O mercado financeiro está de “cara nova” neste início de junho. Informações que circularam nos últimos dias e poderiam provocar acelerada e intensa reprecificação de ativos não tiveram maiores consequências, mas o momento recomenda cautela pelo risco de que nem tudo é o que parece.

A indicação é de que a “crise do IOF” foi debelada, ante a expectativa de que o aumento do imposto será revogado por alternativas de receita acordadas entre governo e Congresso. A saber, porém, talvez no domingo 8 de junho, se a elevação do IOF caiu para valer e a que “preço”.

A afirmação do presidente Lula, em entrevista na terça-feira 3 de junho, de que confia 100% em Gabriel Galípolo, mas o juro está alto e espera sua queda em breve trouxe um ponto de interrogação porque contrasta em gênero, número e grau da declaração do chefe do Banco Central, na véspera, de que a instituição ainda discute a alta do juro – sinal de que o corte da Selic não está sob avaliação.

A pouca relevância dada pelo governo e renomados economistas à mudança na perspectiva do Brasil, de positiva para estável, pela agência Moody’s – tratada como reparação de um equívoco – requer atenção por afastar o País do grau de investimento. Condição que afugenta o investidor global de longo prazo.

Analistas creditam a “calmaria” do mercado, momentânea possivelmente, em parte à visão de que o governo está empenhado em melhorar o quadro fiscal ainda que para avançar em medidas de estímulo à demanda – várias já anunciadas – que podem render pontos positivos à combalida popularidade de Lula rumo à eleição em 2026. Aliás, incorporada precocemente a cenários como “trade eleição” a apontar torcida ou aposta em favor de um futuro “inquilino” reformista no Planalto.

Maior oferta de capital estrangeiro direcionado à bolsa de valores é outro fator a colaborar e muito para a estabilização dos ativos e o bom humor da Faria Lima. Na contramão dos principais índices norte-americanos, o Ibovespa sobe 14% em 2025 (S&P500,1,5%), embalado pelo dinheiro de fora que ajuda a segurar o dólar e favorece o controle da inflação que, longe da meta, segue na mira do BC.

De R$ 21,52 bilhões de capital externo dedicado às ações neste ano, segundo a consultoria Elos Ayta, a metade ingressou em maio – mês marcado por um discurso mais moderado de Trump, trégua na discussão tarifária, recomposição de preços de ativos no exterior e redirecionamento de investidores dos EUA para outros mercados, sendo o Brasil, do juro alto e bolsa “barata”, um ativo e tanto.

Contudo, o retrocesso para um cenário externo mais belicoso e incerto não está descartado na contagem regressiva para o fim do prazo de 90 dias de suspensão das tarifas comerciais recíprocas, em 9 de julho.

“Brasil não precisa de estímulos, quem precisa é o governo”

“A trégua nas negociações sobre tarifas não garante que acordos serão celebrados. E, se forem, que serão cumpridos. E o embate tarifário entre EUA e China, em primeiro plano, está longe de resolvido. Trump está louco para fazer um acordo, mas a China sabe disso e resistirá por um bom tempo”, avalia Gino Olivares, economista-chefe da Azimut Brasil Wealth Management.

Em entrevista ao NeoFeed, o economista lembra que o fato de os EUA solicitarem aos parceiros comerciais o envio de suas melhores propostas sobre as tarifas sinaliza falta de estratégia de negociação e improviso. “E a improvisão de Trump, que se estende a todas as áreas, gera desconforto e mais incerteza.”

Olivares aponta a situação fiscal americana como tema de relevância neste fim de semestre, ainda que em nada surpreendente. “Não à toa, assistimos à alta das taxas de juros dos Treasuries e à depreciação do dólar, o que significa aumento de prêmio de risco”, diz o executivo que vê a economia americana bem. E não acredita que o Federal Reserve (Fed) atuará como a “cavalaria” que entra em campo para resolver todos os problemas – papel já desempenhado no passado.

O Brasil não está imune às incertezas externas, mas Olivares destaca a surpreendente resiliência da economia que, entende, não é resultado exclusivo de impulso fiscal. “Sou cético. Esse impulso pode existir, mas podemos estar presenciando efeitos de reformas realizadas durante o governo Temer. Algo semelhante ocorreu no primeiro mandato de Lula quanto às reformas promovidas pelo governo Fernando Henrique Cardoso.”

Para o economista-chefe da Azimut Wealth, a atividade precisaria estar mais fraca para trazer mais otimismo quanto à inflação. Ele questiona qual será o vetor que vai trazer a inflação para baixo, mas lembra que o mercado considera suficiente Selic de 14,75% para fazer esse trabalho. “Paradoxalmente, porém, o mesmo mercado não consegue projetar inflação a 3%. E me parece que o caminho escolhido pelo BC é manter 14,75% pelo tempo que for necessário e que deve ser longo.”

Quanto às medidas que vêm sendo anunciadas pelo governo Lula – vistas pelo mercado como populistas e de estímulo à atividade –, Olivares é taxativo. Observa que a não realização desses estímulos não iria fazer diferença em termos de PIB. Entretanto, diz, “elas têm impacto terrível” sobre o que se espera adiante. E a desancoragem das expectativas, observa, reflete essa apreensão.

Para Olivares, se o governo, que tem um problema fiscal sério, se preocupa em dar mais estímulo a uma economia que não precisa é sinal de que é ele, governo, que precisa de resultados para se viabilizar nas eleições de 2026.

“O governo precisa dar sinais para recuperar popularidade. Preocupante é o fato de não termos um governo disposto a reduzir gastos. E, como gasta demais, lança receitas como a alta do IOF, o que mostra que o arcabouço fiscal como foi concebido já se exauriu. E qual solução será viabilizada? Não sabemos”, conclui.