No mercado de luxo, nem sempre a aquisição de um novo item configura (apenas) um arroubo consumista. Em alguns casos, trata-se de um investimento com uma boa promessa de rendimento futuro. O Report do site de compra e venda de peças de luxo de segunda mão The RealReal revelou que alguns artigos tiveram um aumento de preço de quase 400%, entre os anos 2020 e 2021.
São peças que causaram furor no mundo fashion à época de seus lançamentos e, hoje, seja pela idade ou raridade, tornaram-se objetos de desejo – principalmente de consumidores mais jovens. É o caso do tênis New Balance Collabs (+ 387%), do relógio Submariner Date, da Rolex (+ 262%) e das botas Chelsea da Bottega Veneta (+ 100%).
É uma valorização superior ao índice S&P 500, que reúne as 500 maiores empresas das bolsas americanas. Nos últimos dois anos, o índice subiu quase 50%.
De acordo com a varejista norte-americana ThredUp, o segmento deve movimentar cerca de US$ 64 bilhões até 2024, contando, inclusive, com o investimento das próprias marcas internacionais, como é o caso da Gucci que firmou parceria com o RealReal e fornece peças diretamente para o site.
Vale dizer que, segundo o report do RealReal, a Gucci é a grife campeã na preferência dos consumidores novatos, que estão iniciando a sua aventura no comércio de luxo de segunda mão. Para chegar a essas conclusões, The RealReal comparou os dados colhidos entre janeiro e novembro de 2020 com os do mesmo período de 2021.
A pesquisa se valeu do comportamento de consumo dos 24 milhões de usuários do site (entre compradores e vendedores) e com base em mais de 22 milhões de itens vendidos. De acordo com o levantamento, o que mais tem atraído consumidores para o comércio de peças usadas é a possibilidade de adquirir itens exclusivos, sofisticados e com o charmoso apelo vintage. Tudo que faça crescer os olhos de seus pares e ajude a criar um estilo pessoal marcante – principal mandamento do mundo fashion atual.
Esse comportamento, informa Rati Sahi Levesque, presidente do RealReal, foi observado entre consumidores de diferentes faixas etárias, dos chamados silents (nascidos entre 1928 e 1945) à geração Z (nascidos entre 1997 e 2012). Independentemente da faixa etária, o site constatou que, além da já citada Gucci, as grifes Louis Vuitton, Prada, Chanel, Tory Burch e Rag & Bone dividem a preferência.
Mas há sutis diferenças de comportamento: a chamada geração X (nascidos entre 1965 e 1980), que reúne 33% dos clientes do site, são os mais motivados pelo consumo consciente e sustentabilidade da moda. Já os millennials (nascidos entre 1981 e 1996), que compõem 36% dos clientes, são os que mais enxergam a atividade de compra e venda como um negócio.
Ainda compondo apenas 5% da massa de consumidores do The RealReal, a geração Z teve um crescimento em participação de 56%, entre 2020 e 2021. Consumidores millennials e da geração X são os mais atraídos pela “logomania” ostensiva da moda dos anos 1990, valorizando a exibição de grifes como Fendi, Louis Vuitton e Tiffany.
A joalheria americana vem se esforçando para deixar de ser “a joalheria da sua mãe” e lançou, recentemente, uma coleção em colaboração com a marca Supreme. As vendas no RealReal tiveram um crescimento de 23%, mas não mudou a realidade: a geração X ainda é a faixa etária que mais negocia os artigos da marca.
Outro dado interessante levantado pelo RealReal diz respeito a dinâmica dos negócios que, em sua maioria, envolve vendedores de uma determinada geração repassando os seus itens de luxo para consumidores mais jovens – supostamente novatos nesse mercado e que topam pagar valores inflacionados para compor um guarda-roupa de luxo vintage.
Esses neo-consumidores, inclusive, dão preferência a artigos difíceis de encontrar, e que estão esgotados nas lojas regulares – como o relógio Oyster Perpetual, da Rolex, ou a bolsa Birkin, da Hermès. Peças como essas atraíram 50% mais novos compradores do que os artigos “standards” dessas grifes.
A tendência é confirmada pelas empresárias Ana Piva e Melissa Moraes, idealizadoras do e-commerce Take Me Vintage – aberto há um ano e que faz parte do marketplace CJ Fashion, do shopping Cidade Jardim. “Peças esgotadas nas lojas de luxo, como a bolsa Birkin, da Hermès, ou determinados modelos de bolsas da Chanel costumam vender muito rápido”, afirma Melissa.
No ranking de peças mais procuradas na loja, aliás, as bolsas ocupam o primeiro lugar. Com as grife Chanel e Hermès puxando a fila das preferências. “Outra coisa que vende muito bem são as roupas e os acessórios com padronagem de onça”, diz Ana. Segundo a empresária, o varejo de segunda mão já não sofre com o preconceito de alguns anos atrás. “Quando a cliente vê que a peça está em perfeito estado, custando, em média, 60% do valor original, ela se anima a consumir.”
E para tornar a compra ainda mais confortável, a marca dispõe de um ponto físico no Shops Jardins, empreendimento do grupo JHSF (dono também do Cidade Jardim) na região dos Jardins, em São Paulo. “Nesse ponto, além de provar as peças, os clientes também podem ver outras novidades que não estão na loja on-line”, diz Ana Piva. A finalização da compra, no entanto, é feita no site e a cliente recebe a peça em casa.
De acordo com as empresárias, a clientela do Take Me Vintage é composta por pessoas de idades bem variadas. “É bem comum ter uma cliente que é avó e que compra peças vintage para as suas netas, porque conhece as marcas clássicas e reconhecem a qualidade”.
O Take Me Vintage também comercializa grifes nacionais, como Paula Raia, Talie NK, GIG Couture e Patrícia Vieira. Há peças também para o público masculino, um mercado ainda tímido, mas em ascensão, diz Melissa. “O principal chamariz da loja é o acesso a produtos de altíssima qualidade e exclusividade por um valor mais acessível.”