Quando Steve Jobs morreu, em outubro de 2011, os analistas temeram pelo futuro da Apple sem o seu cofundador visionário, o homem que havia criado o iMac, o iPod, o iPhone e o iPad.

O temor fazia sentido. Ainda mais porque Jobs havia escolhido como sucessor Tim Cook, um executivo sem carisma e que muitos acreditavam que era “talhado” para fracassar à frente da Apple.

Quase nove anos depois da morte de Jobs, a Apple sob o comando de Cook se tornou a primeira empresa americana a atingir o valor de mercado de US$ 2 trilhões em meio a maior pandemia deste século. Ao longo do dia, ela bateu na espantosa cifra e fechou o pregão valendo US$ 1,97 trilhão.

É um feito e tanto. Neste ano, desde 23 de março, as ações da Apple mais que dobraram, quando atingiram o seu menor patamar em 2020. A companhia demorou 38 anos para atingir o valor de mercado de US$ 1 trilhão, em agosto de 2018. E, em dois anos, dobrou a sua capitalização.

Desde quando Cook começou a administrar a Apple, a receita e os lucros mais do que dobraram. O valor de mercado da Apple passou de US$ 348 bilhões para US$ 2 trilhões. A companhia conta com US$ 81 bilhões em caixa, excluindo os débitos, e o retorno aos acionistas chegou a US$ 475,5 bilhões.

Em seu último exercício fiscal finalizado em setembro de 2019, a Apple faturou US$ 260 bilhões. Mesmo no "vendaval" da crise, a companhia floresceu e viu suas vendas subirem 11%, para US$ 60 bilhões, no último trimestre encerrado em junho. O lucro, no período, foi de US$ 11,25 bilhões.

Esses números incríveis conquistados por Cook foram alcançados sem que a Apple lançasse neste período todo nenhum produto revolucionário, como acabou sendo praxe na época em que Jobs esteve à frente da companhia em seu segundo retorno, de 1997 a 2011.

Apesar das críticas do mercado à época a nomeação de Cook, o biógrafo de Jobs, o escritor Walter Isaacson, era um dos poucos que via sentido na indicação de Cook para comandar à Apple.

De acordo com ele, Cook nunca foi um "homem de produtos", mas a Apple precisava de um gestor operacional depois de perder alguém insubstituível como Jobs. Em certa medida, seria o triunfo do método (Cook) sobre a mágica (Jobs).

Ao contrário de Jobs, Cook focou em manter os custos sob controle, apostou alto na China (o que se mostrou acertado) e focou em construir um ecossistema de serviços e produtos ao redor das principais "joias" da casa. Em especial, o iPhone, que representou 44,2% da receita no terceiro trimestre de 2020, terminado em junho.

Durante sua gestão, a Apple lançou sim novos produtos. Mas nada que empolgasse os seus fanáticos consumidores, que gostariam de ver o toque “mágico” de Jobs. Entre eles, destacam-se o Apple Watch, lançado em 2015; os AirPods, em 2016; o HomePod em 2018.

A grande aposta, agora de Cook, são os serviços por assinatura de música, filmes e armazenamento em nuvem, numa transição que deve transformar a Apple em uma companhia de serviços em vez de hardware. É uma forma de reduzir o que os analistas chamam de “iPhonedependência”

O estilo Cook

Todas as estratégias desenhadas e colocadas em prática pelo executivo de 59 anos foram "autorais". Em conversa com alunos da Universidade de Auburn, no Alabama, onde se formou, Cook disse que sabia que nunca deveria tentar copiar o estilo e o pensamento de Jobs.

"Eu falharia miseravelmente se fizesse isso e acho que é o que acontece com muita gente que tem que dar continuidade ao legado de uma pessoa que é um ícone. O importante é traçar o próprio caminho e ser a melhor versão de si", discursou Cook, em 2017.

Desde que assumiu a Apple, Cook mantém sua rotina de acordar às 4 horas da manhã para revisar os dados de vendas globais. Ele segue se reunindo às sextas-feiras com a equipe de operações e finanças.

As reuniões com Cook, aliás, são um caso à parte. Joe O’Sullivan, um ex-executivo da Apple, disse que no primeiro dia de trabalho de Tim Cook na empresa, em março de 1998, ele conduziu uma reunião de 11 horas.

O caso é um bom exemplo de como o executivo é detalhista. A liderança do americano é marcada por uma bateria de perguntas e ele espera que seus pares saibam responder de maneira completa a cada uma delas.

Apesar de ser um chefe "linha dura", Cook é bastante colaborativo – e não apenas com sua equipe direta. Em 2013, depois de uma conversa com um dos principais investidores da companhia, o executivo fez o que o seu predecessor jamais faria: usou enorme fluxo de caixa positivo da empresa para recomprar ações da Apple.

No começo foram US$ 30 bilhões alocados para esse fim, mas a quantia subiu para os atuais US$ 360 bilhões. Essa tática acertada de retornar capital foi o que atraiu novos investidores, entre eles Warren Buffett com sua gigante Berkshire Hathaway.

A semente de tudo

Nascido em Robertsdale, no Alabama, Timothy D. Cook é o filho do meio do casal Donald e Geraldine Cook. Formado em engenharia industrial pela Universidade de Auburn, ele também acumula o MBA pela Universidade de Duke.

Seu desempenho acadêmico impecável abriu portas na IBM, onde Cook atuou por 12 anos, chegando ao posto de diretor de atendimento da empresa na América do Norte, gerenciando funções de fabricação e distribuição para a empresa de computadores pessoais na América do Norte e na América Latina.

Depois, Cook aceitou o convite para ser o vice-presidente da Compaq Computers para materiais corporativos, mas essa experiência profissional foi "abreviada" pela Apple. Em 1998, Cook cedeu aos apelos de Steve Jobs e se tornou o vice-presidente de operações da companhia da maçã.

Trabalhando lado a lado com Jobs, Cook comenta que a relação transbordava para a amizade. Tanto que, em 2009, quando a saúde do cofundador da Apple estava em estado bastante crítico por conta de um câncer pancreático, Cook ofereceu uma parte de seu próprio fígado, já que um transplante poderia salvar o empresário. Jobs recusou a oferta e faleceu em 2011, mesmo ano em que Cook assumiu a companhia.

Bastante discreto sobre sua vida pessoal, Cook fez uma breve exceção em 2014, quando se assumiu gay publicamente. Ele voltou a falar sobre o caso em 2018, durante uma entrevista à rede de tevê CNN. "Eu precisava fazer algo para mostrar que é possível ser gay e conseguir coisas grandiosas."

Essa sua visão de mundo tem moldado também sua visão dos negócios e Tim Cook está pessoalmente empenhado em promover a diversidade dentro da própria empresa.

Em conversa com o NeoFeed, um funcionário do varejo da Apple contou que não tem contato direto com o CEO, mas que é notório entre todas as equipes a importância da inclusão.

"Quando manda mensagens aos funcionários, ele fala em fazer do mundo um lugar melhor e em deixar um bom legado. Pela primeira vez, não sinto que é um discurso marqueteiro. Percebo, na prática, que a empresa tenta mesmo viver esses valores." Até agora, tem dado resultado.

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