A última semana de julho promete ser eletrizante no mercado financeiro altamente sensível a informações que precipitam reavaliação de juro e câmbio – preços fundamentais da economia e lastro de investimentos no mercado financeiro responsável pelo financiamento da dívida pública brasileira de R$ 7,3 trilhões – R$ 1 trilhão com rolagem diária a 15%.

Importante evento, a definição de taxas básicas em reuniões concomitantes pelos bancos centrais do Brasil e dos EUA em mais uma superquarta, 30 de julho, rivaliza com o anúncio de uma pilha de indicadores econômicos e o “Dia D”’ – 1º de agosto, sexta-feira, da entrada em vigor das tarifas impostas por Donald Trump a parceiros comerciais e, portanto, da alíquota de 50% a produtos brasileiros. Se Trump não voltar atrás.

A coletânea de dados a ser divulgada pode ser vista como um termômetro da saúde das economias subordinadas, em maior ou menor grau, às tarifas norte-americanas ou ao processo de negociação que vem se estendendo no tempo entre EUA e vários países. E justificando aceleração de vendas e embarques de produtos ou bloqueio e atraso nas transações comerciais.

No Brasil, setores estimam perdas com o tarifaço, governos estaduais montam programas de apoio a empresas e a equipe econômica arremata um plano de contingência a ser (ainda) apresentado ao presidente Lula. Plano necessário, mas que escancara dificuldade – ou resistência – à negociação direta e técnica com a Casa Branca e que isola o Brasil que acerta, porém, ao não se sujeitar a pressões políticas ou ideológicas.

Antes do “Dia D”, de 29 a 31 de julho – terça a quinta-feira – serão publicados o Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre da Alemanha, da Zona do Euro e dos EUA que, no primeiro trimestre, caiu a 0,50% em base anualizada, após expansão de 2,4% no último quarto de 2024.

O PIB americano é um dos indicadores internacionais incluídos numa extensa lista em que predomina o mercado de trabalho. A agenda doméstica vai na mesma linha com destaque para a criação de vagas pelo Caged e taxa de desemprego pela Pnad Contínua – ambos marcadores de atividade.

A agenda de dados americanos tem, entretanto, uma “pegadinha”: as informações mais relevantes para decisões monetárias – a inflação medida pelo índice de preços das despesas com consumo pessoal que é a preferida do Federal Reserve (Fed) e a criação de postos de trabalho – saem na quinta e na sexta-feira. Portanto, após o anúncio da taxa de juro na quarta-feira, 30.

Quem alerta sobre a “pegadinha” do calendário é o economista da Unicamp e professor da FEA-USP, José Francisco Lima Gonçalves, para quem o Comitê Federal de Mercado Aberto, o Copom dos EUA, já inicia a reunião com a ressalva de que não terá às mãos dados cruciais. E anunciará uma decisão sob o risco de, no dia seguinte, se defrontar com um salto da inflação às vésperas do tarifaço que deverá entrar efetivamente em vigor.

Juro real de 10% é imbatível para oportunistas

Esses indicadores-chave para o Fed fecham o primeiro semestre de Trump na Casa Branca, marcado por idas e vindas do tarifaço, enfraquecimento do dólar também pela política fiscal expansionista do mandatário e por sua rusga com o presidente do Fed, Jerome Powell, que se mostra duro na queda, mas que Trump sugere teimosamente estar na corda bamba.

A despeito do palpite de Trump de que o juro poderia estar em 1%, o Fed deverá manter a faixa 4,25% a 4,50%, avalia Lima Gonçalves que, em conversa com o NeoFeed, diz não ver o menor sentido na ideia do respeitado economista Mohamed El-Erien de que a renúncia de Powell seria um caminho para preservar a independência do Fed.

“Ao contrário, a presidência exercida por Powell é a manifestação concreta da independência da instituição. Um sinal de resistência de uma atribuição legal”, pontua o professor para quem os próximos indicadores econômicos dos EUA confirmarão o impacto altista das tarifas comerciais – perspectiva que justificará um Fed ainda mais cauteloso na gestão monetária.

Sem embarcar na pressão de Trump sobre Powell, investidores projetam duas reduções do juro nos EUA: em setembro e dezembro. Ambas de 0,25 ponto percentual que, se confirmadas, levarão a taxa básica ao intervalo de 3,75% a 4,0% no fim do ano, aponta a ferramenta FedWatch do CME Group.

As projeções estão condicionadas à trajetória da inflação em alta moderada desde 2 de abril – o “Dia da Libertação” dos EUA de um comércio injusto, segundo Trump. De maio para junho, o índice de preços ao consumidor subiu de 0,1% para 0,3%. Em 12 meses, de 2,4% para 2,7%. O núcleo da inflação, que exclui preços de alimentos e energia, subiu a 2,9%. O Itaú Unibanco calcula que essa taxa poderá avançar a 3,8%. A meta do Fed é 2%.

A perspectiva de juro menor nos EUA no fim do ano assegura ao Brasil uma (já conquistada) vantagem espetacular no retorno a investidores estrangeiros aplicados em renda fixa no país. “Juro real de 10% é imbatível”, reconhece Lima Gonçalves que alerta, porém, para o caráter oportunista desse capital.

“Isso não significa dizer, porém, que o Brasil não dispõe de condições atrativas para investimentos de longo prazo. Desde março, a inflação cai, o dólar cai, o juro curto cai por aqui e a economia vai bem. Essa trajetória é positiva, ante um mundo complicado. É fato que a perspectiva fiscal pesa, mas ela é melhor aqui do que lá fora. E o cumprimento das metas fiscais neste e no próximo ano é factível, embora com ressalvas”, observa.

Lima Gonçalves não espera surpresas para o Copom que deverá manter a Selic inalterada em 15% como vem sinalizando o comando do BC que não despreza o cenário de brutal incerteza provocada pelas políticas de Trump e os desafios fiscais presentes no Brasil a caminho de um ano eleitoral.

“Mas é inegável que o dólar em queda no mundo está nos ajudando e deve continuar ajudando no controle da inflação”, diz o professor para quem a disposição do presidente Lula de apoiar decisões do ministro Fernando Haddad contribui para um cenário positivo à frente, inclusive, no esforço de lidar com tarifa de 50% nas relações comerciais com os EUA. Se ela vingar.