Um projeto de lei do senador Efraim Filho (União-PB), em tramitação no Congresso Nacional, caminha para colocar em rota de colisão a líder do setor varejista farmacêutico, o grupo Raia Drogasil, e as principais empresas de capital aberto do segmento supermercadista, entre elas a rede Assaí e o Grupo Mateus. A discussão está em torno da autorização para implementação de farmácias no interior dos supermercados.
O sentido da disputa está na busca pela fatia de um mercado que movimentou R$ 220 bilhões em 2024, dos quais R$ 104 bilhões somente nas principais redes varejistas do País, segundo dados da Associação Brasileira de Farmácias e Drogarias (Abrafarma).
Relatório do BTG Pactual aponta que a produtividade média por metro quadrado das redes farmacêuticas é superior à de supermercados, o que, por si só, já mostra uma avenida de crescimento para as redes de alimentação.
O banco cruzou dados da Associação Brasileira de Supermercados (Abras) sobre área de venda e número de lojas com os indicadores de receita por loja do Instituto Brasileiro de Executivos do Varejo (Ibevar) e constatou que, nas lojas que vendem alimentos, a produtividade média por metro quadrado é de R$ 42 mil, contra R$ 68 mil das principais redes farmacêuticas listadas na B3.
Isso representa uma diferença acima de 60%, incluindo os dados da Raia Drogasil. Sem levar em consideração os números da principal varejista do mercado de farmácias no Brasil, essa diferença cai para 6%.
“Essa diferença sugere que entrar no varejo farmacêutico pode representar uma oportunidade para os supermercados aumentarem sua produtividade e até mesmo capturar margens maiores”, diz o documento assinado pelos analistas Luiz Guanais, Yan Cesquim e Pedro Lima.
Pela proposta do projeto de lei, será possível a instalação de farmácias completas dentro do espaço do mercado, seja por meio de marcas próprias, que poderiam ser criadas, e que podem, na prática, representar uma nova unidade de negócios, ou por meio de parcerias com redes já existentes.
Mas, para isso, é necessário que todas as condições para sejam atendidas, como registro da empresa, padrões de infraestrutura, rastreabilidade, controle de temperatura de medicamentos, além da supervisão de um farmacêutica, como já acontece atualmente nas mais de 94 mil farmácias e drogarias no País.
Apesar de o Ministério da Saúde ainda não ter dado aval definitivo ao projeto, o consenso é que há grandes chances de que a medida seja aprovada ainda em 2025. A perspectiva é de que o relator do projeto, o ex-ministro da Saúde, Humberto Costa (PT-PE), apresente o documento para votação na Comissão de Assuntos Sociais no Senado nas próximas semanas, em um dos primeiros encontros após o fim do recesso parlamentar.
Há posicionamentos públicos contrários à medida, como do Conselho Federal de Farmácia (CFF), que diz que a medida prioriza apenas a arrecadação por parte dos estabelecimentos comerciais e da indústria de medicamentos, em possível prejuízo à saúde pública. A Abrafarma também tem se mostrado contrário, enquanto a medida é amplamente defendida pela Associação Brasileira de Supermercados (Abras).
De certa forma, já há alguma conexão entre farmácias e redes supermercadistas - ainda que de forma indireta. Dados da Abras mostram que 23% das drogarias já existentes no País operam em área anexa aos mercados, especialmente o grupo Carrefour, que possui uma rede farmacêutica com o mesmo nome (nenhuma delas dentro da unidade física).
Mas há um ponto importante na efetiva implementação dessa medida, caso seja mesmo aprovada, que é o custo. A estimativa de capex para instalação de uma unidade farmacêutica completa dentro de um supermercado gira entre R$ 1,5 milhão e R$ 2 milhões. Isso significa que, dado o volume de investimento, a implementação deve se restringir às principais redes varejistas do Brasil.
Nas associadas da Abras, o volume de farmácias associadas chega a 21%, o que significa que ainda há um espaço de quase 80% para ampliação da medida. Com 424 mil lojas no País, o varejo alimentar brasileiro faturou R$ 1 trilhão em 2024, o que representa 9,12% de participação no Produto Interno Bruto (PIB).
Segundo a Abras, as 30 maiores redes contam hoje com 4,4 mil lojas. Se 80% dessas lojas adicionarem farmácias completas, a capacidade do setor poderia aumentar 3,7%. “Se essa taxa fosse aplicada às 300 maiores redes, o crescimento poderia chegar a 8%”, afirma o BTG.
Segundo o relatório, a tendência da aprovação da medida desenha um cenário mais favorável à rede Assaí do que para a Raia Drogasil. “Mantemos uma visão cautelosa sobre Raia Drogasil no curto prazo, enquanto ações como Assaí e Grupo Mateus podem continuar a se beneficiar do sentimento positivo à medida que a narrativa de expansão avança”, dizem os analistas.
No acumulado de 2025, as ações da rede farmacêutica acumulam desvalorização de 37%, enquanto os papéis de Assaí Atacadista registram alta de 76,8% no mesmo período na B3.
O market cap de Raia Drogasil é de R$ 23,4 bilhões, enquanto a rede Assaí vale R$ 13 bilhões.