A Monashees fez o que tecnicamente é conhecido como baixa contábil no investimento que realizou na empresa de social commerce Facily, segundo documento no qual o NeoFeed teve acesso.

Em um relatório enviado para investidores, a gestora de venture capital informou que o “gross multiple” do investimento que fez na Facily é zero. Na prática, significa que a Monashees não tem mais esperança em recuperar o dinheiro investido na startup.

A Facily foi avaliada em US$ 1,1 bilhão no fim de 2021. Em múltiplas rodadas de investimento, a startup fundada, em 2018, por Diego Dzodan, Vitor Zaninotto e Luciano Freitas, captou US$ 502 milhões de investidores globais como Tiger Global, Prosus, Founders Fund, Quona Capital, Alter Global e Luxor Capital.

No Brasil, além da Monashees, que começou a investir na Facily em seu estágio inicial e seguiu outros aportes até a série B, Canary e Bossanova Investimentos também fazem parte da base de acionistas da empresa.

De acordo com fontes do mercado de venture capital com quem o NeoFeed conversou, um “gross multiple” de zero significa um “write off” gerencial. “A gestora não sai do quadro de acionistas, mas zera o valor para o fundo”, diz um gestor. “Assim, ela tem tranquilidade, pois o ativo não representa mais risco para o fundo. E, caso a empresa se recupere, volta a marcar o ativo.”

Esse mesmo gestor, no entanto, faz a ressalva de que quando um ativo é marcado a zero, as chances de se recuperar e de dar um retorno ao fundo são mínimas. “É bem raro, mas pode acontecer.”

A Facily enfrentou diversos problemas com os seus consumidores – sendo recordista de reclamações do Procon. Além disso, o seu GMV encolheu 90% – antes do último aporte, ele estava na casa dos R$ 30 milhões mensais, segundo uma fonte – e o número de funcionários foi reduzido de 1.000 para aproximadamente 200.

Em entrevista ao NeoFeed em abril deste ano, Dzodan disse que a Facily não era uma empresa zumbi e que a posição de caixa atual da Facily era saudável. O empreendedor disse também que a startup planejava atingir o breakeven neste ano e que novas cidades estavam sendo abertas no estado de São Paulo.

Segundo apurou o NeoFeed, a Monashees considera que a reestruturação que foi feita na Facily foi bem-sucedida. Mas que hoje a companhia é uma fração do que era. Por esse motivo, ela resolveu se adiantar e marcar o investimento como zero.

Maré baixa no venture capital

Esse não é o único ativo que foi marcado para baixo no relatório em que o NeoFeed teve acesso. Estão também dando menos retorno do que o investido, até o momento, a fintech argentina Ualá, o Uber dos ônibus Buser, o e-commerce MadeiraMadeira, a construtech Loft, a empresa de crediário online Addi e a de e-commerce para pets Petlove.

No sentido contrário, os ativos com os melhores retornos são a Nowports, a Frubana e o banco digital Neon. No cômpito geral, este fundo da Monashees, que tinha 14 empresas investidas, viu o valor das empresas cair de US$ 181,6 milhões, em 2021, para US$ 137,7 milhões, em 2022, uma queda de 24,1%.

Uma ressalva importante: um fundo de venture capital faz investimentos de riscos. É a natureza dessa classe de ativos, que pode ter ganhos altos, mas que também faz apostas que não dão retorno. O esperado é que as boas empresas do portfólio compensem os ativos que não conseguiram se valorizar.

Outro ponto importante é que esse cenário, de desvalorização dos ativos, é uma realidade atual do mercado de venture capital, depois dos anos de bonança de 2020 e 2021, quando a liquidez global fez inflar as avaliações de empresas.

Agora, com a ressaca, muitas delas estão com dificuldade para entregar resultados – o que gera muitas remarcações para baixo do valuation das startups. “É difícil encontrar no mercado uma gestora que não tenha remarcado, para baixo, os ativos de seu portfólio”, diz uma fonte.

Um exemplo é o Softbank, cujo fundo latino-americano foi um dos principais atores da região com investimentos de quase US$ 8 bilhões desde 2019, sendo responsável pela criação dos principais unicórnios latino-americanos nos últimos anos.

No resultado de seu ano fiscal de 2022, finalizado em março deste ano, os dois fundos da América Latina do Softbank tiveram perdas de US$ 4,1 bilhões por conta da desvalorização dos ativos. No balanço, o Softbank não detalha quais os ativos sofreram uma marcação para baixo de valor.

Na América Latina, a gestora investiu em mais de 80 startups.Fazem parte do portfólio da companhia fundada por Masayoshi Son empresas Rappi, Loft, Kavak, QuintoAndar, Mercado Bitcoin, Loggi, unico, Bitso, MadeiraMadeira, Merama, Olist, Creditas, Gympass, entre outros ativos bilionários.

Procurada, a Monashees não se pronunciou para esta reportagem.