A confusão no cenário macroeconômico tem dificultado uma retomada mais robusta das rodadas de investimentos em startups do Brasil e da América Latina. Por outro lado, empresas com modelos de negócios consolidados e rentáveis têm aproveitado o momento para captar cheques maiores e consolidar o mercado.

Essas são as principais conclusões do Inside VC, levantamento produzido pelo Distrito a respeito das atividades de venture capital na região, obtido com exclusividade pelo NeoFeed.

No primeiro trimestre, as startups latino-americanas captaram cerca de US$ 767,4 milhões em 125 rodadas, representando quedas de 6,7% e de 34,2% em relação ao que foi registrado no mesmo período de 2024, respectivamente.

Segundo Victor Harano, gerente de research do Distrito, o primeiro trimestre costuma ser marcado por uma desaceleração na quantidade de operações. Mas ele destaca que o cenário macroeconômico acabou pesando nas decisões de aportes por parte de fundos de venture capital (VC).

“Vemos os investidores esperando um pouco neste momento inicial, em que existe ruído maior, para entender qual o cenário de 2025 e aí sim voltar a alocar capital de forma mais robusta”, diz.

O Brasil, que respondeu 65% das rodadas e aproximadamente 48,4% do volume investido na região, registrou resultados mistos. Enquanto o número de rodadas caiu 27,7%, para 81, o volume aportado aumentou em 5%, para US$ 371,7 milhões, desenvolvimento que pode ser em parte explicado pela maturação do ecossistema local.

A principal operação de uma startup brasileira no período foi o investimento de US$ 40 milhões na Music.AI, startup que desenvolveu uma plataforma B2B de inteligência artificial (IA) para música e áudio. Na América Latina, a maior operação foi fintech mexicana Plata, de US$ 160 milhões.

Apesar do número menor de deals no primeiro trimestre no Brasil e na América Latina, Harano destaca que muitas das operações que saíram atraíram cheques altos. Segundo o levantamento, no primeiro trimestre deste ano, a média dos cheques assinados em aportes em early stage na região foram 16,3% superiores aos registrados no mesmo período de 2024. O mesmo ocorreu nas séries A e B – 41,6% e 5%, respectivamente.

Isso é consequência desse cenário mais adverso, em que os investidores buscam empresas com modelo de negócios provados e rentáveis. Muitas startups estão segurando suas rodadas para melhorarem sua situação e conseguirem cheques mais gordos.

“As startups que conseguiram ultrapassar esse inverno mais duro dos financiamentos chegaram apresentando units economics mais sólidos, sendo muito mais atrativas aos investidores”, diz. “A régua subiu e essas empresas, quando saem para captar, conseguem emplacar rodadas mais sólidas.”

Se o cenário atual pesa sobre a quantidade e o volume de captações, ele tem sido favorável para M&As. O levantamento do Distrito mostra que, nos primeiros três meses do ano, houve um total de 58 operações na América Latina, alta de 35%, sendo que todas foram aquisições. No Brasil, foram apuradas 53 transações no começo do ano, alta de 35%.

Segundo Harano, o ambiente mais “árido” para captação abre caminho para players melhor posicionados consolidar o mercado. “As startups que têm dificuldade de captar ou têm um modelo de negócios mais intensivo em capital, que necessitam de um crescimento muito maior para se estabelecerem, acabam virando alvo de aquisições”, diz.

Ao contrário do visto até 2023, quando as grandes empresas eram quem estavam do lado comprador para avançar na estratégia de inovação digital, quem comandará essa consolidação serão as startups, especialmente aquelas que passaram pelos chamados megarounds, aportes acima de US$ 100 milhões.

Para Harano, essas grandes startups devem partir para aquisições ao longo do ano para incorporar concorrentes que possuem bons produtos e ampla base de clientes e também agregar novas funcionalidades aos seus produtos. Neste sentido, a inteligência artificial (IA) é um catalisador para M&As.

O movimento de consolidação do mercado tem o objetivo de preparar as companhias para quando a janela de IPO se abrir, algo que ainda deve levar entre dois e três anos. “Quando a janela de IPO abrir, essas companhias terão uma gama de produtos mais completa para que, no roadshow, tenham uma boa chance de fazer uma boa estreia no mercado”, diz Harano.