Formado no ITA, Rubens Henriques, fundador da gestora Clave Capital, se diz um “nerd” por natureza. Mas, mesmo ele, um obcecado por números e estratégias, teve de contratar o que diz ser “uns malucos da NASA”.
Brincadeiras à parte, Henriques, o ex-CEO da Itaú Asset, trouxe para a sua gestora, lançada em junho deste ano, um time de programadores, matemáticos e cientistas de dados liderados pelo executivo Moacir Fernandes.
E, agora, essa turma, que até então atuava com discrição, vai mostrar a que veio. Nesta semana, a Clave lança oficialmente o Clave Cortex, um fundo quantitativo que vem sendo criado “por esses malucos da NASA”.
“O fundo vai operar moedas diversas, taxas de juros no Brasil e no exterior, ações individuais e contratos futuros aqui e lá fora. A vantagem é que o quantitativo consegue olhar tudo mais rápido e ao mesmo tempo”, diz Henriques ao NeoFeed.
A equipe da Clave vem montando um robusto motor de inteligência artificial e algoritmos para acompanhar os movimentos do mercado e fazer com que os robôs saibam exatamente o momento de comprar e vender ou montar e deixar uma posição.
Milhões de informações, atuais e históricas, são analisadas simultaneamente, algo que nenhum ser humano consegue fazer. São dados macroeconômicos, de moedas, de juros, de inflação, de ações, de balanços de empresas.
No modelo de ações, por exemplo, são mais de 260 sinais de alertas. Os robôs ainda analisam, transação a transação, cada trade que acontece no mercado – desde as pequenas até as grandes negociações.
Mas isso não quer dizer que o fundo será 100% comandado por inteligência artificial. Henriques faz questão de frisar que o fator humano é o grande diferencial do Clave Cortex, um multimercado livre que analisa uma base de 3 mil ações, 120 contratos futuros e 50 ativos de juros e câmbio.
Moacir Fernandes, que lidera o fundo quantitativo, é engenheiro formado pela UFRGS com especialização em sistemas neurais aplicados em finanças, tem PHD em finanças pela London School of Economics, e trabalhou com fundos quantitativos na Concordia Advisors, em Londres, e na Graham Capital Management, nos EUA.
Além dele, a Clave conta outros dois gestores tarimbados que darão suporte à estratégia de fundo quantitativo da asset. Um deles é Rodrigo Carvalho, que comanda a estratégia macro.
Ele foi sócio-fundador da Vintage Investimentos, da Mauá Investimentos e diretor do Credit Suisse. O outro é André Caldas, que cuida da estratégia de renda variável. Ele foi gestor da Itaú Asset e passou por Credit Suisse, Banco Garantia, entre outros.
“Todo dia, o gestor macro e o gestor de bolsa olham o portfólio do fundo quantitativo e avisam o Moacir: ‘está estranho isso aqui, a posição em dólar está gigante, diminui um pouco’. O gestor de bolsa olha e diz: ‘está operando 100 ações? Tira essas duas que têm risco societário’”, afirma Henriques.
Essa interferência humana é necessária para tirar o que Henriques diz ser a ingenuidade da máquina e dar dicas e inputs para Fernandes abastecer o motor de inteligência do Clave Cortex. “Coisas do trader que sabe que, quando está acontecendo algo no mercado, o BC vai aumentar a taxa de juros, que é preciso aumentar a posição em dólar e assim por diante”, diz Henriques.
O conhecimento dos gestores, a intuição de mercado que o robô não tem, é fundamental. Fernandes dá um exemplo simples para se fazer entender. “Moro no Rio de Janeiro, na Barra, e costumava jogar futebol na Tijuca. E o Waze sempre me dá o caminho mais eficiente, mas, conhecendo um pouco da cidade, ele me mandava para umas rotas mais perigosas. Eu não seguia porque sabia que poderia ter um efeito de cauda muito grande.”
Quando a crise do coronavírus surgiu e o mercado entrou em pânico, muitos robôs de investimentos ao redor do mundo perderam muito dinheiro, tiveram de ser “desligados” e os gestores humanos assumiram o manche da operação. Afinal, os robôs trabalham com comportamentos passados e não tinham dados para analisar aquele evento inédito.
“O quantitativo te dá um comportamento médio, mas ter gestores experientes ajuda a evitar que o portfólio caia em algum tipo de armadilha”, diz Henriques. Os algoritmos também foram desenvolvidos com travas para não deixar que a máquina saia comprando determinados ativos em excesso.
O Clave Cortex terá de 6% a 8% de volatilidade, buscando um retorno líquido de 6%. A expectativa é a de que o fundo nasça com entre R$ 100 milhões e R$ 200 milhões. Para entrar no fundo, o investimento mínimo será de R$ 500,00, a taxa de administração será de 2% e a taxa de performance de 20% sobre o que superar o CDI.
Uma nova era?
“Muita coisa vai mudar na indústria de fundos do Brasil, principalmente o tamanho do espaço que os robôs vão ocupar na gestão. É só olhar o que aconteceu em outros mercados”, diz Henriques. Das dez maiores gestoras de ativos do mundo, oito usam fundos quantitativos em suas estratégias. Aqui, é um mercado que ainda está engatinhando. Nos EUA, movimenta trilhões de dólares.
No Brasil, de acordo com uma pesquisa da TradeMachine, empresa brasileira que também atua com a oferta de fundos no modelo quantitativo, somente 6% dos investidores brasileiros fazem uso de algum tipo de robô em suas carteiras. O estudo também revelou que 59% dos participantes têm algum tipo de receio em relação a esses recursos.
As gestoras mais notórias neste segmento são a Giant Steps, com R$ 7 bilhões sob gestão e que recentemente recebeu investimentos e se tornou sócia da XP; a Kadima e, por último, a Quantamental, que, em abril, foi incorporada pela Itaú Asset.
Com pouco mais de três meses de vida, a Clave já conta com R$ 3,1 bilhões sob gestão e o BTG Pactual como sócio. Henriques não diz qual é a participação do banco de André Esteves na gestora, mas afirma que tem R$ 2,5 bilhões em investimentos garantidos nos fundos da Clave.
“No momento em que eu chamo esse dinheiro, ele tem de ficar travado por três anos. Até hoje, só chamamos R$ 1 bilhão”, diz Henriques. A Clave conta com um time de 40 pessoas, já tem mais de 10 mil investidores, produtos distribuídos em oito bancos, plataformas de investimentos e 20 family offices.
Hoje, a Clave conta com um fundo de macro e outros três de renda variável. Os próximos passos incluem a criação de produtos em private equity, real estate e special situations. “Quero ter a governança, a estrutura e a solidez de uma asset bancária, mas com a sofisticação, flexibilidade e a agilidade de uma gestora independente”, diz Henriques.