Após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, surpreender com o anúncio de uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros na quarta-feira, 9 de julho, analistas dos bancos de investimentos passaram a noite em um “pente fino” sobre as empresas brasileiras listadas na bolsa de valores para entender os efeitos da medida em cada setor e nome do mercado.

Muitos dos relatórios enviados aos clientes entre ontem e quinta-feira, 10 de julho, apontam que três grandes empresas da Bolsa devem sentir duramente o protecionismo americano, dada a exposição que tem ao país: Embraer, Suzano e WEG.

O prejuízo que a fabricante de aeronaves pode enfrentar foi um call praticamente consensual. A avaliação faz as ações da Embraer registrarem a maior queda do dia no Ibovespa – por volta do meio-dia, as ações caíam 7,75%, aos R$ 72,15. No ano, os papéis acumulam alta de 24,9% e o valor de mercado soma R$ 53,5 bilhões.

Se Trump não recuar, como já fez com outros anúncios de tarifas, a Embraer tem muito a perder, considerando que quase 60% da receita vem da América do Norte, com cerca de três quartos expostos às tarifas, segundo o Itaú BBA.

No primeiro trimestre, por conta do anúncio de uma tarifa de 10% para produtos brasileiros, divulgada no começo de abril, no infame "Liberation Day", a Embraer divulgou uma projeção apontando um impacto de 0,9 ponto percentual em sua margem operacional.

Com base nessa projeção, e levando em conta a tarifa de 50% anunciada ontem, os analistas calculam um impacto adicional de US$ 150 milhões nos resultados no segundo semestre, caso essa cobrança extra siga em frente.

Já o Bradesco BBI estima um efeito negativo de US$ 220 milhões. Em comentário enviado a clientes, os analistas dizem que as operações da Embraer nos Estados Unidos podem ajudar a mitigar a situação, ainda que não seja uma certeza, diante dos poucos detalhes na carta de Trump ao governo brasileiro.

“No segmento de aviação executiva, os jatos Phenom são produzidos nos Estados Unidos, enquanto os jatos Praetor têm a fase final de montagem no país”, diz trecho do comentário. “Em nossa opinião, a fábrica nos Estados Unidos poderia ajudar a mitigar parte do impacto, já que o anúncio afirma que as empresas que produzem nos Estados Unidos não devem ter tarifas.”

Os analistas do Itaú BBA afirmam que a Embraer pode sofrer com queda de receita, uma vez que terá de reajustar os preços para cima dos aviões comerciais em até 25% para mitigar a situação. A medida pode resultar em cancelamento de pedidos e adiamento de entregas.

“A Embraer pode perder Roic nos Estados Unidos se enfrentar custos mais altos sem repasses correspondentes, ou pode perder potencial de crescimento caso as tarifas sejam totalmente repassadas”, diz trecho do relatório.

O efeito WEG

A WEG é outra companhia bastante exposta ao mercado americano e que deve sentir as consequências da forte alta das tarifas de importação – o país responde por 20% a 25% das vendas totais da empresa, de acordo com o BTG Pactual.

“Mais importante, ele se tornou uma fonte fundamental de crescimento e lucratividade [para a WEG] nos últimos anos, impulsionada principalmente pela expansão do setor de infraestrutura de energia, incluindo transformadores”, diz trecho do relatório.

Mesmo com operações nos Estados Unidos e no México, a WEG exporta quase 30% do que vende aos americanos do Brasil. E isso pode fazer com que a empresa perca espaço no mercado de transformadores, produto que os Estados Unidos pouco produzem – quase 80% da demanda local é atendida por empresas de fora.

“Se a tarifa extra for aplicada apenas ao Brasil, outros países exportadores, como Coreia do Sul, México e Índia, poderão ganhar participação de mercado”, diz trecho do relatório.

Os analistas do Banco Safra destacam um efeito indireto para a WEG, vindo da decisão de Trump de elevar as tarifas sobre o cobre. Segundo eles, a commodity deve pesar sobre a rentabilidade da empresa, na linha de custos, considerando sua importância para equipamentos elétricos.

No entanto, eles avaliam que a WEG pode mitigar a situação investindo em suas operações americanas. “Isso inclui expandir sua capacidade de produção nos Estados Unidos (um processo já em andamento) e alavancar a capacidade ociosa da Regal (atualmente operando em cerca de 50%) para transferir parte de sua produção do Brasil”, diz trecho do relatório.

As ações da WEG recuam 0,97%, a R$ 39,72. No ano, acumulam queda de 24,6%, levando o valor de mercado a R$ 166,7 bilhões.

O papel da Suzano

No segmento de commodities, a Suzano é a principal prejudicada, pelo fato de 19% das vendas totais da companhia serem nos Estados Unidos, de acordo com cálculos do Goldman Sachs.

A questão é se a companhia tem flexibilidade para lidar com a situação. Os analistas afirmam que será muito difícil redirecionar um volume tão alto para outros mercados, exigindo um esforço comercial e logístico “significativo”.

“Além disso, entendemos que a empresa mantém contratos de longo prazo com grandes compradores na região que também não poderiam ser facilmente alterados”, diz trecho do relatório.

Para o Citi, a Suzano deve sentir “fricção” no curto prazo, mas a companhia possui um nível de custo muito baixo, além de ter escala global e flexibilidade. No médio prazo, a empresa deve conseguir realocar volumes para outras regiões, especialmente a Europa.

“As tarifas devem causar fricções no curto prazo, mas não devem ter efeito material nos fundamentos da empresa”, diz trecho do relatório.

Os analistas do Citi apontam ainda que a desvalorização do Real frente ao dólar pode ter efeitos positivos para os resultados, uma vez que 80% da receita está exposta na moeda americana.

As ações da Suzano registram alta de 0,22%, a R$ 50,11. Os papéis acumulam queda de 19,7% no ano, levando o valor de mercado a R$ 63,3 bilhões.