Com inflação acima de 60% ao ano, o peso em mínimas históricas, dólar resvalando em 350 pesos, o governo argentino está procurando aliviar a pressão com um “dólar turismo para estrangeiros”, 14ª modalidade de câmbio criada no país, e alguma abertura às importações.

Além disso, a ministra da Economia da Argentina, Silvina Batakis, iniciou também seu périplo em Washington e visita o Fundo Monetário Internacional (FMI) nesta segunda-feira, 25 de julho – praticamente três semanas após tomar posse.

A ministra argentina e a diretora-gerente do FMI, Kristalina Georgieva, já falaram por telefone. Em março deste ano, o governo argentino fechou um acordo com o Fundo Monetário para refinanciar sua dívida com o organismo de US$ 45 bilhões tornando-se o maior devedor do organismo.

Alçada ao cargo após a renúncia de Martín Guzmán por desentendimento com a coalizão peronista em torno da vice-presidente Cristina Kirchner, que entrou em conflito aberto com o ex-ministro por não aceitar a política fiscal em vigor, Batakis, que afirmou na semana passada que a Argentina cumprirá o acordo com o FMI, tem pela frente uma pesada agenda na capital americana.

A ministra encontra-se com representantes do Departamento do Tesouro dos EUA e Banco Mundial. Na terça-feira, 26 de julho, receberá investidores e analistas na Embaixada argentina, participará de um evento promovido pela Câmara de Comércio dos EUA e terá reuniões bilaterais com executivos da General Motors, Amazon e Google.

Não vai faltar assunto. A tensão política e econômica que paira sobre a Argentina é de tal ordem que o BTG Pactual alerta, em relatório assinado por Alejo Costa e Sofia Ordonez, que a agitação social no país surgirá gradualmente no fim de agosto ou início de setembro, alimentada pela inflação, escassez e falta de reajustes salariais. A maioria das categorias teria reajustes entre abril e julho.

“Os salários cairão em termos reais, quase simultaneamente com as novas tarifas de serviços públicos, com muitos consumidores sendo provavelmente excluídos de subsídios por receberem contas de energia mais elevadas. A agitação e as exigências irão se generalizar e tumultos, pilhagem e manifestações são prováveis”, alerta o relatório, que aponta, como próximo alvo do kirchneirismo, os agricultores.

Segundo o BTG, o governo pressiona os agricultores por suposta retenção na venda de grãos estimada em US$ 20 bilhões. Os analistas avaliam que o cálculo é exagerado, que esse volume está mais próximo de US$ 12 bilhões.

Parte da ala kirchneirista exige repressão e regulamentação para forçar agricultores a venderem seus produtos [uma forma de atrair dólares e recompor reservas internacionais], enquanto outra ala analisa o potencial de múltiplas taxas de câmbio, na tentativa de autorizar a prática de um câmbio mais elevado para os agricultores.

O BTG pondera que uma taxa de câmbio mais elevada para os agricultores significaria uma desvalorização adicional do peso, embora concentrada sobre os cereais, mas que teria impacto inflacionário e provocaria uma grande expansão monetária, porque o BC da Argentina compraria dólares por uma taxa mais elevada.

Os analistas do BTG Pactual afirmam que as medidas até agora tomadas pelo governo argentino são insuficientes para enviar um sinal positivo aos mercados. Para isso, diz o relatório, um governo com credibilidade teria de tomar medidas mais rígidas e a administração Fernandez, “politicamente fraca, é inapta a tomar”. E o resultado, portanto, é mais do mesmo: algum aperfeiçoamento das contas fiscais e da política monetária e cambial e repressão financeira.

Na semana passada, as empresas foram forçadas a vender recibos de depósitos de ações americanas e tiveram limitadas algumas operações em dólares, sob a ameaça de exclusão do mercado oficial de câmbio durante 90 dias.

O BTG lembra que a reunião da ministra argentina da Economia com o FMI pode trazer algumas notícias em torno de um ajuste do acordo que o país mantém com o Fundo, “mas o sentimento generalizado é de que o governo não está disposto a fazer as reformas necessárias para evitar uma crise, constrangido pelo seu dogmatismo eleitoral”.