A guerra comercial iniciada por Donald Trump tem provocado perdas trilionárias nos mercados globais, com economistas revisando para baixo as projeções de crescimento mundial e prevendo inflação mais alta. Bolsas da China e da Europa, que anunciaram retaliações, estão entre as que mais sofreram.

O cenário também tem sido particularmente negativo para os Estados Unidos, onde os principais índices estão entre os piores desempenhos do ano - o Nasdaq lidera as perdas, acumulando queda de 22% no período.

Apesar do ambiente adverso no mundo, o mercado brasileiro tem conseguido se esquivar — ainda que parcialmente — dos piores efeitos das tarifas de Trump. Com alta acumulada de 3% em 2025, o Ibovespa é um dos poucos índices de ações que ainda se mantém no campo positivo no ano.

Ian Lopes, economista da Valor Investimentos, aponta que um dos fatores favoráveis ao Brasil é a tarifa relativamente menor imposta por Trump: 10% para os produtos brasileiros, enquanto outros países, como a China, enfrentam taxas de até 50%. “O País tem sido um dos poucos a se beneficiar”, diz ele.

Mesmo que o Brasil tenha escapado das tarifas mais severas, não está imune à nova configuração da economia global. A Galápagos Capital também chama atenção para os efeitos indiretos sobre o Brasil.

“O Brasil não será diretamente muito afetado. Indiretamente, entretanto, o País será impactado pelo menor crescimento global, principalmente através da desaceleração da economia chinesa”, escreve a gestora em carta a investidores.

Segundo o Goldman Sachs, a guerra tarifária pode reduzir o PIB da China em até 0,7 ponto percentual ainda este ano.

As preocupações com a atividade chinesa já pressionam as commodities. Desde o anúncio das tarifas, em 2 de abril, o petróleo Brent acumula queda de 18%, contribuindo para uma baixa de quase 14% nas ações da Petrobras. A Vale segue trajetória semelhante, com o minério de ferro recuando à mínima em três meses. Na terça-feira, 8 de abril, a mineradora registrou sua maior queda diária desde 2023, com baixa de 5,48%.

A forte desvalorização das duas empresas com maior participação no Ibovespa tem puxado o índice para baixo. Ainda que se mantenha em terreno positivo no ano, o benchmark da bolsa brasileira caiu 5,5% nos últimos quatro pregões, enquanto o dólar saiu de R$ 5,63 na semana passada para R$ 5,99.

“O mundo vai crescer menos — e talvez até entre em recessão. Como o Brasil é um grande produtor e exportador de commodities, esse impacto é direto”, diz Marcelo Karvelis Franco, CIO da AVIN Asset.

Ainda assim, alguns fatores seguem jogando a favor do Brasil — e ajudam a explicar por que o mercado local, apesar das perdas recentes, ainda se sustenta melhor do que boa parte do mundo. Um desses elementos é a possibilidade de conquistar novas fatias de mercado, com os Estados Unidos se retraindo no comércio global.

“O Brasil pode ganhar espaço na venda de produtos agrícolas para a China”, afirma Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos.

O ponto de partida mais descontado também ajuda. No início do ano, o Ibovespa negociava a cerca de 8 vezes o lucro — bem abaixo da média histórica de 12 vezes — o que limitou o espaço para quedas, especialmente em comparação com Wall Street, que vinha inflada por um rali puxado por inteligência artificial.

“Muito do motivo pelo qual o Brasil sofreu menos tem a ver com o nível de valuation no fim de 2024. O Brasil estava muito descontado e recebeu um fluxo estrangeiro relevante”, afirma Rubens Cittadin, operador da Manchester Investimentos.

Desde janeiro, a Bolsa acumulou entrada líquida de R$ 7,4 bilhões de capital externo — valor que chegou a superar R$ 10 bilhões até o início de fevereiro. “Depois disso, houve um movimento de realização de lucros.”

Embora veja espaço para uma estratégia long and short entre Brasil e países mais afetados pelas tarifas, como China ou até mesmo os Estados Unidos, Franco avalia que essa posição ainda é arriscada.

“Está claro que as tarifas globais serão mais altas do que antes. Mas ainda não sabemos qual será o fim dessa história. Nesta semana, por exemplo, um boato sobre o possível adiamento das tarifas fez as bolsas americanas dispararem no intraday. Está tudo ainda muito volátil”, afirma Cittadin.