O alvo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, são os chineses. Mas o tiro pode sair pela culatra.

A Apple é a mais recente empresa a se juntar ao coro de que aumentar as tarifas de importação sobre produtos chineses pode, na verdade, prejudicar as próprias companhias americanas.

Comandada pelo executivo Tim Cook, a Apple escreveu uma carta para Robert Lighthizer, o representante comercial dos Estados Unidos, argumentando que se as tarifas propostas se efetivarem elas terão impacto em quase todos os produtos da empresa, como iPhone, MackBook, AirPods e Apple Watch.

Na carta, a Apple vai além e diz que a medida vai afetar o número de empregados da companhia nos Estados Unidos e sua habilidade de contribuir para a economia americana.

Na semana passada, mais de 600 companhias e associações industriais, incluindo Walmart, Costco, Target, Gap e Levi Strauss, escreveram carta para a Casa Branca, pedindo para Trump remover impostos sobre a China e acabar com a atual guerra comercial.

As empresas alegam que o aumento das tarifas vai prejudicar a economia americana, levar o desemprego aos Estados Unidos e aumentar os preços aos consumidores.

No mês passado, o governo Trump elevou tarifas de 10% a 25% sobre US$ 200 bilhões em produtos chineses, tais como malas, colchões, bolsas, bicicletas, aspiradores de pó e condicionadores de ar. Além disso, ameaçou impor uma tarifa adicional sobre outros US$ 300 bilhões de bens importados, incluindo, dessa vez, computadores, smartphones e televisões.

O aumenta de tarifas afetaria diversos fabricantes de tecnologia americanos, como Dell, HP, Intel e Microsoft, que também se posicionam contra a medida. “O aumento de tarifas vai prejudicar as empresas de tecnologia americanas, dificultando suas habilidades de inovar e de competir no mercado global”, escreveram também as companhias para Robert Lighthizer, o representante comercial dos Estados Unidos.

A guerra comercial dos Estados Unidos com a China já está impactando o balanço das empresas. A Apple e Intel reduziram suas previsões de venda no primeiro trimestre de 2019, citando vendas menores na China.

A montadora General Motors previu US$ 1 bilhão em custos adicionais neste ano em função das tarifas e matérias-primas. A Ford, por sua vez, diz que gastou US$ 750 milhões a mais, em 2018, por conta da alta de importação de alguns produtos.

Por conta desse impasse, a Apple já está considerando opções para migrar sua fabricação para fora da China, publicou o jornal asiático Nikkei, baseado em Taipei.

A empresa da maçã está pedindo para que seus fornecedores avaliam as implicações de custo de mudar de 15% a 30% sua capacidade fabril da China para outros países do Sudoeste asiático.

“É preciso entender essa guerra comercial no contexto da eleição para presidente dos Estados Unidos, que acontece em 2020”, diz Marcelo Coutinho, coordenador do mestrado profissional da FGV, em São Paulo. “Ele está agindo para agradar a sua base política.”

As empresas alegam que o aumento das tarifas vai prejudicar a economia americana, levar o desemprego aos Estados Unidos e aumentar os preços aos consumidores

O cálculo de Trump, acredita Coutinho, é fácil de ser compreendido. “Os dividendos políticos superam os prejuízos econômicos que essas medidas podem provocar na cadeia de produção americana”, afirma o professor.

Com uma taxa de desemprego de 3,6% em abril, o índice mais baixo desde dezembro de 1969, o impacto de uma guerra comercial na economia americana não parece ser uma preocupação de Trump.

A reclamação das empresas, de fato, não surtiu efeito. Nesta segunda-feira, 24 de junho, o jornal americano The Wall Street Journal publicou que os Estados Unidos estão considerando adotar uma medida para que os equipamentos de tecnologia 5G, que serão usados nos Estados Unidos, sejam fabricados fora da China.

A companhia mais afetada é a chinesa Huawei, uma das principais fornecedoras dessa tecnologia no mundo. A empresa já avisou que esperar uma redução de US$ 30 bilhões em seu faturamento, nos próximos dois anos, por conta das restrições impostas pelo governo americano.

Mas a medida de Trump, se levada adiante, não impactará apenas a Huawei. A finlandesa Nokia e a sueca Ericsson, que também atuam com tecnologia 5G, fabricam na China e teriam de sair de lá, caso queiram fornecer para as empresas de telefonia americanas.

“É uma guerra fria tecnológica”, afirma Ivair Rodrigues, diretor de pesquisas da consultoria IT Data. “As empresas chinesas não copiam mais tecnologia, como no passado, elas são bastante inovadoras e Trump está preocupado com isso.”

A Apple já está considerando opções para migrar sua fabricação para fora da China

Na semana passada, o Departamento de Comércio dos Estados Unidos impôs restrições para a importação de componentes para empresas de supercomputadores chinesas. Essas poderosas máquinas são usadas para o desenvolvimento de armas nucleares, sistemas de encriptação e de defesa.

Trump e o presidente chinês, Xi Jinping, vão conversar nesta semana durante um encontro do G20, que acontece no Japão. O Fundo Monetário Internacional (FMI) advertiu neste mês que esta guerra comercial poderá reduzir em 0,5% o crescimento da economia mundial em 2020, o equivalente a US$ 455 bilhões.

Os especialistas alegam que é difícil definir quando começa uma guerra comercial. Mas sabem que ela nunca acaba bem.

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