Em quatro anos, a tecnologia da startup Halter passou de “uma novidade interessante” do ecossistema de inovação agtech para se transformar em uma ferramenta bem aceita pelos produtores de leite da Nova Zelândia. Uma em cada quatro vacas usam a coleira inteligente desenvolvida pela empresa – o equivalente a 1,25 milhão de animais. And counting...

Lançado comercialmente em 2019, dois anos depois da fundação da agtech, o acessório permite o monitoramento remoto do rebanho, com mais precisão e, consequentemente, mais eficiência. Isso tudo graças a um modelo de inteligência artificial (IA), batizado cowgorithm.

O sucesso da Halter pode ser medido pelo interesse dos capitalistas de risco pela criação do engenheiro mecânico Craig Piggott. A agtech está na lista global, recém-divulgada pelo fundo global AgFunder, das 20 startups agrícolas campeãs de arrecadação em 2023.

Sediada em Auckland, a agtech fechou o ano com a entrada em caixa de um cheque de US$ 53,3 milhões. A rodada série C foi liderada pela Bessemer Venture Partners, com participação da Blackbirds Ventures, Promus Ventures e DCVC, entre outros. O total levantado até agora soma quase US$ 100 milhões, segundo a plataforma Crunchbase.

Outro sinal inequívoco da potencialidade da Halter foi a presença de seu fundador e CEO no ranking 30 Under 30. Em 2021, aos 26 anos, Piggott foi eleito um dos trinta empreendedores mais inovadores do mundo, com menos de 30 anos, pela revista americana Forbes.

Não é para menos. Equipada com GPS e mapas de calor, a coleira inteligente desenvolvida pelo jovem engenheiro acena com a promessa de uma pecuária mais precisa e sustentável.

Acessível pelo celular, o sistema desenvolvido pela Halter fornece, em tempo real, dados sobre a qualidade do pasto, a distribuição dos animais pela propriedade e a saúde de cada cabeça da criação.

Aos 29 anos, Craig Piggott garantiu para a Halter um dos 20 maiores financiamentos de 2023 do setor agtech global (Foto: Halter)
Aos 29 anos, Craig Piggott garantiu para a Halter um dos 20 maiores financiamentos de 2023 do setor agtech global (Foto: Halter)

Além disso, a ferramenta funciona também como uma espécie de “cerca virtual”. Esse conceito não é novo. Nos últimos anos, surgiram várias tecnologias para acompanhar o descolamento do rebanho, à distância. Mas, na imensa maioria dos casos, os sistemas são usados como complemento às técnicas tradicionais de pastoreio.

Em geral, os animais são conduzidos de um lado para o outro da fazenda, por funcionários a pé ou em motocicletas, frequentemente acompanhados por cães. E o rebanho é contido em uma determinada área por barreiras físicas, seja madeira, arame farpado ou fio elétrico.

Os sistemas servem de alerta para quando o rebanho ultrapassa esses limites, reduzindo riscos de fuga, furto, roubo e exposição a doenças. Pesquisadores da Faculdade de Zootecnia e Engenharia da Alimentos, da Universidade de São Paulo, na cidade paulista de Pirassununga, por exemplo, trabalham em um sistema de monitoramento remoto.

Sons e vibrações como guias

Mas a Halter vai além. Por meio de leves vibrações e sinais sonoros, a coleira inteligente guia os animais para a região do pasto mais adequada. Como cada coleira é individualizada, a IA “aprende” sobre o comportamento de cada vaca e cada boi.

As vacas e os bois, por sua vez, aprendem a reconhecer e a seguir as “dicas” da IA e, assim, ficar dentro das cercas virtuais. Se mesmo assim algum bicho permanecer fora dos limites predeterminados, um pulso de baixa energia é emitido para ele retomar a rota.

A cerca virtual tem impacto direto no bem-estar do rebanho. Sem a pressão dos deslocamentos conduzidos diretamente pelo homem, o rebanho move-se em seu ritmo natural, conforme sua hierarquia social. Está comprovado que transferência no tempo das vacas e bois reduz também a probabilidade de ocorrência de claudicação.

Popularmente conhecida como "manqueira", a doença do casco pode ter origem genética como também ser deflagrada por problemas ambientais, como o tipo de piso onde os animais são mantidos, e por deficiências alimentares.

A coleira permite também otimizar a nutrição dos animais, dividindo os rebanhos em grupos menores, conforme as necessidades de cada um. Felizes e saudáveis, as vacas e os bois produzem mais. E os criadores agradecem.

Os dados fornecidos pela startup podem ser acessados do celular (Foto: Halter)
Os dados fornecidos pela startup podem ser acessados do celular (Foto: Halter)

A tecnologia neozelandesa ainda facilita o pastoreio rotativo. Por esse sistema, a pastagem é subdividida em três ou mais piquetes, pastejados de forma intercalada, de modo a não apenas garantir como promover a saúde do solo – e, consequentemente, do meio ambiente.

Existe uma máxima entre os produtores de leite de que eles são, na verdade, produtores de pasto. Isso porque 85% da lucratividade é dada pela qualidade do pasto.

A coleira inteligente é atualmente usada por cerca de mil produtores na Nova Zelândia e na Tasmânia. A startup já instalou aproximadamente 84 mil quilômetros de cercas virtuais nos dois país, quantidade suficiente para dar duas voltas em torno da Terra.

No início do negócio, o engenheiro Piggott focou nas vacas leiteiras. No final de 2023, a empresa lançou a versão de sua tecnologia para gado de corte. Em ambos os casos, a coleira custa US$ 96 por ano e a empresa oferece uma equipe de apoio para o produtor 24 horas por dia, sete dias por semana.