Quando esteve em Nova York sendo anfitrião do Brazil Week, evento que o Citi promoveu no início deste mês, reunindo investidores e clientes para reuniões e discussões a respeito dos rumos do País, o presidente das operações do banco americano no Brasil, Marcelo Marangon, constatou que, de fato, o mercado continua em “compasso de espera”.

Em suas interações, o que notou é que todos estavam esperando que a agenda positiva do lado econômico – leia-se, reformas fiscais – começasse a andar para que as empresas passassem a avaliar a possibilidade de emitir ações ou dívidas no mercado de capitais.

A situação acabou frustrando as expectativas do Citi, que imaginava um começo de ano mais movimentado. Mas duas atividades que são consideradas fortalezas por Maragon podem “salvar a lavoura”. Ou melhor, o ano.

Em 2023, o Citi tem observado um fluxo maior das chamadas transações recorrentes, como gestão de liquidez, câmbio, custódia, derivativos, capital de giro e financiamento a importação e exportação. A outra é o crédito, apesar do cenário nebuloso desde o escândalo do caso Americanas.

"Nós temos um negócio bastante resiliente no Brasil, diversificado não só em um tipo de cliente, mas em tipo de produto”, afirma o presidente do Citi Brasil ao NeoFeed. "Apesar do ano mais desafiador em operações episódicas [mercado de capitais], continuamos crescendo em todas as linhas de negócios recorrentes",

Desde que vendeu suas operações de varejo no Brasil ao Itaú Unibanco em 2017, por R$ 710 milhões, o Citi vem dando destaque ao atendimento de clientes corporativos no Brasil, principalmente grandes empresas locais e subsidiárias de multinacionais, com faturamento anual entre R$ 500 milhões e R$ 5 bilhões.

Este perfil, por sinal, ajudou nos resultados do Citi Brasil no ano passado. O banco encerrou 2022 com um lucro líquido de R$ 2,6 bilhões, um crescimento de 53% em relação a 2021, com o retorno sobre o patrimônio líquido (ROE) atingindo 22,4%, acima dos 16% do ano anterior.

Ainda que não estejam imunes à desaceleração da economia, o porte dessas empresas faz com que a demanda por serviços recorrentes não seja completamente prejudicada, segundo Marangon. Isso ajuda a instituição a praticar o cross-selling de produtos. A carteira de depósitos, por exemplo, encerrou o ano passado com R$ 61 bilhões, crescimento de 30%.

Dentro desse leque de produtos, um dos destaques foi a área de câmbio, que liderou o ranking de operações de câmbio a clientes em 2022, que desconsidera operações interbancárias. O montante somou US$ 263,4 bilhões, alta de 6,7%. E a expectativa é continuar forte nesta frente.

Marangon entende também que os clientes do Citi devem manter a demanda por crédito em 2023. Mesmo com a crise de Americanas, a expectativa é de uma expansão dos empréstimos neste ano, pelo fato de o banco atender grandes empresas, que utilizam momentos de crise para fortalecer suas operações.

"Temos crescido nossa carteira de crédito para apoiar nossos clientes neste momento de hiato do mercado de capitais", afirma Marangon. "Ou elas se posicionam através de M&A, fazendo aquisições e consolidações em alguns setores, ou (se posicionam) em crescimento orgânico, entendendo que é hora de acelerar investimentos para ganhar participação."

Em conversa com jornalistas em Nova York, em meio ao Brazil Week, Marangon disse que a expectativa era de que a carteira de crédito possa crescer low double digits, possivelmente ficando mais perto de 10%.

No ano passado, de acordo com a divulgação dos resultados do Citi, a carteira de crédito expandida, outra métrica utilizada pelo banco que inclui debêntures, avançou 5%, para R$ 45 bilhões, com a margem financeira contábil aumentando 67% em relação a 2021, a R$ 5,3 bilhões.

"(Americanas) Foi um evento bastante específico, que afetou o nome em si e a indústria correlacionada, mas não vimos nenhuma preocupação, não tivemos nenhum efeito ou consequência correlata sobre o nosso portfólio", diz Marangon.

O presidente do Citi Brasil diz ainda que a expansão do crédito não traz risco de aumento da inadimplência, justamente por conta do portfólio de clientes, diferente dos principais nomes do País, por conta da exposição ao varejo. No ano passado, a provisão para devedores duvidosos (PDD) do Citi Brasil recuou 1%, a R$ 254 milhões.

Mercado de capitais

Enquanto o Citi Brasil vê boas perspectivas para os chamados negócios recorrentes e o crédito, o banco entende que somente uma estabilização do cenário macroeconômico poderá reaquecer o mercado de capitais.

Segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), as empresas brasileiras levantaram R$ 66 bilhões no mercado de capitais ao longo do primeiro trimestre de 2023, recuo de 38,2% em relação ao registrado no mesmo período do ano passado.

Até abril, o Citi esteve presente na originação de quatro emissões de renda fixa e esteve envolvido no follow-on de R$ 4 bilhões do Assaí, ocorrido em março. No ano passado, dados da Anbima apontam que o Citi ficou em 11º no ranking do número de operações de renda fixa, com 17, e em sétimo em renda variável, com seis operações.

Segundo Marangon, o número de emissões pode acelerar à medida que o governo conseguir avançar as reformas, destacando que muitos clientes do banco estão preparados para acessar o mercado quando as condições permitirem.

"Com o novo arcabouço fiscal sendo aprovado, as medidas tributárias sendo endereçadas e discutidas adequadamente com o Congresso, ainda que a reforma não seja tão profunda quanto a desejada, mas na direção correta, isso vai destravar um sentimento positivo e isso deve abrir oportunidades para novas emissões", afirma Marangon.

Para Fernando Siqueira, head de research da Guide Investimentos, reformas fiscais são apenas uma parte para a retomada das operações de renda variável no mercado de capitais, ainda que sejam importantes por abrirem caminho para que os juros comecem a cair.

"Com a queda dos juros, que precisa ser consistente, deve começar a ter um fluxo maior de recursos, os fundos devem começar a captar mais", afirma. "Só que leva tempo para as coisas acontecerem, os valuations ainda estão muito baixos, ainda não é um ambiente propício para as empresas venderem ações."