A controversa trajetória de Travis Kalanick, o fundador da Uber e considerado por alguns o bad boy do Vale do Silício, vai inspirar um filme e uma série de televisão.

Duas produções que retratam a queda do fundador da Uber, obrigado a deixar o cargo de CEO em 2017, após denúncias de assédio sexual, de abuso de direitos trabalhistas e de ambiente tóxico e sexista, estão em andamento.

O ator Joseph Gordon-Levitt (de “A Origem”) foi escalado para encarnar o “implacável” Kalanick na série produzida pelo Showtime, que foi definida pela copresidente de entretenimento do canal americano, Jana Winograde, como “o estudo de um caso de engenhosidade e insanidade”.

Quem escreve o drama televisivo é a dupla Brian Koppelman e David Levien, os criadores de “Billions”, série da Showtime e também exibida na Netflix sobre o mundo das finanças. Os detalhes mais sórdidos vêm do livro “Super Pumped: The Battle for Uber” (“Super Empolgado: A Batalha Pelo Uber”, na tradução literal).

A obra foi lançada em 2019 por Mike Isaac, repórter de tecnologia do jornal The New York Times. Daí o nome da série: “Super Pumped”. “Mike está na sala dos roteiristas conosco praticamente todos os dias. Arrasando”, escreveu Brian Koppelman, em sua conta do Twitter.

Isaac entrevistou centenas de funcionários e ex-funcionários da Uber para entender como o fundador perdeu a mão no comando do aplicativo de transporte que revolucionou o segmento. Criada em 2009, a Uber imediatamente virou sinônimo de app para pedir corridas.

“É um conto de advertência para fundadores e investidores de risco, emblemático do melhor e do pior do Vale do Silício”, escreveu Isaac no livro. “A saga da Uber, que é essencialmente a história de Travis Kalanick, é um conto de arrogância e excessos ocorrido durante uma revolução tecnológica, com bilhões de dólares e o futuro do transporte em jogo”, completou ele.

“Super Pumped” será quase uma “montanha-russa” no sentido de incluir os altos e baixos da Uber. Além de favorecer um ambiente de trabalho nocivo, Kalanick, que hoje está à frente da empresa de cozinhas compartilhadas CloudKitchens chegou a passar por cima de muitas legislações para emplacar o seu negócio, transformando qualquer carro em um “táxi”.

Paralelamente à série, a produtora independente Good Universe desenvolve projeto de longa-metragem semelhante, desenterrando o que levou à derrocada de Kalanick. O combustível para o filme, intitulado “Disruptors” (“Disruptores”), é o caso de assédio sexual e de discriminação vivenciado por Susan Fowler, ex-engenheira da Uber.

Susan foi a primeira funcionária a denunciar o comportamento abusivo que predominava na empresa, onde atuou de novembro de 2015 a dezembro de 2016. Inicialmente, ela fez as acusações que incluíam assédio do chefe sofrido logo no primeiro dia de trabalho, em seu blog, em fevereiro de 2017.

Uma das consequências, quando a postagem se tornou viral, lida por mais de seis milhões de pessoas, foi a abertura de uma investigação interna, o que resultou em mais de 20 demissões na Uber. Foi assim que Kalanick acabou demitido da empresa pelos principais acionistas.

Mais tarde, o material do blog rendeu um livro. “Whistleblower: My Journey to Silicon Valley and Fight For Justice At Uber” (“Informante: Minha Jornada Até o Vale do Silício e a Luta por Justiça na Uber”) foi publicado em março do ano passado.

Nele, a autora conta como foi trabalhar na empresa que teve ascensão meteórica e, ao mesmo tempo, instaurou aquela cultura tóxica. “Sofri assédio sexual e intimidação na Uber. Lutei até esgotar todas as opções, exceto uma: a de deixar a empresa e ir a público com minha história”, escreveu Susan, na publicação.

Na obra, ela também contou que chegou a receber injustas avaliações negativas de um chefe, que estava determinado em impedir a sua promoção, só para mantê-la em sua equipe. Outro episódio diz respeito a uma recompensa dada a 120 engenheiros homens. Enquanto eles ganharam da empresa jaquetas de couro oficiais, as seis engenheiras mulheres foram ignoradas.

Eleita uma das quatro personalidades de 2017, pela revista Time, por ter quebrado o silêncio, ao lado da cantora Taylor Swift e da atriz Ashley Judd, a engenheira vendeu no mesmo ano os direitos de sua história à produtora Good Universe.

A roteirista Allison Schroeder, do drama histórico “Estrelas Além o Tempo”, foi encarregada de escrever o filme. Uma das produtoras responsáveis por “Disruptors” é Kristin Burr, que acabou de realizar “Cruella”, para a Disney.

Não há ainda previsão de estreia de nenhuma das produções. Nem nos EUA. No caso de “Super Pumped”, a proposta do canal Showtime é explorar, a cada nova temporada, outras histórias que impactaram igualmente o mundo dos negócios e, de preferência, tiveram alguma influência cultural. E, se o percurso da empresa apresentar reviravoltas polêmicas, como o da Uber, melhor.