Em mais um sinal de que o mercado brasileiro de games entrou de vez no radar das grandes empresas internacionais do setor, a chinesa Tencent Games vai abrir uma operação no Brasil, fontes disseram ao NeoFeed.

A companhia, que é a maior empresa de games do mundo, com um faturamento global de mais de US$ 32 bilhões, está montando uma equipe local, que vai ser comandada por um executivo que virá da China.

Atualmente, a Tencent Games atua no mercado brasileiro de forma indireta, através de empresas nas quais ela investe. Entre elas, a Level-up, que tem o jogo "Ragnarok", e a Riot Games, dona do "League of Legends".

A estratégia de entrar diretamente no mercado brasileiro acontece por conta das restrições a jogos online na China, mas também em razão da saturação do mercado asiático. “Ainda há muito espaço para crescer no Brasil”, diz uma das fontes, que conhece os planos da Tencent Games.

Além de investir em dezenas de estúdios ao redor do mundo, a Tencent Games, que faz parte da Tencent, gigante chinesa fundada por Ma Huateng e que vale US$ 437 bilhões na bolsa de valores de Hong Kong, desenvolve também jogos próprios. Em especial, para smartphones.

Os principais são o “Peacekeeper Elite”, uma versão chinesa do PUBG Mobile, e o “Honor of Kings”, que é dominante na China. Outros jogos da Tencent Games que têm crescido em seu país de origem são o “Fight of Golden Spatula” e o “Return to Empire”.

O plano, ao criar uma estrutura local, é trazer os seus jogos próprios ao mercado brasileiro, passando a ter uma atuação direta e cobrando em reais. “Faz toda diferença ter uma equipe local por conta da velocidade de tomar decisões”, afirma um profissional a par das tratativas. “As empresas tech que querem se expandir seriamente em um mercado precisam de gente no País.”

A estratégia é um esforço para ganhar mais tração fora da China, de onde vem 75% da receita da área de games da Tencent, um conglomerado que é dono também do WeChat, o aplicativo de mensagens que tem quase 1,3 bilhão de usuários e que serve para quase tudo, desde pedir táxi, pagar contas, fazer compras e até realizar consultas médicas.

O “Peacekeeper Elite”, uma versão chinesa do PUBG Mobile, é um dos principais games da Tencent Games na China

Desde o ano passado, a China introduziu novas regras para menores de 18 anos, limitando a quantidade de tempo que podem gastar em videogames a três horas por semana. A medida foi justificada como “necessária para combater o vício em jogos”.

Isso já está afetando o resultado da companhia. No primeiro trimestre de 2022, a receita da área doméstica de games da Tencent na China foi de quase US$ 5 bilhões, uma queda de 1% na comparação com o mesmo período do ano passado. A receita internacional, no entanto, cresceu 4%, para US$ 1,6 bilhão.

Boa parte dos resultados da operação internacional vem das participações que a Tencent Games detém em outras empresas do setor. Entre elas, a Epic Games, dona do "Fortnite"", um dos jogos de tiro mais populares do mundo; da Supercell, criadora do jogo "Clash of Clans"; e da LightSpeed Studios, que desenvolve o "PUBG Mobile" – além das já citadas Riot Games e Level-up.

Mas a Tencent Games, segundo apurou o NeoFeed, quer que os seus jogos próprios comecem a ganhar tração fora da China. Por esse motivo, se tornou vital para a companhia se expandir internacionalmente. E nessa trajetória, o Brasil, um dos principais mercados de games do mundo, entrou no radar do chineses.

No ano passado, o setor movimentou US$ 2,3 bilhões no Brasil, de acordo com dados preliminares da consultoria Newzoo. Com esse desempenho, o Brasil é o maior mercado da América Latina e o 13º do mundo.

No ano passado, o setor de games movimentou US$ 2,3 bilhões no Brasil

A decisão de ter uma operação no Brasil de sua área de games não é o primeiro investimento direto da Tencent no Brasil. Em novembro do ano passado, a Tencent Cloud, divisão de computação em nuvem da companhia chinesa, inaugurou o primeiro data center no País, em São Paulo.

A companhia fez também investimentos em algumas empresas no Brasil por meio de seu braço de venture capital. Um deles foi no Nubank, fintech brasileira que abriu o capital no ano passado e hoje vale US$ 17,5 bilhões. Outro foi na Omie, startup de sistema de gestão online fundada pelo empreendedor Marcelo Lombardo.

O jogo está começando

A movimentação da Tencent Games acontece em meio a uma série de negócios que envolvem estúdios de games brasileiros em busca de talentos por conta da escassez global de profissionais de desenvolvimento de jogos.

A Epic Games, dona do jogo Fortnite e na qual a Tencent Game tem uma participação, adquiriu uma fatia da gaúcha Aquiris Game Studios, em abril deste ano. Com o investimento, cujo valor não foi revelado, as empresas firmaram um acordo para publicação de jogos multiplataformas. Os dois principais títulos da Aquiris são "Wonderbox" e "Horizon Chase".

Em março deste ano, a brasileira Oktagon Games foi comprada, por valor não revelado, pela americana Fortis, uma empresa global formada por veteranos de companhias de games, como Zynga, Electronic Arts, WB Games e Smule. Fundada por Ronaldo Cruz, em Londrina, no interior do Paraná, em 2008, a Oktagon Games é desenvolvedora de jogos mobile e conta com 92 funcionários. O seu game mais famoso é o "Magic Puzzle Quest".

A Afterverse, empresa de games da Movile, dona do iFood, contratou também o banco UBS para buscar um sócio estratégico à operação. A companhia, que tem os jogos Crafty Lands e PK XD, quer dobra a sua base mensal de usuários para 100 milhões em até três anos e um parceiro estratégico pode ajudar a reduzir esse tempo.

O Brasil conta também com um unicórnio na área de games. Trata-se da Wildlife, fundada por Arthur Lazarte, Victor Lazarte e Michael Mac-Vicar, em 2011. A empresa é dona dos games de sucesso "Sniper 3D" e "Tennis Clash" e foi avaliada em US$ 3 bilhões em rodadas privadas.

Ao que tudo indica, a brincadeira de gente grande está dando os seus primeiros passos no Brasil.