O Banco Central revisou para cima sua projeção de inflação deste ano e para 2026 e 2027 - com previsão de atingir a meta de 3% apenas no terceiro trimestre de 2027 -, mantendo em aberto o grau de ajuste da taxa Selic previsto para a próxima reunião do Conselho de Política Monetária (Copom), em maio, numa clara estratégia de cautela diante do cenário econômico interno e externo.
Essas e outras novidades da política monetária do BC ficaram evidentes na quinta-feira, 27 de março, após a divulgação do Relatório de Política Monetária - apresentado pela primeira vez após mudança de nome (antes era chamado de Relatório de Inflação) -, que também traz, desde 1º de janeiro, a adoção da “meta contínua de inflação”, que altera o prazo e a aferição de resultados do regime de metas de inflação, em vigor desde 1999.
Antes a aferição do cumprimento da meta considerava a variação do IPCA de janeiro a dezembro. Sob o novo modelo, o resultado da busca da meta é contabilizado mês a mês, tendo como referência a inflação acumulada em 12 meses.
A meta de 3% de inflação vale por pelo menos 36 meses, no caso, até meados de 2027. O intervalo de tolerância foi mantido em 1,5 ponto percentual e a margem continuará de 1,5% a 4,5%.
O descumprimento estará caracterizado somente se o IPCA estourar a meta por seis meses seguidos - portanto, dando mais tempo para que o BC ajuste sua política para controlar a inflação.
A rigor, o relatório que prevê uma redução gradual da inflação, com a economia ainda crescendo – embora tenha reduzido a previsão de crescimento do PIB em 2025, de 2,1% para 1,9%. Essa desaceleração, porém, não prevê um cenário futuro de recessão.
Na entrevista coletiva após o anúncio do relatório, a adoção do regime de meta contínua de inflação foi pouco abordada de forma indireta pelo presidente do BC, Gabriel Galípolo, e pelo secretário de Política Econômica do órgão, Diogo Guillen. Mas um efeito prático dessa mudança de contabilização – a flexibilização para o BC dosar a política monetária – foi reforçada.
Em sua primeira edição, o relatório confirmou desancoragem adicional das expectativas de inflação, ainda que em velocidade menor. No cenário de referência apresentado no relatório anterior, que constatou um superaquecimento da economia, as projeções de inflação estavam em 4,5% para 2025; 3,6% para 2026; e 3,2% para 2027.
Agora, houve reavaliação para cima pelo relatório: a previsão é de a inflação fechar 2025 em 5,1% e 3,7% em 2026. A projeção é que a inflação só converge para a meta de 3% no terceiro trimestre de 2027. O BC elevou de 50% para 70% a probabilidade de a inflação ultrapassar o teto da meta neste ano.
"Grau de liberdade"
A despeito dessa revisão para cima da expectativa de inflação, Galípolo deixou claro que o BC não tem uma estratégia pronta para reajustar a taxa Selic – hoje, em 14,25% ao ano, após três aumentos seguidos de 1 ponto percentual.
Segundo ele, na próxima reunião do Copom, haverá aumento - sinalizado na ata do Copom divulgada essa semana, de “menor magnitude” -, mas não quis adiantar quanto.
“Isso é justamente querer estreitar o grau de liberdade que a gente quer se preservar a partir dessa comunicação”, disse, lembrando que a atual da Selic ingressa “num patamar de taxa de juros” que é contracionista “com alguma segurança”.
Galípolo disse ainda que o Banco Central vai reunir o máximo de dados para entender o quanto a política monetária está “transmitindo” o impacto na economia. “Por enquanto, a gente entende que está se comportando dentro do nosso cenário base”, disse.
Esse cenário, no entanto, deve mudar. Galípolo afirmou que os impactos da liberação do crédito consignado privado para celetistas não foram considerados no relatório.
“Há muita dúvida sobre o quanto o consignado privado representa um fluxo novo de crédito, quanto representa uma substituição de dívida velha por dívida nova, e também como é que isso vai se desdobrar no tempo”, disse.
Tampouco houve avaliação do aumento de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil. “O projeto de lei sequer entrou em tramitação, é preciso aguardar”, acrescentou.
O órgão considerou apenas a liberação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para quem optou pela modalidade do saque-aniversário nas projeções. Ao todo, serão disponibilizados R$ 12 bilhões.