A verticalização tem sido a protagonista no enredo intenso de M&As do mercado brasileiro de saúde. Nesse contexto, o avanço dos hospitais no espaço das operadoras de saúde – e vice-versa - vem se destacando, por meio de acordos e nomes como Rede D’Or e SulAmérica, e Hapvida e NotreDame Intermédica.

Um dos atores tradicionais do setor, o Hospital Israelita Albert Einstein, mantido pela Sociedade Beneficente Israelita Albert Einstein, não tem o mesmo poder de fogo que seus pares, listados e mais capitalizados. Mas, nos bastidores, está escrevendo um script para não ser um mero coadjuvante nessa disputa.

O fio condutor é a estruturação de um programa amplo de cuidados integrados de saúde e, o palco, o mercado de saúde corporativa. Esse movimento é mais um capítulo da ambição do Einstein em buscar novas receitas em outros elos da cadeia da saúde, além do seu negócio tradicional de hospitais. "Estamos crescendo na área de clínicas corporativas, dentro das empresas", diz ao NeoFeed o médico Sidney Klajner, presidente da Sociedade Beneficente Israelita Albert Einstein.

“Não está na estratégia do Einstein ter a sua própria operadora de planos de saúde e se tornar verticalizado”, diz Eliézer Silva, diretor-superintendente do sistema de saúde Einstein, ao NeoFeed. “Mas estamos evoluindo para outro modelo.”

Esse modelo está em gestação há cerca de quatro anos e deve ganhar vida, de fato, no segundo semestre de 2023. Nele, o Einstein quer cobrir da atenção primária à terciária. Sob um viés de prevenção, a ideia é aprimorar o atendimento e reduzir gastos desnecessários na cadeia. Sem que, para isso, precise investir grandes somas.

O plano é unir seus ativos, como hospitais e clínicas, a uma rede de parceiros que pode envolver, inclusive, outros hospitais. Essa oferta estará necessariamente atrelada a operadoras de planos de saúde, até mesmo para aproveitar essa força comercial e o fato delas serem mais um atalho para chegar às empresas.

“Nós adquirimos essa capacidade de coordenar uma rede, mas não para substituir um plano de saúde”, afirma Silva. “A ideia é que o Einstein orquestre todo esse cuidado integrado e seja um gestor da saúde do paciente. É para esse modelo mais holístico que estamos migrando.”

Eliézer Silva, diretor-superintendente do sistema de saúde Einstein

Essa proposta tem origem no Cuidar, programa voltado aos funcionários do Einstein. Ele foi criado há seis anos e reduziu os custos da rede nessa linha de benefícios de 15%, por profissional, para uma faixa de 0,5% a 5%. Depois de testar e amadurecer o formato, já existem ensaios desse conceito com parceiros como a Qsaúde, healthtech criada por José Seripieri Junior, fundador da Qualicorp.

Todos os planos da Qsaúde dão acesso a médicos de família do Einstein. Já as ofertas intermediárias adicionam os hospitais e a rede de medicina diagnóstica do grupo. Nas opções premium, todo o cuidado está dentro do ambiente Einstein, o que inclui a rede credenciada da startup.

“Estamos avançando nesse modelo com empresas que nasceram no digital, como a Alice”, diz Silva. “E as operadoras mais tradicionais também começaram a nos procurar para criar um produto dentro dessa tese.”

O projeto integra a estratégia de diversificação de receitas do Einstein, que inclui iniciativas, por exemplo, nas frentes de Consultoria e de Inovação, com a Eretz.bio, incubadora de startups de saúde; e o Health Innovation Tech Center, que faz a gestão de propriedade intelectual do grupo e de outras empresas, além de desenvolver tecnologias com outras companhias.

O braço de ensino e pesquisa é outro exemplo. Um dos passos na área foi um aporte de R$ 700 milhões em um novo centro em São Paulo, que abriga cursos de medicina e fisioterapia da faculdade do Einstein, além de frentes como o Centro de Medicina Personalizada e laboratórios que desenvolvem pesquisas para a iniciativa privada.

Clínicas in-company

O programa de cuidados integrados, por sua vez, está sob o guarda-chuva da diretoria de Sistema de Saúde do Einstein. A frente de soluções corporativas de saúde, que também integra a área, responde por cerca de 6% do negócio do Einstein, que reportou uma receita líquida de R$ 4 bilhões em 2021, ante R$ 2,8 bilhões em 2020.

Com cerca de 100 clientes, a unidade tem serviços como vacinação e exames in company; telemedicina; criação de projetos em áreas como prevenção, bem-estar, gestão de crônicos e saúde mental; análise de dados; avaliações de saúde populacional e programas customizados para as companhias.

“Em telemedicina temos 2 milhões de usuários”, diz Silva, que dá uma medida sobre como essas ofertas ampliam o alcance do grupo. “Temos mais pessoas nessa solução do que o volume de clientes que acessam todo o sistema do Einstein.”

Outro destaque são as clínicas instaladas em empresas. A primeira veio no fim de 2018, nas dependências do banco Safra. Hoje, dez companhias investem nesse modelo, que cobre mais de 36 mil funcionários e pode incluir acesso a outros serviços do portfólio.

As clínicas prestam atendimentos de baixa complexidade e de atenção primária, com médico de família, enfermeiros e apoiadores de cuidados. Essa carteira de clientes tem nomes como Natura, Votorantim e Vivo.

Boa parte das clínicas está em São Paulo. Mas já existem unidades em outras cidades e estados. É o caso da Natura, que tem estruturas em três operações. Uma delas, na cidade de Benevides, no Pará. E o mapa do Einstein cresceu recentemente, com clínicas no SBT e no Citi.

“O desejo de um atendimento continuado aos nossos funcionários já existia, mas a pandemia evidenciou ainda mais o valor dessa iniciativa”, afirma Guilherme Mancin, head de recursos humanos do Citi Brasil, que inaugurou sua clínica em setembro.

Marcelo Marangon (à esq.), CEO do Citi Brasil, e Sidney Klajner, presidente da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, na inauguração da clínica Einstein Citi

Com a instalação, disponível para os cerca de 2 mil funcionários do banco, o executivo entende que o Citi passa a ter mais recursos para consolidar um modelo de saúde preventivo, capaz de identificar casos críticos em estágios iniciais e de atacar frentes como saúde física e mental.

“Construímos um lugar de acompanhamento de saúde e não de doenças”, diz Mancin. Ele destaca ainda o acesso 24x7 à plataforma Einstein Conecta, de telemedicina. “No médio e longo prazo, queremos ver maior uso da Clínica Einstein Citi e menor uso de atendimento não emergenciais em hospitais.”

O Einstein não é o único a investir nesse formato e na busca por mais receitas no segmento corporativo. Além de um leque de serviços, o Sírio-Libanês, por exemplo, conta com doze clínicas instaladas em empresas como Itaú Unibanco e Santander.

Outras companhias de diferentes elos da cadeia do setor estão reforçando seus investimentos nesse espaço, também sob a ótica de saúde integrada e de caráter mais preventivo. A lista inclui nomes como Rede D’Or e Dasa.