Até mesmo Mohamed El-Erian está perdido com a direção da economia global. Em sua palestra na noite de sexta-feira, 30 de agosto, na Expert XP, o economista, ex-CEO e co-executivo chefe de investimentos da gestora multinacional Pimco, começou dizendo que parece que “estamos em um jogo de pingue-pongue” com a alta volatilidade da economia.

Na sequência, ele observou que o mais complicado é o fato de que a maior economia do mundo, que deveria ser a mais previsível, os Estados Unidos, não está nada previsível. E isso está acontecendo por falhas dos Bancos Centrais (BCs).

“Há muita incerteza. Falta uma âncora técnica, a orientação política não está clara. E estamos nessa situação porque os BCs tiveram o grande erro em 2021 de olhar a inflação como algo transitório, com todos os sinais de que não era", disse. "Houve falha de políticas, previsões e de comunicações. E, agora, aos poucos, os BCs estão se recuperando desses erros.”

Mas uma coisa para ele está muito clara: o mundo mudou e não haverá mais abundância de liquidez. E a taxa de juros neutra será maior do que nos últimos anos no ambiente de quantitative easing.

“Se pensarmos nas taxas dos EUA, estima-se que a taxa neutra deve ficar entre 2,7% e 4%. Não será ao quase zero que foi antes. Na minha opinião, ela está mais para 4%, mas o mercado acredita que é 3%”, disse ele.

Sua expectativa de juros mais elevados é porque o mundo está com muito mais pressão inflacionária do que desinflacionária. E, para ele, os próximos cinco anos seguirão dessa maneira até se regular - "culpa" do mundo que está se desglobalizando.

Um exemplo são as políticas de nearshoring, que escolhem as relações comerciais mais de acordo com a geopolítica do que pela eficiência de preço. Outra questão é que o mundo estava muito focado em eficiência e esqueceu da resiliência, o que a pandemia mostrou que foi um grande erro.

Hoje, as empresas estão gastando muito mais com segurança de informações e de processos e seguros, e tudo isso é uma elevação de custos. Além disso, a economia como um todo está sendo mais regulada, aumentando tarifas.

Em um ambiente como esse, uma meta de inflação de 2% ao ano, como a do Federal Reserve (Fed), será impossível. Isso não significa que a meta mudará, mas, sim, que não tentarão chegar a ela tão rapidamente.

Outra questão muito abordada foi a queda de produtividade com uma restrição maior à imigração nos países desenvolvidos. Ele ressaltou, no entanto, que a tecnologia, especialmente com o uso de inteligência artificial, pode vir a contornar esse desafio.

Já no que diz respeito às consequências para esse desenvolvimento, o economista é enfático em dizer que não se pode errar de novo e não distribuir bem esse novo ativo.

“Existe todo um discurso de que a inovação ajudará a todos, mas isso não é verdade. Em geral, as inovações geram mais desigualdade de oportunidades, que geram mais desigualdade de renda. Que, por conseguinte, geram problemas econômicos e sociais. É preciso estar atento a distribuir bem as novas tecnologias”, disse El-Erian.

Para o economista, toda disrupção tecnológica tem a regra de 80% por 20%: 80% são ganhos positivos, mas 20% são ruins. Em um pensamento americano se “abraça” os 80% e ignora os 20%, enquanto os reguladores europeus ignoram os 80% para se preocuparem com os 20%. Para ele, é preciso olhar para o meio termo, mas isso só é possível unindo o público e o privado.

O Brasil precisa acreditar no seu potencial

Países emergentes precisam enfrentar esse dilema das consequências das novas tecnologias ao mesmo tempo em que tentam resolver os problemas básicos. Mas, para o economista, isso é possível, e principalmente no Brasil, apesar de o brasileiro não acreditar.

“Eu venho ao Brasil desde os anos 1980 e já vi todo o tipo de crise aqui. Mas é interessante ver como o brasileiro sempre vê o copo meio vazio. Vocês são muito pessimistas com vocês e otimistas demais com o resto do mundo”, disse.

Para El-Erian, se alguém colocasse só as características de Índia e Brasil, sem citar os nomes, o brasileiro votaria no Brasil. O País tem matéria prima, bom posicionamento de segurança alimentar, energia sustentável e um grande mercado doméstico. Todos os grandes pontos em questão das discussões globais do futuro. Mas se os nomes fossem revelados, o brasileiro não votaria apenas por saber que é o Brasil.

“A tecnologia é capaz de resolver o grande problema de vocês hoje, que é a produtividade. Mas é preciso acreditar nesse potencial e ter políticas públicas e privadas de adoção correta disso”, disse.

Ele, por outro lado, é otimista com o Brasil e afirma que há muitos investidores só esperando um sinal para investirem pesado. E acredita que, quando o País liberar o seu potencial pleno, atrairá muito capital. O caminho não é fácil, mas não é tão tenebroso e impossível.

“Migrar da renda média para a alta renda é muito difícil. Apenas cinco países conseguiram isso, e nenhum deles era grande e complexo como Brasil, Índia e China. E isso porque essa transição exige mudanças profundas na economia. Mas, se o Brasil quiser, mudará”, afirmou.