saudável, porque os custos desses clientes são dolarizados”, diz Bichara.

Há também a oportunidade de capturar clientes de outras custódias para a XP US sendo cliente da Fami Capital. Os grandes bancos americanos, como J.P. Morgan e Citibank, que tradicionalmente foram usados por brasileiros para investir em ativos no mercado americano, estão aumentando os seus tíquetes mínimos para algo em torno de US$ 2 milhões a US$ 3 milhões. Além disso, atendimento com suporte só para patrimônios acima de US$ 5 milhões, o que tem feito muitos brasileiros buscarem opções.

Felipe Bichara, CEO de Wealth, e Bruno Salgado, head private internacional da Fami Capital
Felipe Bichara, CEO de Wealth, e Bruno Salgado, head private internacional da Fami Capital

“Os clientes menores estão cada vez mais sendo preteridos pelos grandes bancos americanos, principalmente os latinos. Isso é uma grande oportunidade para players brasileiros, que já acostumaram seus clientes no onshore a um alto atendimento”, afirma Salgado, ao NeoFeed.

Há um ano, a Fami informava ter um total de R$ 75 bilhões sob custódia e que captava cerca de R$ 2 bilhões por mês - os números não foram atualizados, desde então, pela empresa.

A evolução do mercado offshore

No último ano, diversas assessorias e corretoras apostaram em ter o seu RIA para ser mais independente na gestão do portfólio do cliente e também no seu negócio. Exemplos são a EQI Corretora, a Blue3 e a SVN.

No modelo de finder, a empresa só é remunerada pela abertura de cadastro ou recebe um rebate das receitas geradas pelas movimentações. A construção dos portfólios e grande parte da receita, portanto, ficavam com a plataforma, que tem autorização para ser broker dealer nos Estados Unidos.

Já o RIA exige uma estrutura maior para operar sozinho nos EUA, mas a empresa passar a ser a responsável pelo cliente no exterior. Ela pode trabalhar com qualquer custodiante, podendo oferecer uma gama maior de produtos. E por oferecer os serviços, fica com uma maior fatia das receitas.

O modelo de broker dealer 1099 é um meio termo, pois permite a assessoria direta tanto por comissão como fee based, desde que em uma única plataforma. Mas a responsabilidade com a legislação, custódia e investimentos em tecnologia fica com o broker, no caso a XP.

Essa foi uma solução trazida pela XP para manter seus parceiros dentro de casa, que teve como projeto-piloto a Davos Financial Partnership. É uma solução mais “leve”, que exige menos investimentos em infraestrutura e assim facilita focar no crescimento.

A escolha da Fami Capital por ter dois modelos, tanto o RIA como o 1099 com a XP, pode parecer um contrassenso por manter dois custos. Bichara, no entanto, alega que isso é simplesmente entender que os clientes são diferentes e é preciso dar a melhor solução para cada um.

“No RIA, a gestão é discricionária e por fee based, como atendemos no family office. Mas não é todo cliente que quer esse modelo. Há pessoas que preferem um modelo mais de assessoria”, diz ele.

Nos Estados Unidos as duas indústrias convivem há muito tempo e, apenas nos últimos anos, os RIAs passaram os broker dealers, sendo estimado terem hoje cerca de 60% do mercado independente.

Segundo a Securities and Exchange Commission (SEC), existem cerca de 15 mil RIAs cadastrados, administrando cerca de US$ 130 trilhões. Já a FINRA, que regula as corretoras nos EUA, afirma ter mais de 3 mil broker-dealers nos EUA, com mais de 620 mil empresas plugadas a elas.