A queda da Selic, juros de longo prazo, dólar e risco-país observada nas últimas semanas favorece o relaxamento das condições financeiras e deve estimular a expansão da economia. Indicadores selecionados apontam que o pior já passou.
É fato que a avaliação de cenários a ser apresentada na quarta-feira, 16 de agosto, pelo Federal Reserve (Fed), na ata referente à última reunião sobre juros, poderá mexer com preços de ativos no mundo inteiro e também no Brasil. Mas pontualmente.
Aqui, as discussões sobre o arcabouço fiscal, a ser reavaliado pela Câmara após sofrer alterações no Senado, tendem a se prolongar e ainda não comprometem o bom humor dos mercados e, tampouco, preços de ativos.
A tendência de melhora do ambiente econômico é clara para o Brasil, revelam o Indicador de Condições Financeiras (ICF) e o Índice de Apetite ao Risco (IAR) criados e monitorados pelo Bradesco.
Após registrar contração inédita de 0,60 ponto negativo em outubro de 2022, o Indicador de Condições Financeiras aproxima-se de zero e deverá avançar em território positivo – de expansão financeira – em setembro. O Índice de Apetite ao Risco está positivo em 0,80 ponto, nível mais elevado desde o início da pandemia. Quanto mais alto o índice, mas atraente é investir no país.
O IAR é abrangente por agregar variáveis de Chile, Colômbia, México, África do Sul, Turquia, Rússia, Indonésia e Malásia, além do Brasil – é composto pelo índice de volatilidade global de ativos (VIX), índices de ações, além de juros, câmbio e risco-país. E também aponta um bom momento para os emergentes.
Em entrevista à Coluna, Myriã Bast e Marcelo Gazzano, respectivamente, superintendente e coordenador do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, observam que se o Indicador de Condições Financeiras mira zero ou a neutralidade é sinal de que a economia cresce em sua tendência potencial. Positiva para investimentos. E isso é o que se vê atualmente.
“As condições financeiras e o apetite ao risco caminham juntos e a trajetória positiva registrada por ambos revela que o Brasil está criando condições que vão colaborar para a expansão da economia. Mas não é possível antecipar o quanto dessa melhora será traduzida em pontos no Produto Interno Bruto (PIB)”, observa Bast.
Gazzano acrescenta que o ICF procura captar também a evolução de indicadores internacionais – como preços de commodities, evolução dos principais índices de bolsas de valores, câmbio. Um conjunto de variáveis que aponta a evolução das economias e também de empresas.
O economista destaca que as taxas de juros (mesmo em queda) continuam sendo “uma variável restritiva” na composição dos indicadores e para a economia, inclusive, porque há defasagem entre as decisões tomadas pelos bancos centrais e os efeitos concretos da política monetária na atividade.
“Mas ainda que os efeitos expansionistas da política monetária para a atividade não sejam imediatos, o ICF mostra que condições estão sendo criadas para um ciclo de expansão”, reforça Gazzano.
Sinalização do Fed é ponto alto na agenda
Condições financeiras é o tema que estará no foco da agenda econômica na virada da primeira para a segunda quinzena de agosto, dada a relevância da ata do Comitê Federal de Mercado Aberto do Fed que, em sua última reunião, elevou a taxa básica ao intervalo de 5,25% a 5,50%.
A alta do juro pelo Fed em 0,25 ponto em 26 de julho, após a pausa observada em junho, aumentou a confiança dos mercados na manutenção do intervalo atual daqui para frente. E a inflação ao consumidor em julho, divulgada na quinta-feira, 10 de agosto, praticamente estável ao registrado em junho, fortaleceu a percepção de que Fed poderá interromper em setembro o ciclo de alta do juro – fundamental para aliviar as condições financeiras globais.
Embora abordando eventos anteriores à última reunião de política monetária, a ata do Fed é oportuna porque, a depender do tom, poderá evitar o recrudescimento da tensão provocada pelo rebaixamento da classificação de crédito de 10 bancos pequenos e médios pela Moody’s Investors Service, anunciado na segunda-feira, 7 de agosto.
Esse rebaixamento, aliado à perspectiva de revisão de rating de bancos maiores, reacendeu o temor quanto ao risco de crise bancária por desequilíbrios entre ativos e passivos decorrentes do forte aperto monetário realizado pelo Fed no último ano e meio. A quebra do Silicon Valley Bank e Signature Bank não caiu no esquecimento.
Ao reclassificar as instituições, a Moody’s disparou um alerta importante. Afirmou que os resultados trimestrais de vários bancos mostraram “crescentes pressões de lucratividade que reduzirão sua capacidade de gerar capital, pois uma leve recessão se aproxima e a qualidade dos ativos parece prestes a diminuir, especialmente no portfólio de imóveis comerciais de algumas instituições”. A observação não passou despercebida de especialistas.
Há duas semanas, a Moody’s também avaliou as condições de bancos brasileiros no contexto de queda da Selic. E a visão é positiva. A agência avalia que a redução da taxa básica “vai gradualmente enfraquecer os desafios que minaram a lucratividade das instituições nos últimos trimestres: custo mais alto de captação, elevada inadimplência e provisões adicionais para calotes”.
Serão mais beneficiados pelo ciclo monetário os bancos médios, sobretudo aqueles com foco em consignado. Banco do Brasil, Caixa, Bradesco e Santander devem ser mais beneficiados pela queda dos juros por terem nas carteiras empréstimos de prazos mais longos contratados a taxas fixas.
Itaú Unibanco e BTG, avalia a Moodys, deverão ser menos beneficiados porque suas carteiras têm parcela mais expressiva de crédito a juros flutuantes.