O investidor Marcelo Maisonnave fala com propriedade e mostra que tem um plano bem delineado. Diz, convicto, que a sua corretora Warren, fundada em 2017 ao lado de Tito Gusmão, André Gusmão e Rodrigo Grundig, com foco 100% digital, vai atingir 2 milhões de clientes e R$ 60 bilhões sob custódia em 2025.
Há quem duvide. Afinal, a Warren hoje conta com 110 mil clientes e R$ 400 milhões sob custódia – bem distante da meta traçada pelo sócio-fundador e conselheiro da empresa. Mas o histórico de Maisonnave recomenda que é melhor levar a sério o que ele fala. Ele criou a XP Investimentos a partir do zero. Isso mesmo.
Foi ao lado de Guilherme Benchimol, numa pequena salinha em Porto Alegre, que eles deram origem à corretora que hoje tem R$ 250 bilhões sob custódia. Maisonnave saiu da empresa que fundou em 2014. E hoje trabalha para mudar a cara do mercado de capitais e diminuir o poder de sua cria.
Guardadas proporções, ele quer fazer na Warren o que fez na XP. E, se plataformas de investimentos como Órama, Easyinvest, Guide e a própria XP apontam os grandes bancos como “os vilões que fazem as pessoas investirem mal”, Maisonnave adiciona as plataformas existentes nessa conta.
“O mercado de investimentos no Brasil está sentado em um conflito de interesses”, diz Maisonnave ao NeoFeed. Ele explica que, com a sofisticação das plataformas de investimento, o mercado financeiro ficou muito complexo. “Tem muitos fundos, nomenclaturas novas, regras do FGC. O investidor comum trava. Ele acaba delegando para um terceiro, para o gerente de banco ou para o agente autônomo” diz ele.
Só que esses profissionais, prossegue Maisonnave, têm conflitos de interesses embutidos. “Eles têm incentivo para vender produtos financeiros. Eles estão comissionados para a venda.” Em maio de 2019, Maisonnave participou do painel “Novos modelos de distribuição de produtos de investimento” em um congresso da Anbima e foi direto ao ponto.
“Eles (gerentes de banco e agentes autônomos) têm incentivo para vender produtos financeiros. Eles estão comissionados para a venda”, diz Maisonnave
Moderado por Claudio Sanches, diretor de produtos e investimento do Itaú, o debate aconteceu com a participação de Antonio Berwanger, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM); Pedro Boesel, da Rico Investimentos; Marcelo Flora, do BTG Pactual; e Luiz Caselli, da McKinsey. Durante a apresentação da consultoria, foi mostrado que os fundos passivos, os ETFs, ganhavam espaço ao redor do mundo e aqui não.
“Expliquei que os fundos ativos, que cobram 2% com 20%, crescem mais aqui no Brasil porque pagam 50% de comissão para as plataformas, que fazem campanhas na televisão, que captam mais para esses fundos, que cobram 2% com 20%...” E prossegue em sua análise. “Não existe uma plataforma com o objetivo de fazer o bem”, diz ele, excluindo sua Warren desse bolo.
Maisonnave aponta ainda, sem dar nomes, um movimento de plataformas que querem ter equity nas gestoras. “Isso é grave!”, diz ele. “Muitas chegam e dizem: ‘Quer vender na minha plataforma, me dá equity da sua empresa!’”. De acordo com ele, a CVM deveria olhar esse movimento com muita atenção. “Olha o conflito de interesse! A plataforma vai vender produto da gestora em que é dona ou de uma gestora supercompetente que está no mercado?”, indaga.
O início de tudo
Investidor em série em várias fintechs e startups como Monkey e Startse, Maisonnave enxerga a Warren como uma disruptora nesse mercado que muda constantemente com a evolução tecnológica. A gênese da Warren, inclusive, reside nas ferramentas digitais disponíveis no mercado. “Não há rocket science no que fazemos”, diz ele. “Soubemos combinar o que estava disponível.”
A Warren “esbarrou” nele no fim de 2015. Na época, Maisonnave morava em Nova York e foi tomar um café com Tito Gusmão, que havia criado a empresa, ainda um projeto em Powerpoint, um ano antes. Tito explicou o sucesso que estava tendo com o projeto e o interesse de aceleradoras americanas.
A Warren era uma empresa que criaria os cenários de investimentos ideais para cada pessoa, de acordo com as respostas de um questionário, tudo baseado na inteligência de um algoritmo. Cobraria apenas uma taxa sobre o patrimônio investido e não haveria conflito de interesse.
A ideia havia sido validada depois do Collision, o maior evento para startups encontrarem aceleradores, realizado em Las Vegas. Entre os 500 projetos apresentados, a Warren ficou entre os top 10. No momento em que Tito explicou todos os detalhes, Maisonnave nem titubeou, disse que entraria no negócio e chamou Tito para almoçar em sua casa, no subúrbio novaiorquino, no fim de semana.
Chegando lá, Tito, cheio de expectativas, já disse quanto dinheiro precisaria para começar a operar no mercado americano e qual estrutura seria necessária. Antes de terminar, Maisonnave o interrompeu. “Tito, vamos montar a Warren, mas vai ser no Brasil. A gente conhece o mercado, as regulamentações, as pessoas, sabemos os caminhos. Vamos jogar esse jogo no Brasil. Não vamos inventar de jogar esse jogo na liga dos americanos.”
O jogo no Brasil
Tito, que também havia sido sócio da XP, desembarcou no Brasil, mais precisamente em Porto Alegre, em janeiro de 2016 e começou a botar o negócio de pé. A capital gaúcha foi escolhida por ter uma mão de obra qualificada na área tecnológica. “Temos mesa de operação, de renda fixa, mas nos consideramos uma empresa de tecnologia. Mais da metade da empresa é formada por engenheiros de software”, diz Maisonnave.
Primeiro, a empresa iniciou fazendo toda a programação, o desenvolvimento do aplicativo, testes de segurança, processo de abertura de conta e o sistema que faz todas as operações funcionarem. Em paralelo, os fundadores da Warren correram para ter autorização da CVM para operar – um processo que demorou um ano.
Em janeiro de 2017, a companhia entrou no ar com uma grande lista de espera de mais de 20 mil potenciais clientes. Isso aconteceu porque os sócios criaram uma estratégia para envolver influenciadores digitais no processo de criação. “Chamamos 140 pessoas das áreas de tecnologia, design, tendências para darem opinião sobre a Warren”, diz Maisonnave. “No fundo, a Warren é fruto de uma co-criação de muita gente.”
No primeiro ano de operação, terminou com 20 mil clientes e R$ 90 milhões sob custódia. Neste ano, a expectativa é fechar com 130 mil usuários e R$ 1 bilhão sob custódia. Para isso, terá de acelerar neste último trimestre. Tito Gusmão, o CEO da Warren, explica que é possível atingir a meta, mostrando os perfis de clientes da corretora que dispõe de 300 fundos de terceiros e nove próprios.
As personas mapeadas pela fintech dividem-se nas categorias White, Pink e Black. White são os clientes com, em média, 22 anos, e que investem cerca de R$ 5 mil. Pink são aqueles que têm 32 anos e aplicam, em média, R$ 40 mil. Black são os clientes com 36 anos ou 37 anos e que destinam R$ 100 mil para investir. “Mais de 60% dos usuários são White e 90% do dinheiro investido na plataforma são de clientes classificados como Pink e Black”, diz Gusmão.
Consultores financeiros
Para ganhar mais tração, a corretora está inaugurando uma área chamada Warren for business, voltada para uma rede de assessores de investimentos que possam trazer clientes de alta renda. Indagado se este seria o mesmo modelo XP, Maisonnave responde sem meias palavras.
“Ele se assemelha ao modelo XP por ter assessores de investimento. Mas tem uma grande diferenciação. A XP cresce em cima dos agentes autônomos de investimentos. Quando você fecha o olho, lembra do Leonardo Di Caprio, em ‘O Lobo de Wall Street’”, diz, referindo-se ao conflito de interesses.
Maisonnave diz que, no modelo adotado pela Warren, o consultor vai cobrar diretamente do cliente sobre o seu serviço. “Na nossa plataforma for business, diminuímos o preço da taxa para o consultor colocar o valor dele”, afirma. Na Warren, cobra-se uma taxa de 0,5% sobre o ativo investido. Para incentivar os consultores da Warren for business, a própria corretora vai diminuir essa taxa para patamares que variam entre 0,15% e 0,30%.
Além desse produto, a companhia lançará uma ofensiva que inclui uma conta remunerada com rendimento de 100% do CDI; a Warren Pay, para pagar contas, e a Warren Green, fundo que investe em ações de empresas brasileiras e estrangeiras com boas práticas governamentais, sociais e ambientais.
A empresa também inaugura a Warren PJ, para que empresas possam investir; a Warren Previdência, um plano de previdência da corretora; a Warren Ultra Black, uma atendimento personalizado para quem investe mais de R$ 500 mil; e o novo aplicativo do Elliot, voltado para a compra e venda de criptomoedas.
Suporte para brigar
Além do investimento dos próprios sócios, a Warren recebeu um aporte de R$ 25 milhões em março deste ano. A rodada foi liderada pelo fundo de venture capital americano Ribbit, que investe em fintechs como Robinhood e Coinbase. O fundo argentino Kaszek Ventures também participou.
Santiago Fossatti, sócio do Kaszek Ventures, explicou ao NeoFeed que o fundo investiu na fintech porque enxerga muito potencial de crescimento. “Existe uma grande oportunidade de ajudar os brasileiros a investir melhor. Especialmente quem tem menos de R$ 150 mil, que representam 90% das pessoas que têm conta em banco. Essas pessoas colocam dinheiro na poupança, que é um produto muito ruim”, diz Fossatti.
A Warren recebeu um aporte de R$ 25 milhões em março deste ano e uma nova rodada é esperada para 2020
Sobre a possibilidade de a Warren se converter em uma nova XP, Fossatti diz que o objetivo é “montar uma nova companhia, com um novo produto e um outro tipo de dinâmica. Sem dúvida, enxergo a Warren como um grande player, independente e que ajudará milhões de brasileiros a investir”, afirma.
Mas a fintech não navega sozinha nesse mercado. Outras empresas atuam com propostas semelhantes, oferecendo serviços na mesma linha. A Magnetis, a Vérios e a Vitreo são algumas delas. “O Pi, do Santander, também surgiu fazendo algo parecido com a Warren”, diz Maisonnave. “Sinal de que estamos liderando esse movimento.”
Para fazer frente aos concorrentes e conseguir aumentar a sua base de clientes, a Warren se prepara para elevar os investimentos em marketing. Do aporte que recebeu em março deste ano, 70% foram destinados a investir em infraestrutura tecnológica e 30% para marketing.
“Já estamos fazendo propaganda em canal de tevê por assinatura”, diz Maisonnave. Na próxima rodada de investimentos, que deve acontecer em 2020, 70% do dinheiro será usado em marketing e 30% para infraestrutura. É aguardar os próximos capítulos pela disputa dos investidores.
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