A economia brasileira cresceu 1,4% no primeiro trimestre. Expansão robusta. Garantia de arrecadação idem. No segundo trimestre o Produto Interno Bruto (PIB) deverá levar um “tombo” sugerem indicadores de atividade e cálculos de especialistas. O resultado oficial será conhecido em 2 de setembro, mas as projeções de crescimento rondam 0,4%.
Nessa toada, a arrecadação encolherá. Tiago Sbardelotto, especialista em política fiscal da XP, confirmou ao NeoFeed que a desaceleração já está em curso. O ritmo de crescimento da receita líquida no ano caiu de 3,7% em janeiro para 3,1% em junho, segundo dados prévios.
“Mais importante, a receita administrada pela Receita Federal, mais relacionada ao ciclo econômico, registrou redução do crescimento de 5,6% para 4,6%. Isso demonstra que a desaceleração na arrecadação é gradual, em linha com o movimento da atividade e da inflação”, explica.
Sbardelotto, estima queda de arrecadação próxima de R$ 23 bilhões em receita líquida anualizada para cada ponto de crescimento do PIB a menos. Ele reconhece que parece pouco, mas explica que não é bem assim.
“No tempo, esse valor faz bastante diferença. Entretanto, não dá para concluir que haverá redução (na arrecadação) proporcional à queda do PIB na passagem do primeiro para o segundo trimestre. Isso, em função do efeito composição da receita alcançada. O primeiro trimestre foi muito influenciado pela agropecuária, que tem carga tributária menor”, pontua.
Dada a tendência de desaceleração da atividade ao longo do ano, que poderá piorar pelo aumento do IOF restabelecido por decisão do ministro Alexandre de Moraes do STF e efeitos do tarifaço de Trump, a evolução das receitas e despesas do governo ganha relevância. E essas contas deverão ser atualizadas na apresentação do Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias na terça-feira, 22 de julho.
Na última edição, em 22 de maio, o governo congelou R$ 31,3 bilhões de gastos. Ponto positivo que não foi comemorado em função do aumento do IOF anunciado no mesmo dia e que levou ao confronto entre Poderes.
Para Sbardelotto, o ponto central do Relatório Bimestral será quais – e quanto – o governo conseguirá incluir de novas medidas de arrecadação. “Com a decisão do STF de permitir a cobrança das alíquotas mais elevadas de IOF, o governo ganha um fôlego adicional e, embora a projeção de ganho tenha caído de R$ 20 bilhões para algo mais próximo a R$ 11 bilhões, essa perda é compensada pela MP 1303/2025, que instituiu a tributação de títulos isentos, entre outras mudanças”, afirma o economista.
“Além disso, temos o leilão de petróleo das áreas não contratadas e, possivelmente, mais dividendos de estatais. Vemos espaço para o governo reduzir o contingenciamento a zero, mas essa decisão tem um grau de discricionariedade elevado e o governo pode optar por não incluir algumas dessas medidas, sendo mais conservador. Por outro lado, vemos a necessidade de um novo bloqueio de R$ 5 bilhões por conta da dinâmica dos gastos obrigatórios, especialmente com a redução de filas de pedidos de benefícios previdenciários e assistenciais”, completa o economista da XP.
Governo deve “pedalar” para ficar bem na foto em 2026
O Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas nem chega a concorrer, em destaque, com o tarifaço de Trump, mas é relevante numa semana de reunião do Conselho Monetário Nacional e início do ressarcimento de beneficiários do INSS que sofreram descontos indevidos em suas contas – esse, sim, um evento de forte apelo midiático.
Embora com apelo popular zero por sua natureza técnica, o Relatório de Receitas e Despesas é vital para a formação de cenários e expectativas fiscais. Em 2026, o governo deverá cumprir meta de superávit primário de 0,25% do PIB – o primeiro de Lula 3.0 embora irrisório para estabilizar a dívida pública em proporção do PIB. Esse resultado seria alcançado com superávit entre 2% e 3% do PIB repetidamente.
Neste ano, a meta fiscal é zero e as contas poderão estar no vermelho em R$ 31 bilhões sem que o governo descumpra o combinado, reza o arcabouço fiscal. A “restauração” do IOF melhora as contas. Mas, ainda assim, o Tesouro acena com piora da dívida. E aponta a fatura de juros como principal causa.
Para desconforto do governo, a atividade perde fôlego e pesa contra a arrecadação. É fato que o mercado de trabalho e o crédito ainda estão resilientes. Mas o tarifaço de Trump sobre o Brasil anunciado em 9 de julho – a despeito de esforços do governo e empresários para reverter a decisão – conspira para a piora da confiança em geral. E num cenário mais crítico com os efeitos do aperto monetário sem refresco até o início de 2026.
E aqui mora o perigo de recrudescimento, por ora velado, do cabo de guerra entre o Planalto e BC. O primeiro patrocinando medidas expansionistas e eleitoreiras, especialmente agora com o presidente Lula recuperando popularidade e competitividade com potenciais concorrentes à Presidência em 2026 como indica a Pesquisa Genial/Quaest; e o segundo tentando segurar a atividade e pressões inflacionárias no freio de mão.
A Focus prevê expansão do PIB este ano em 2,23%; grandes bancos entre 2% e 2,5%. No eleitoral 2026, porém, o bicho pega. O PIB poderá crescer 1,5%. E as previsões não embutem, por ora, efeitos do tarifaço que poderá levar a um “desconto” de 0,2% a 0,6%. Pelo sim pelo não, o governo vai ter que pedalar para manter a atividade e ficar bem na foto em 2026.
Entre os vários estímulos lançados, o consignado privado está emperrado e “convida” o governo a convencer os bancos a praticarem juros mais camaradas. Em maio, a taxa média dessa operação, adotada em março, superou 55% ao ano – quase 15 pontos acima de fevereiro.
O crédito bancário convencional vem registrando expansão de quase 12% em 12 meses. Mas pesquisa da Febraban com bancos prevê desaceleração a 8,7% com inadimplência de 5% – a mais elevada desde o início de 2018. À exceção dos bancos públicos, quem vai encarar?