Em janeiro deste ano, a MaxMilhas anunciou a fusão com a 123 Milhas, criando uma das maiores empresas de turismo online no Brasil, em negócio revelado com exclusividade pelo NeoFeed. No mesmo mês, a Nuvini, holding de Pierre Schurmann que abriu o capital na Nasdaq, fez também sua sétima aquisição: a da Smart NX. E, em fevereiro, o PicPay entrou em crédito consignado com a compra da BX Blue.
Por trás desses negócios está a IGC Partners, uma casa de M&A com mais de 25 anos de operação, mas que tem ficado longe dos holofotes. Atuando de forma discreta, no entanto, ela se tornou uma das principais empresas de fusões e aquisições do Brasil.
Segundo o ranking organizado pela empresa de informação corporativa TTR Data, a IGC Partners foi a companhia que mais transações realizou nos últimos 36 meses no Brasil, quando se considera apenas o sell-side, o lado do qual atua.
Foram 76 deals, que movimentaram quase R$ 4,2 bilhões. Em número de negócios (e não de volume financeiro movimentado nos M&As) é mais do que BTG Pactual, Itaú BBA e Bradesco BBI no mesmo período.
“Tomei uma decisão radical: só atendo o lado do vendedor. Todo mundo quer fazer os dois”, diz Dimitri Abudi, um dos fundadores da IGC Partners, ao NeoFeed, em uma rara entrevista. “Nunca vou estar do lado do comprador e nunca vou investir meu dinheiro em uma empresa.”
Fundada em 1997 por Abudi e Daniel Milanez, a IGC Partners ganhou impulso nos últimos anos com a onda de M&As que atingiu o mercado brasileiro e mundial por conta de juros baixos e da alta liquidez de capital.
Entre 2019 e 2022, a empresa mais do que dobrou os deals concluídos. No ano passado, foram 30 operações de M&As realizadas. Desde que surgiu, já realizou 330 negócios. “E devemos chegar a 350 neste ano”, diz Abudi.
Uma das características da IGC Partners têm sido mantida desde a sua fundação. A companhia só atua no lado do empreendedor que pretende vender sua empresa (o sell-side).
Essa opção foi o insight que fez Abudi abandonar uma carreira no banco Garantia, de Jorge Paulo Lemann, para criar a empresa. Aos 25 anos, ele acompanhava transações e observou que o lado comprador (buy-side) contava com muitos assessores experientes, enquanto quem vendia negociava sem advogados ou especialistas.
“O mercado financeiro inteiro olhava para M&A querendo representar o comprador. E, do outro lado da mesa, estava um senhor que tinha fundado a empresa há 20 anos, não falava inglês e tinha de negociar com um batalhão de pessoas”, relembra Abudi. “Era ele quem precisava de um assessor.”
O primeiro deal da IGC Partners, que surgiu com o nome de Investidor Global e depois mudou para a atual denominação, foi um negócio pequeno com uma empresa que vendia pneus recapeados. Hoje, a companhia faz transações que, no mínimo, começam a R$ 200 milhões. O alvo é o middle market.
“Ele descobriu o filão do middle market cedo e construiu uma reputação com isso”, diz uma fonte do setor de M&A, que afirma que a IGC Partners cobra comissões que variam entre 3% e 5%. “Eles não saem de casa por menos de R$ 5 milhões.” A empresa, no entanto, não comenta faturamento, nem dados relacionados a comissões.
Os negócios envolvem empreendedores brasileiros, uma boa parte deles fora do eixo Rio-São Paulo, que querem vender suas empresas. Os compradores, muitas vezes, são estrangeiros: 50% dos negócios foram negociações com players internacionais.
Uma das áreas nas quais a IGC Partners começou a explorar antes dos bancos de investimentos foi a do agro, o maior negócio do Brasil, mas que estava fora do radar da Faria Lima.
Foram mais de 32 M&As estruturados, como a compra da Marca Agro pela Nutrien, do Canadá; da Fortgreen pela Origin (Irlanda); da Ferrari Zagatto pela Agrogalaxy; e da Terra Soluções Agrícolas pela Ihara.
Recentemente, com a busca das grandes empresas por se digitalizar, a IGC Partners começou a se aventurar no filão de transformação digital. Nessa área, assessorou a venda da startup de Uberlândia Zup para o Itaú, um negócio de R$ 575 milhões, além da venda da Raccoon para a S4 Capital, de Martin Sorrell, o ex-chefão da WPP.
A entrada em transformação digital foi conduzida por Rafael Frugis, um sócio que hoje tem 27 anos e entrou para a parternship com 25 anos – atualmente, a empresa conta com 27 sócios e 150 funcionários dedicados aos M&As, que atuam em diversas verticais que vão de agronegócios, alimentos, consumo, varejo, educação, real estate, serviços financeiros, tecnologia e mídia, entre outros.
“Em quatro anos, ele fechou uma quantidade de transações enorme e descobriu um nicho de mercado. Se me perguntassem sobre transformação digital, eu não me meteria”, diz Abudi, referindo-se a Frugis, que é responsável por serviços de TI, telecom e mídia – para ser sócio, a IGC Partners estabelece uma meta quantitativa de deals que cada um tem de fechar.
Apesar desse avanço na área de transformação digital, fontes com as quais o NeoFeed conversou disseram que essa é ainda uma lacuna da casa de M&A. “Eles são mais fortes em setores tradicionais e estão tentando ganhar espaço em tecnologia”, diz uma pessoa que conhece Abudi.
Diligências antes dos deals
A companhia tenta também preparar as empresas antes de ir ao mercado atrás de um comprador. Em geral, uma diligência é feita para tentar encontrar problemas antes dos deals. Por conta disso, quando um memorando de entendimento é assinado, 95% dos negócios são fechados – e não param na due dilligence.
“Eles prepararam a minha companhia antes de apresentar para os fundos”, diz Alexandre Zolko, fundador e CEO da CRM&Bonus, que captou R$ 280 milhões com Softbank, Riverwood Capital, Igah Ventures e Volpe Capital, em 2021, com uma avaliação de R$ 1 bilhão. “Eles têm um playbook completo.”
O desafio agora da IGC Partners é encarar uma concorrência cada vez mais acirrada. Além dos principais bancos de investimentos, a companhia enfrenta a competição de IT Investimentos, RGS Partners, JK Capital, Ártica Investimentos e Cypress (comprada pela Galapagos Capital).
O número de transações, depois do boom de 2019 e 2022, está também desacelerando. No primeiro trimestre deste ano, o número de fusões e aquisições caiu 41,9%, segundo a TTR Data. Nos três primeiros meses deste ano, foram 149 negócios que movimentaram R$ 19 bilhões – uma queda de 54,2%, um indício de que os múltiplos de venda estão mais baixos.
Esses dados não preocupam Abudi. Ele diz que desde que criou a IGC Partners já passou pela crise das pontocom (em 2001), da quebra do Lehman Brothers (2008), do impeachment de Dilma (2016) e muitas outras. Essa é só mais uma. E, segundo ele, sempre se vendeu empresas e os preços sempre ficaram mais altos.
Com um sotaque do interior, afinal, é natural de Mirassol, no interior do São Paulo, Abudi, que hoje está mais na prospecção de empresas do que na estruturação de deals, conclui. “O M&A nunca vai acabar. Em algum momento, a empresa vai ficar sem sucessor e vai precisar ser vendida; o empresário vai achar que é um bom timing para vender e vai querer realizar; e sempre vai ter alguém com caixa querendo comprar.”