Enquanto os Estados Unidos acabam de completar dois anos com inflação elevada e os europeus batem seguidos recordes de aumento de preços, a China fechou março com uma inflação anual de apenas 0,7%.

Mas isso não é, necessariamente, uma boa notícia. O temor é que o baixo consumo aliado à estagnação ou queda de preços no varejo e na indústria joguem o gigante asiático em um ciclo de deflação, o mesmo que tragou por mais de 20 anos a economia japonesa.

Os indicadores contraditórios da economia chinesa começam a assustar as autoridades monetárias do país. O PIB da China, por exemplo, cresceu 4,5% no primeiro trimestre deste ano, atribuído em grande parte ao impacto da demanda reprimida após três anos de restrições pandêmicas. Sem contar a retomada pós-pandemia, de acordo com economistas, o crescimento do PIB seria de 2,6%.

“Isso significa que a recuperação econômica está em andamento, mas não é forte o suficiente para elevar os preços”, disse Zhang Zhiwei, presidente da Pinpoint Asset Management, ao jornal South China Morning Post.

O drama é que os gastos pós-pandemia dos chineses ficaram concentrados basicamente no setor de serviços, como restaurantes e viagens, fortemente atingido durante o lockdown mais severo do ano passado.

Isso fica claro ao comparar os dois indicadores básicos de inflação, o índice de preços ao consumidor (CPI) – que inclui alimentos, combustíveis e serviços – e o índice de preços ao produtor (PPI), que registra bens ligados à produção industrial.

Enquanto o CPI subiu 0,7% em março, ano a ano, abaixo do crescimento de 1% em fevereiro, o PPI caiu 2,5% no mês passado, ano a ano, abaixo da queda de 1,4 % de fevereiro.

Na prática, os chineses simplesmente não estão comprando bens – os preços de fábricas caíram pelo sexto mês consecutivo, ou seja, ainda há produtos encalhados desde a época da pandemia.

Em vez de gastar dinheiro, os chineses que não estão endividados estão guardando dinheiro na poupança a uma taxa recorde. Para embaralhar o cenário, outros setores da economia – como importação e exportação, além do mercado imobiliário – também registram índices medíocres de expansão.

Longe da meta

A ironia é que o Banco Popular da China (PBOC) – o banco central do país – está fazendo sua parte, cortando as taxas de juros e injetando dinheiro no sistema financeiro para estimular o consumo.

Apesar dos esforços, a inflação anual ainda está longe da meta estipulada pelo BC chinês, de 3% - o que soa como provocação ao trabalho hercúleo dos BCs do Ocidente para baixar a inflação em seus países para atingir essa meta.

A liquidez no sistema bancário foi sugada em grande parte por novos empréstimos dos governos locais, que ainda estão endividados desde a quebra da bolha imobiliária.

Embora os economistas ainda não classifiquem o atual ciclo como deflacionário, é evidente a preocupação com essa possibilidade. A deflação é definida como um declínio sustentado e amplo nos níveis gerais de preços de bens e serviços durante um período de tempo – levando consumidores e empresas a adiar gastos, antecipando que os preços caiam ainda mais, o que só agravaria os problemas econômicos.

Na China atual, as empresas continuam cautelosas em fazer novos investimentos. Isso está levantando o espectro de uma queda de preços e salários, a fórmula deflacionária que castigou o Japão, onde os juros são negativos.

O economista Liu Yuhui, professor da Academia Chinesa de Ciências Sociais (CASS), no entanto, diz que ainda é cedo para prever o pior cenário.

“À medida que as políticas de apoio financeiro entram em vigor, espera-se que a demanda do consumidor aqueça e os aumentos de preços provavelmente retornem aos níveis médios dos anos anteriores no segundo semestre deste ano.”