Em setembro do ano passado, quando anunciou a compra da corretora Easynvest, o Nubank dava a sua tacada mais ousada para preencher uma lacuna que faltava: a oferta de produtos de investimentos. Se o cartão de crédito e a conta de pagamentos já estavam consolidados, ainda faltava ser vista pelos clientes como uma marca que fosse além do saldo que rende 100% do CDI, que hoje já não é mais tão atrativo.

Agora, com todos os trâmites burocráticos da aquisição superados ao longo dos últimos 10 meses, o Nubank começa, de fato, a atuar nesse segmento e conta com a Easynvest como sua arma principal para entrar de vez na guerra das plataformas de investimentos, um segmento atualmente dominado por XP e BTG Pactual.

A primeira ofensiva da dupla ao mercado será dada nesta terça-feira, 13 de julho, com a inclusão de dois fundos de investimentos estruturados pelo Nubank na plataforma da Easynvest: um de ações, e o outro, um multimercado, ambos com aplicação mínima de R$ 100, um sinal claro da estratégia de chegar a públicos ainda não atingidos.

Os dois são fundos de fundos, ou seja, contam com recursos alocados em fundos de outras gestoras, como Verde Asset, SPX, Absolute e JGP. “A ideia é que os investidores possam ter acesso a fundos que costumam estar fechados para captação e que, quando abertos, exigem um alto valor de entrada, de R$ 20 mil ou R$ 50 mil”, diz Fernando Miranda, CEO da Easynvest e líder da área de investimentos do Nubank, ao NeoFeed.

O Nubank não cobrará uma taxa de administração própria, uma vez que os clientes já pagarão uma média ponderada das alíquotas definidas pelas gestoras que compõem os fundos, em torno de 1,5%, abaixo do que se o investidor aplicasse em cada um separadamente. A receita da fintech virá da taxa de performance, que será de 20%, a padrão de mercado, tendo o Ibovespa como referência no fundo de ações e o CDI no multimercado.

“Eu não preciso maximizar a monetização agora (cobrando a taxa de administração)”, afirma Miranda. “Eu já vou monetizar com a taxa de performance, pois acredito muito na performance histórica dos fundos, na capacidade de fazer ‘cross selling’ e na possibilidade de aumentar a base de clientes.”

Os dois fundos, que nascem com recursos próprios, já largam com um histórico para mostrar ao mercado. O de ações, criado em abril do ano passado, acumula alta de 55,8% até o início de julho, enquanto o Ibovespa avançou 55%. O multimercado, por sua vez, rendeu 266% do CDI desde o seu início, em junho de 2020.

Além dos fundos que vão entrar na Easynvest, o Nubank já oferece outros três fundos de fundos em seu próprio aplicativo, mas que estão em fase de testes e só aparecem a uma base restrita de usuários. Por ora, os aplicativos seguem separados, mas o Nubank fará um esforço para levar os seus 40 milhões de clientes para a plataforma da corretora.

“Já temos um processo supersimples, dentro do app do Nubank, para que o cliente, com poucos cliques, em quatro ou cinco etapas, vá para o aplicativo da Easynvest e comece a investir, baixando o app da Easy, claro”, diz o executivo.

Ao entrar no mercado de investimentos, o Nubank se depara com um segmento que já conta com players consolidados. Enquanto a Easynvest tem 1,9 milhão de clientes e R$ 27,6 bilhões sob custódia, a XP, líder do mercado, tem 3 milhões de clientes e R$ 715 bilhões sob gestão, segundo balanço do primeiro trimestre.

A competição não será apenas com outras corretoras, mas também com bancos digitais que têm lançado plataformas de investimentos em seus aplicativos. Dos 12 milhões de clientes do Inter, 1,7 milhão são investidores. No primeiro trimestre, a Inter Invest tinha R$ 52 bilhões sob custódia. Outro que embarcou nessa estratégia foi o C6, que lançou a sua plataforma em 2019, mas ainda não revela números.

As estratégias, porém, são diversas. Os números acima mostram que a XP, por exemplo, lida com um público de renda mais alta, ao passo que a Easynvest tem um tíquete médio menor. Além disso, a plataforma comprada pelo Nubank aposta na estratégia do autoatendimento, sem assessores, assim como Clear e Toro Investimentos - diferentemente da própria XP e do BTG, que apostam em agentes autônomos para acelerar a captação de clientes.

“Os agentes autônomos e assessores colocam barreiras muito altas para os investimentos, gerando aplicações mínimas de R$ 50 mil ou R$ 100 mil”, afirma Miranda. “E eu não acho que preciso de um assessor para ser bem atendido. Posso ser bem atendido com tecnologia e conteúdo de qualidade.”

Para se posicionar, o Nubank assume como palavra de ordem a mesma de quando surgiu com o cartão de crédito: democratização. Não significa, porém, que a fintech vai se concentrar em investidores de renda menor. “Quando falamos em democratizar os investimentos, quer dizer que queremos atingir tanto o investidor que tem R$ 300 mil quanto o investidor que tem R$ 300”, diz Miranda.

O desafio maior não será roubar um cliente do outro, mas atrair aqueles que ainda vão chegar. Mesmo com a Selic agora em ritmo de alta, o que tira atratividade da renda variável, as plataformas acreditam que há bastante espaço para aumento do número de CPFs cadastrados na Bolsa - hoje em cerca de 4 milhões. “Com conhecimento e educação financeira, os brasileiros vão cada vez mais entrar na Bolsa e esse número pode chegar a 10 milhões antes de 2025”, afirma o executivo do Nubank.

A própria Easynvest, antes de ser comprada pelo Nubank, já vinha surfando essa onda, impulsionada pela redução da Selic a níveis historicamente baixos. Se antes 5% dos novos investidores que abriam conta na corretora chegavam para investir em ações, agora essa proporção gira em torno de 50% a 55%, compara Miranda.

A busca pelo lucro

Ao entrar para o mundo das plataformas, um negócio considerado lucrativo, o Nubank também caminha para silenciar as constantes cobranças que tem recebido do mercado por operar no vermelho desde a sua fundação, embora a companhia argumente que o prejuízo é uma escolha justificada pelos investimentos na expansão. No ano passado, a fintech registrou resultado negativo de R$ 230 milhões.

Apesar disso, a empresa tem recebido a confiança de investidores renomados, entre eles Warren Buffett, que recentemente aportou US$ 500 milhões na fintech, agora avaliada em US$ 30 bilhões, sendo a quarta maior instituição financeira da América Latina em valor de mercado.

Hoje, a companhia fundada por David Vélez, Cristina Junqueira e Edward Wible conta com acionistas como Sequoia Capital, Kaszek Ventures, Tiger Global Management, QED Investors, Founders Fund, DST Global, Redpoint Ventures, Ribbit Capital, Dragoneer Investment Group, Thrive Capital, Tencent, além da Berkshire Hathaway, de Warren Buffett.

Com lucro ou sem lucro, o Nubank, embora não confirme, está em processo avançado para abrir capital nos Estados Unidos e tem uma tese de investimento que se baseia no seu crescimento exponencial.

De olho nisso, tem atraído nomes respeitados no mercado financeiro internacional para compor o seu Conselho de Administração. Entre eles, estão Jacqueline Reses, ex-CEO da fintech Square; Luís Alberto Moreno, ex-presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID); e Daniel Goldberg, ex-presidente do Morgan Stanley no Brasil; além da cantora Anitta, que ajudará no fortalecimento da marca em outros países, como México e Colômbia.

De qualquer forma, a compra da Easynvest será importante para diversificar o negócio do Nubank e ajudar a obter resultados melhores, avalia Stefan Darakdjian, sócio da Meraki Capital e analista do setor financeiro. “É uma aquisição importante para o Nubank porque o valuation deles precisa começar a fazer sentido, para que deixem de ser apenas um banco digital e gratuito”.

Darakdjian ressalta ainda que a fintech foi assertiva em buscar um player já consolidado no mercado, para dispensar o trabalho de construir uma plataforma do zero, como fez o Inter. “Eles já largam bem posicionados”, afirma.

Para ele, o Nubank não deve chegar a incomodar a XP, que se encontra em posição mais confortável, mas deve “tirar um pouco da paz” do BTG, o segundo colocado. “A maioria dos clientes do Nubank tem depósito em conta, são poupadores e não tomam crédito, então eles devem chegar com força no mercado”, analisa o sócio da Meraki.