Boa parte do caminho da curitibana Ebanx foi cumprido longe dos holofotes. Fundada em 2012, a novata nasceu com a proposta de processar pagamentos internacionais, o chamado cross border, conectando os consumidores latino-americanos aos e-commerces e serviços digitais com sedes além das fronteiras da região.

Mesmo “atrás das câmeras”, a empresa ganhou fama na cena de startups ao atrair mais de mil clientes, entre eles, nomes como Spotify, Airbnb e AliExpress. E deixou definitivamente os bastidores no fim de 2019, quando se tornou mais um unicórnio brasileiro, com um aporte, de valor não revelado, do fundo americano FTV Capital.

A Ebanx não perdeu, no entanto, o gosto pela discrição. Sem fazer alarde, a companhia começa a dar vazão a uma faceta ainda pouco conhecida do seu repertório: as aquisições. E o movimento mais recente nessa direção é a compra de uma participação minoritária do banco Topázio, revelada com exclusividade ao NeoFeed.

Fechado neste início de ano, o acordo, cujos termos financeiros não foram divulgados, envolve uma fatia de 30% no banco gaúcho e ainda está sujeito à aprovação do Banco Central e do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Até que isso aconteça, as duas empresas seguirão operando de forma independente.

“Em essência, dependemos de uma instituição financeira e sempre tivemos boas parcerias no segmento bancário”, diz Wagner Ruiz, cofundador e CFO da Ebanx. “Mas entendemos que, daqui para frente, precisamos criar uma aliança muito mais forte do que uma relação com um fornecedor.”

O banco parece, de fato, ter um bom encaixe com as ambições da Ebanx. A começar pela figura de Ernesto Corrêa. Além do Topázio, o empresário gaúcho, avesso a holofotes, reuniu sob a marca do grupo que leva o seu sobrenome negócios como a processadora de cartões GetNet, vendida ao Santander, em 2014.

Fundado em 2005, o Topázio investe em um modelo 100% digital, sem agências físicas, com um portfólio para pessoas físicas e jurídicas em áreas como crédito, câmbio e investimentos.

No primeiro semestre de 2020,  o banco contabilizou uma receita com intermediações financeiras de R$ 134,1 milhões e um prejuízo de R$ 7,5 milhões. A empresa fechou o período com uma carteira de crédito de R$ 255 milhões e com R$ 247 milhões em caixa.

Desde 2017, o Topázio também vem migrando para os bastidores, ao priorizar uma oferta sob o conceito de bank as a service, com um arcabouço tecnológico e regulatório para que fintechs e outras empresas encurtem o caminho para a oferta de produtos e serviços financeiros.

Entre essas companhias estão nomes como o Mercado Pago, fintech do Mercado Livre, que estruturou uma operação de crédito para os sellers do marketplace, e a incorporadora Vitacon, que lançou uma modalidade de investimento com o apoio do Topázio. Além da própria Ebanx, que tem o banco como parceiro na Ebanx Go, conta digital voltada a pessoas físicas.

Ao buscar uma relação mais íntima com o banco, a Ebanx quer aprimorar sua oferta de pagamentos cross border para clientes internacionais no Brasil. “Isso passa por ter mais velocidade para processar as operações e uma estrutura adequada para atender ao crescimento no volume das transações”, afirma Ruiz.

A Ebanx tem uma base de mais de mil clientes ativos em pagamentos cross border, com nomes como Spotify, Airbnb e AliExpress

Com essa premissa, a Ebanx também foi às compras há menos de um ano. Em abril de 2020, a empresa adquiriu um sistema de processamento nos Estados Unidos para facilitar a integração e aprimorar o atendimento a clientes americanos no Brasil. A startup não revela o nome do ativo e o valor do acordo.

Ainda no âmbito dos investimentos, a Ebanx mantém um fundo de early stage, o Honey Island, por meio do qual já fez aportes em mais de uma dezena de startups. Anunciado em 12 de janeiro, o mais recente envolveu a plataforma de chat-commerce OmniChat, em rodada de R$ 20 milhões liderada pela Kaszek Ventures.

Primeira na fila

À parte da busca por transações mais rápidas e eficientes, a participação minoritária no Topázio tem como um de suas principais razões a perspectiva de mudanças no setor da Ebanx e no seu entorno.

Entre elas, a agenda do Banco Central para a regulamentação do segmento de câmbio, com a promessa de abertura do mercado para a atuação de fintechs. Há, inclusive, uma consulta pública em curso que versa sobre temas como novos modelos em pagamentos e transferências internacionais.

“Não sabemos se as regras irão mudar ou quais rumos o mercado irá tomar, mas não podemos ficar esperando”, afirma Ruiz. “Ter uma instituição regulada e autorizada dentro de casa, mesmo que parcialmente, nos deixa mais confortáveis para os desafios à frente”, diz, acrescentado que a associação também abre espaço para o desenvolvimento de novos produtos e serviços.

“A Ebanx está tentando se antecipar a esses movimentos futuros, que trarão, sem dúvida, mais clareza ao jogo e mais competição”, diz Fabricio Winter, sócio da consultoria Boanerges & Cia. “No fundo, a empresa está comprando a prioridade de ser a primeira na fila de desenvolvimento com o Topázio.”

“Ter uma instituição regulada e autorizada dentro de casa, mesmo que parcialmente, nos deixa mais confortáveis para os desafios à frente”, diz Wagner Ruiz, cofundaro e CFO da Ebanx

Esse panorama de mudanças na competição está colocando as instituições dedicadas ao bank as service na mira de investidores e de empresas como a Ebanx. “Ter na carteira nomes como o Mercado Pago coloca o Topázio entre os ativos mais cobiçados. Mas ele não é o único”, diz uma fonte do setor.

Um exemplo é a Hub Fintech, comprada em dezembro pelo Magazine Luiza, por R$ 290 milhões. Outro é a também brasileira Conductor, que captou US$ 170 milhões no fim de 2020, em rodada liderada pela Viking Global Investors, com a participação de fundos como Temasek e Riverwood Capital.

“A Conductor já tem mirado mercados fora do Brasil, como Colômbia e México”, afirma a mesma fonte. “Ao mesmo tempo, ao se associar com a Ebanx, o Topázio ganha uma porta de entrada para outros países latino-americanos.”

Se há competidores do Topázio buscando outras fronteiras, para a Ebanx, a concorrência também deve se acirrar com rivais de outros países. É o caso da dLocal que, em setembro, tornou-se o primeiro unicórnio do Uruguai, ao ser avaliada em US$ 1,2 bilhão após uma rodada de US$ 200 milhões da General Atlantic e da Addition.

Além de desenvolver novos serviços, a startup, que já atua no Brasil, planeja iniciar operações em 13 novos países. Assim como a Ebanx, a dLocal atende clientes de peso, como Amazon, Uber e Booking.com.

Novas fronteiras

A expansão da presença na América Latina é justamente o outro grande foco da Ebanx para este ano. Atualmente, na região, a empresa está presente nos seguintes países: México, Argentina, Colômbia, Chile, Peru, Uruguai, Bolívia, Equador e Paraguai.

Em 2020, a Ebanx intermediou mais de 145 milhões de transações, o que representou um salto de 38% sobre 2019. Sem considerar o Brasil, o avanço foi ainda superior, de 200%. A empresa não revela a cifra total movimentada no período.

Wagner Ruiz, cofundador e CFO da Ebanx

“A América Latina, sem o Brasil, saiu de uma fatia de 25% na nossa operação, em 2019, para uma fatia de 45%”, diz Ruiz. “Temos três macro áreas de negócios, que se retroalimentam e, com esse crescimento, vimos que precisamos ampliar a presença onde já estamos e levar nossas ofertas a novas geografias na região.”

Batizado de Push Latam, o projeto também tem um forte componente inorgânico para acelerar a expansão de uma dessas áreas. Trata-se da oferta de serviços de pagamentos para empresas locais. Hoje, além do Brasil, esse portfólio está disponível na Argentina e começa a ser estruturado no México.

“Temos conversado com empresas de pagamentos que fazem processamento local na região e há um bom espaço para aquisições nesse espaço nos próximos 12 meses”, conta Ruiz, que aponta Colômbia e Chile como os dois novos pontos a serem adicionados no mapa da Ebanx nessa ponta.

Já nos pagamentos cross border, depois do início recente das operações no Uruguai e no Paraguai, o plano para 2021 é chegar aos países da América Central. O roteiro inclui, a princípio, Panamá, Costa Rica, República Dominicana e Guatemala, com a possibilidade do investimento em operações compartilhadas.

Em 2020, a Ebanx intermediou mais de 145 milhões de transações, o que representou um salto de 38% sobre 2019

A terceira escala nesse percurso é a expansão da Ebanx Go, conta digital com cartão pré-pago e cashback. Disponível no mercado brasileiro desde janeiro, essa oferta é a a única iniciativa da Ebanx voltada a consumidores.

Argentina e México serão os dois primeiros países a receber a Ebanx Go. No Brasil, a conta digital tem cerca de 55 mil usuários e a expectativa é encerrar março com uma base de 100 mil clientes. Para Winter, da Boanerges & Cia, a guinada no B2C é válida, mas precisa ser encorpada.

“Temos mais de 700 contas digitais hoje no Brasil. Se eles não adicionarem outros produtos financeiros nesse pacote, é difícil ganhar escala”, afirma. Ele aponta, porém, um aspecto positivo a ser explorado. “A Ebanx pode aproveitar essa onda para testar bem o produto e levá-lo a países mais carentes dessas soluções na região.”

Enquanto a expansão do leque para consumidores parece ser uma necessidade, a Ebanx estuda lançar um portfólio de produtos financeiros para outro público: as 50 mil pequenas e médias empresas que formam a sua base de clientes de pagamentos locais no Brasil.

“A ideia é começar um MVP (Minimum Viable Product) de crédito ainda nesse trimestre”, observa Ruiz. “Temos espaço para oferecer produtos usando parceiros especializados. E, dentro dessa visão, a aliança com o Topázio também faz muito sentido.”

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