Em sete anos, a indiana Oyo alcançou uma rede de 43 mil hotéis, mais de 800 cidades, em 80 países, e uma valorização de US$ 10 bilhões. Além de fundos como Sequoia Capital, as 16 rodadas captadas tiveram a presença constante do Softbank, que elegeu a startup como uma de suas grandes apostas.

Com um modelo de hospedagem de baixo custo, a Oyo faz acordos com hotéis independentes, que passam por um banho de loja e adotam a sua bandeira. A startup apoia a gestão e a captação de clientes com recursos como algoritmos de precificação, e ganha uma comissão em cada reserva.

Acostumada a repaginar seus parceiros, a empresa fundada pelo indiano Ritesh Agarwal tem agora o desafio de fazer o mesmo dentro de casa. A operação brasileira é um exemplo dessa nova realidade, que destoa da estratégia agressiva adotada pela companhia desde a sua criação.

“Nós entramos em um forte roteiro de preservação de caixa quando percebemos que os impactos da Covid-19 iam ser muito pesados”, diz Henrique Weaver, diretor-geral da Oyo no Brasil, em entrevista ao NeoFeed. “Metade da nossa rede está fechada e nossa taxa de ocupação está entre 15% e 20%.” Parte dos hotéis está reabrindo à medida que os municípios flexibilizam a quarentena.

Assim como em outros mercados, a Oyo ganhou escala rapidamente no País. Em pouco mais de um ano, superou as marcas de 40 cidades, 500 hotéis e 13 mil quartos. E montou um time de cerca de 700 funcionários, número que chama a atenção pelo curto período e, ainda mais, por vir de uma startup.

Em algumas semanas, porém, essa estrutura encolheu significativamente. “Hoje, estamos com cerca de 150 pessoas”, afirma Weaver. As demissões atingiram todas as áreas da empresa. “Foi uma decisão difícil. Olhamos para todos os custos, mas não conseguimos evitar os cortes.”

Antes, a Oyo já tinha tomado medidas como a renegociação com fornecedores, a suspensão de contratos, o corte de toda a verba de marketing e a centralização da operação apenas na cidade de São Paulo. Até a chegada da crise, a equipe estava distribuída em coworkings em diversas capitais do País.

Não faltam exemplos de empresas afetadas no setor, um dos primeiros e mais afetados pela Covid-19. O pacote passa por outras startups de destaque, como o Airbnb, que também figura entre os investidores da Oyo.

Entre outras medidas, a empresa cortou 1,9 mil funcionários, cerca de 25% de sua força de trabalho. E seu CEO e fundador, Brian Chesky, já reconhece que a previsão de receita da companhia para 2020 é de “menos da metade” do apurado em 2019. No ano passado, o faturamento estimado foi de US$ 4,8 bilhões.

Já entre as gigantes tradicionais do segmento, o grupo Accor, dono de marcas como Ibis, Mercure Sofitel e Fairmont, também ilustra esse cenário desafiador. “Várias indústrias foram impactadas em quedas de 25%, 30%. A nossa foi impactada em 90%”, disse Patrick Mendes, CEO da empresa na América do Sul, em entrevista concedida ao NeoFeed, no fim de abril.

Entre outros reflexos em sua operação na região, a Accor demitiu cerca de 10% dos funcionários de sua sede. Alguns hotéis da rede chegaram a cortar entre 15% e 20% dos funcionários.

Efeito WeWork

A origem da reestruturação da Oyo, no entanto, vai muito além da pandemia. Antes da Covid-19, a unicórnio já vivia sua própria crise.

Em janeiro, foram demitidos 1,8 mil funcionários na Índia e na China. Segundo a agência Bloomberg, o número avançou para 5 mil cortes no início de março, reduzindo o quadro global para 25 mil pessoas.

A WeWork, outra estrela do portfólio do Softbank, está no centro da revisão de rumos da Oyo. Em agosto de 2019, O IPO frustrado da startup de escritórios compartilhados colocou em xeque a tese do fundo japonês, baseada, até então, na intensa queima de caixa e no crescimento a qualquer custo.

Com o caso, o Softbank, cujo Vision Fund reportou uma perda de US$ 18 bilhões em 2019, mudou radicalmente sua abordagem. E passou a pressionar outras startups bilionárias e deficitárias do seu guarda-chuva a virarem a chave em busca de lucratividade, entre elas, a Oyo.

No ano fiscal encerrado em março de 2019, a Oyo apurou uma receita de US$ 951 milhões, mas teve um prejuízo de US$ 335 milhões

A startup havia apurado uma receita de US$ 951 milhões no ano fiscal encerrado em março de 2019, contra US$ 211 milhões no exercício anterior. Nesse intervalo, o prejuízo da operação cresceu, porém, de US$ 52 milhões para US$ 335 milhões.

A Covid-19 e as perspectivas de retomada lenta no segmento de hospedagens só acentuaram os desafios da Oyo. E sinalizaram que a startup talvez tenha ido com muita sede ao pote. Como resposta, além dos cortes e de outras ações, o fundador e CEO Agarwal abriu mão de seu salário até o fim do ano.

“Nós crescemos numa velocidade impressionante e, claro, cometemos erros”, diz Weaver. Ele ressalta, no entanto, que o efeito WeWork trouxe benefícios. “Essa direção tornou o foco na lucratividade mais tangível. Até então, isso não era necessariamente uma verdade. O horizonte era maior.”

Um dos projetos que ganharam velocidade foi a criação, no fim de 2019, da estrutura de vendas diretas no País, com aplicativo, portal e call center. Até então, a Oyo só comercializava as reservas locais em sites parceiros, como Booking.

“Essa opção, sem intermediários, encurta o caminho para a rentabilidade”, afirma Weaver. O canal próprio já responde por quase 20% das reservas no País.

A Oyo tem uma base de mais de 500 hotéis no Brasil

Com os ajustes e uma posição de caixa mais confortável, a operação brasileira está financiando iniciativas para apoiar os hotéis durante a pandemia. A startup concedeu um desconto de 50% nas taxas cobradas desses parceiros. E está subsidiando estadias gratuitas para profissionais de saúde em hotéis próximos de hospitais em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Niterói.

A Oyo também está oferecendo tarifas mais baixas para estadias mais longas e vem compensando parte das perdas com as pessoas que estão buscando quartos em hotéis para trabalhar, especialmente em cidades como São Paulo.

Em maio, a companhia colocou em prática um plano de preparação dos hotéis para a retomada. Ele inclui uma série de protocolos de higienização, treinamentos, inspeções regulares e uma certificação para os parceiros.

“No pós-crise, vamos ter condições de atrair ainda mais parceiros para a base”, diz Weaver. “O setor tem uma retomada difícil pela frente e isso nos torna uma ferramenta importante nessa recuperação.” Como sinal dessa projeção, ele cita que, globalmente, a startup fechou 3,6 mil contratos nos últimos três meses.

A Oyo está testando ainda uma nova categoria no País. Batizada na operação global de Capital O, ela inclui propriedades com quartos maiores e mais conforto nas acomodações, em mercados como São Paulo e Brasília. Em fase de piloto com dez hotéis, a projeção é lançar a oferta local ainda esse ano.

A Oyo está testando uma nova categoria no País, que inclui hotéis com quartos maiores e mais conforto nas acomodações

Fora do Brasil, a startup tem modalidades como hotéis de luxo, resorts, espaços para casamentos e até casas para temporada. Mas com os pés no chão, Weaver prefere não fazer planos de novos desembarques. “Agora, estamos concentrados em superar esse momento.”

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