As tarifas anunciadas pelo presidente Donald Trump chacoalharam o mundo, com investidores reduzindo suas posições nos Estados Unidos e diversificando para outras geografias. A nova dinâmica — oposta à concentração em ativos americanos que marcou os últimos anos — beneficiou o mercado brasileiro, com a bolsa e o real se valorizando em abril.
Nenhum fundo local, no entanto, se saiu melhor nesse xadrez geopolítico do que o multimercado Alpha da Chess Capital, que entregou um retorno de 70% no mês.
Vicente Zuffo, CEO e CIO da Chess Capital, explica em entrevista ao NeoFeed que a rentabilidade foi fruto das posições estruturais compradas no Brasil e vendidas nos Estados Unidos, somadas a doses de alavancagem e movimentações táticas ao longo do mês. O fundo opera, majoritariamente, moedas, juros e índices de ações.
“Teve dia em que o S&P 500 estava caindo 5% ou 7% no intraday e reduzimos bastante a nossa exposição vendida em bolsa americana. Naquele mesmo dia, o S&P virou para positivo. Foram dias de muito resultado, porque tivemos uma execução muito boa na parte tática”, diz Zuffo.
Ainda que ajuste a estratégia conforme o dia, o CIO da Chess, que começou no mercado como trader do Banco Original, diz fazer pouco day trade. “É mais em dias de maior volatilidade, como foram os de abril. Aí o próprio mercado dá a oportunidade. Preferimos posicionamentos de longo prazo.”
A posição comprada em Brasil e vendida nos Estados Unidos, conta Zuffo, vem sendo carregada desde a pandemia, diante da disparidade de valuation entre os ativos dos dois países. “O fundo tem uma correlação relativamente alta com o Ibovespa em dólar desde maio de 2020. Estamos otimistas com o Brasil já há um bom tempo.”
Até agora, a aposta deu um retorno acumulado de 102% no ano. O desempenho é o melhor da história do fundo, criado em 2018 como um projeto da SRM Asset na classe de multimercados. Em 2019, Zuffo, que já era o gestor, iniciou o spin-off do produto, culminando na abertura da Chess Capital.
A alta volatilidade por meio de alavancagem é parte do DNA do fundo — e algo de que Zuffo não abre mão.
“É o modelo em que acredito, muito comum nos Estados Unidos há décadas. Tem fundos bem mais voláteis. Quanto maior o risco, maior o retorno. Naturalmente, é desejável que uma parcela menor do patrimônio seja alocada em um produto assim”, diz ele.
Engenheiro computacional pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Zuffo também preside o endowment da instituição e avalia que muito dinheiro institucional entrou “erroneamente” em multimercados de baixa volatilidade quando o juro estava próximo de 2%.
“Muito alocador institucional, family office, private de banco estão revendo o risco-retorno de se alocar em fundos multimercado com 2% de taxa de administração e volatilidade de 5% ou 6%, que, para gerar um alfa que justifique os 2% de administração, é muito difícil.”
O gestor conta que, desde o início, o fundo roda com uma volatilidade média de 50% ao ano, mas que está em 75% em 2025, devido às fortes oscilações de abril. Mas nem sempre essa volatilidade jogou a favor. Entre 2021 e 2023, o fundo sofreu duras perdas com a aposta pró-Brasil, em uma dinâmica de mercado desfavorável à tese. Até o fim de 2024, o fundo acumulava retorno negativo de 17,32%.
“A gente errou bem porque a alta de juros atrapalhou muito essa tese, mesmo com as métricas de valuation mostrando que o Brasil ainda estava em um nível interessante. Isso custou bastante caro pra gente em termos de resgate. Toda a indústria sofreu”, diz o gestor.
Próximos gatilhos
Após o forte desempenho no início do ano, Zuffo conta que, em um movimento tático, reduziu a alavancagem do fundo e zerou a posição vendida em dólar, mas espera retomar o trade em breve. Na avaliação do gestor, o long and short entre Brasil e Estados Unidos deve continuar gerando retorno ainda em 2025.
Um dos catalisadores, diz, será a queda da atividade americana com o tarifaço de Trump. “Vamos começar a ver esses impactos nos balanços do segundo trimestre, divulgados a partir de julho”, afirma.
Esse efeito, afirma, deve levar o Federal Reserve a retomar os cortes de juros nos Estados Unidos, abrindo espaço para o Banco Central começar a baixar a Selic no Brasil a partir do segundo semestre.
“Acredito nesse corte desde o fim do ano passado, quando o Copom contratou mais duas altas de juros de 1 ponto percentual, já entregues. Isso faz efeito na atividade e na inflação. A expectativa de inflação de 12 meses, que importa para o Banco Central, está em queda já há muitas semanas, e novos cortes nos Estados Unidos devem contribuir para isso”, diz Zuffo.
Mas, para Zuffo, a grande reprecificação do mercado brasileiro virá com indícios de um novo ciclo político no País, mais comprometido com a saúde fiscal. “A gente vê pequenos sinais dos atores políticos em torno de uma agenda nesse sentido. Podemos ter um ambiente de juros permanentemente mais baixo. Se isso acontecer, o valuation da bolsa tem que ser outro, muito maior, e o câmbio tem que ser mais valorizado.”
O resultado, acredita, deve ficar para 2026. “Mas o mercado antecipa os movimentos. Então, acho que ao longo desse ano a gente pode ter eventos políticos que façam preço.”