No início de março, a EQI Corretora, com cerca de R$ 29 bilhões sob custódia, abriu uma operação própria nos Estados Unidos. Nesta semana, a Blue3, com cerca de R$ 28 bilhões sob assessoria, anunciou que está abrindo um escritório por lá. E, segundo apurou o NeoFeed, SVN, Nomos e outros escritórios estão em busca da sua passagem internacional. É a Faria Lima invadindo Miami.
Esse movimento mostra que ter uma operação internacional é a mais nova frente de diversificação de empresas de assessorias, que vêm criando ecossistemas mais completos de investimentos. Além de entrar em um mercado gigantesco, elas não vão enfrentar as amarras que encontram no Brasil.
O crescente interesse pelos investimentos internacionais fez as assessorias procurarem plataformas offshore B2B e levou as principais plataformas locais a criarem suas versões offshore. E, com isso, assessorias passaram a oferecer o serviço dos investimentos internacionais por meio delas como finders.
Segundo as leis americanas, nesse modelo, as assessorias são apenas introdutoras dos clientes às plataformas. E, por isso, não são responsáveis pelo cliente e não podem recomendar investimentos. Dessa forma, são remuneradas apenas pela abertura de cadastro ou recebem um rebate das receitas geradas pelas movimentações. Mas as corretoras e as assessorias querem de fato ter esse cliente a partir de um volume mais expressivo alcançado no offshore.
“A figura do finder é apenas de introduzir o cliente, que passa a ser da corretora. Atuamos nesse modelo com cerca de 450 assessorias no Brasil e entendemos que é natural elas quererem avançar para ter o cliente para elas”, afirma André Algranti, sócio da Avenue, uma plataforma internacional de investimentos com sede em Miami. A empresa acredita que os brasileiros terão nos próximos anos US$ 200 bilhões offshore.
A EQI Corretora, que tem o BTG Pactual como sócio, já tem 7% da sua custódia em investimentos offshore e fez esse movimento de ir para o próximo nível. Nos Estados Unidos, comprou um Registered Independent Advisor (RIA), sendo regulado pela Finra, a autoridade regulatória da indústria financeira americana, para ser um advisory de seus clientes e, assim, ser remunerada por esse aconselhamento.
“Como finders você não é responsável pelo cliente, com o RIA, sim. Montamos grandes negócios no Brasil em que na verdade o cliente não era nosso. Não queríamos repetir o mesmo erro”, diz Juliano Custódio, CEO da EQI Corretora, em entrevista ao NeoFeed.
No Brasil, os assessores de investimento ganharam autonomia para recomendar investimentos e ser multiplataforma com o novo marco regulatório de 2023. Mas o cliente continuou sendo da corretora a qual está plugada. De forma que, ao se transformarem em corretoras, EQI e Monte Bravo tiveram que convidar os clientes a transferirem a sua custódia para elas - o cliente é quem decide se aceita ou não. No modelo de RIA, o cliente é comunicado que será transferido.
Fato é que as assessorias estão em busca de ser RIA. E na lista quem está mais próxima é a Blue3, plugada à XP. Atendendo muitos clientes sofisticados e tendo incorporado o multi family office Troon há um ano, a empresa de investimentos conquistou US$ 400 milhões (cerca de R$ 2 bilhões). Por isso, inaugurou este mês um escritório em Miami e entrou com um processo para obter a licença do regulador americano - a expectativa é que a liberação aconteça nos próximos meses.
“Hoje, 10% da nossa custódia é offshore, então já temos tamanho e demanda para atender o cliente tanto da assessoria como do family office de uma forma completa e podermos recomendar a ele os melhores investimentos também no exterior. O RIA nos permite isso”, afirma Wagner Vieira, CEO da Blue3, ao NeoFeed.
Para manter a estrutura lá fora, seria necessário ter, no mínimo, US$ 100 milhões sob custódia. A SVN, com cerca de R$ 21 bilhões sob assessoria, conquistou uma relevante carteira offshore e construiu uma área dedicada aos investimentos internacionais. E, agora, também está analisando avançar para uma licença mais parruda para atender esse cliente.
“Acreditamos que ter um braço nos Estados Unidos nos permitirá proporcionar aos clientes acesso ao maior mercado de investimentos do mundo, sendo fundamental para a construção de um portfólio diversificado”, diz Virginia Benetti, diretora de produtos e private da SVN.
A Nomos, escritório plugado à XP com cerca de R$ 7 bilhões sob custódia, está no processo para se tornar uma corretora no Brasil, ao mesmo tempo que busca ter um braço internacional.
Para a empresa, além de ser a responsável pelo cliente no exterior, o RIA abre a possibilidade de trabalhar com qualquer custodiante nos EUA, podendo oferecer uma gama maior de produtos. O que está em linha com o objetivo da casa, que avançou mais no varejão, de crescer na alta renda e grandes fortunas.
"Estamos estudando qual o modelo iremos seguir para atender mais de perto o cliente no exterior. Mas fato é que com o crescimento no offshore, e com a nossa meta de atender tíquetes maiores este ano, esse movimento para o exterior é essencial", diz Rodrigo Imperatriz, CEO da Nomos.
De ultrarricos para a alta renda
Apesar da tendência crescente da procura desse modelo para operação nos Estados Unidos, essa estratégia já é antiga e conhecida de empresas que atendem há mais tempo os clientes high net worth (com mais de R$ 30 milhões).
A Faros, por exemplo, quando comprou o multi family office Hollander em 2022, adquiriu com ele a licença RIA. Hoje, a Fami Capital (resultante da sua fusão com a Messem), com cerca de R$ 68 bilhões sob assessoria, já tem mais de US$ 1,5 bilhão no exterior.
A Legend Capital, que abrange a Legend Investimentos, parceira do BTG Pactual, possui um RIA desde 2022, quando absorveu parte da equipe da gestora de patrimônio Genenis, e atende a partir dessa estrutura seus clientes maiores de wealth. Hoje, detém quase R$ 13 bilhões offshore. E com a recente joint venture firmada com o single family office SPA Invest, de Elie Horn, a empresa saltou para R$ 27 bilhões.
“Nossos principais parceiros para atender o cliente lá fora são o J.P. Morgan e o Morgan Stanley, mas para isso é necessário ter, pelo menos, US$ 2 milhões. Como a demanda por investimentos internacionais é cada vez maior de clientes da assessoria, com um tíquete menor, temos usado mais nosso parceiro brasileiro, o BTG”, afirma Pedro Salles, CEO da Legend Investimentos.
A Valor Investimentos, assessoria plugada à XP com cerca de R$ 12 bilhões sob assessoria, também tem atuado nas duas frentes. A empresa tem uma joint venture com um MFO português, o 3J Capital Partners, que possui uma licença RIA, e por lá atende grandes fortunas.
Para clientes menores e da assessoria, a Valor Investimentos está usando a conta internacional da XP. Mas o crescimento das contas offshore na assessoria de investimentos, que se multiplicou por quatro em um ano e chegou a US$ 150 milhões, está levando a empresa a pensar em uma nova estratégia.
“Agora que alcançamos um tamanho mais relevante, estamos avaliando uma operação nossa nos Estados Unidos, desde um RIA a outras opções, mas que nos possibilitem apoiar mais o investidor no mercado internacional”, diz Vyctor Tavares, sócio e head internacional da Valor Investimentos.
Essa tendência dos clientes alta renda, com menos de US$ 2 milhões, começando a investir nos Estados Unidos e percebendo que não serão bem atendidos pelos bancos internacionais é a grande aposta das plataformas Avenue, XP e BTG Pactual para crescer nesse mercado. Primeiro conquistando os brasileiros e depois outros latinos que buscam essa direção para o seu capital.
Já do lado dos advisories, a expansão internacional traz mais robustez para o negócio como também uma diversificação de receitas fora das plataformas de investimentos que estão plugados no Brasil.
“Como RIA, a empresa pode escolher trabalhar com a plataforma que quiser. E elas estão entendendo cada vez mais que ter mais de um parceiro ajuda a diversificar receitas e deixar a empresa mais valiosa para um potencial sócio capitalista”, afirma Algranti, da Avenue.
O momento nunca foi tão oportuno para os brasileiros investirem no exterior, com taxas de juros em dólar atraentes e mudanças regulatórias eliminando os diferenciais que o Brasil tinha, como excesso de títulos incentivados a juros atrativos e sem risco. E, como ninguém quer perder a oportunidade para atender esse cliente primeiro, a corrida pelo braço internacional está acelerada.